Artigo Original

Diagnóstico para Implantação da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterapia no Município de Maricá - RJ(#)

Diagnostic for the Establishment of the National Politics of Medicinal Plants and Phytotherapy in the Municipality of Maricá - RJ

Diniz, J. S.1*;
Boas, G. K. Villas1
1Núcleo de Gestão em Biodiversidade e Saúde, Instituto de Tecnologia em Fármacos, Fundação Oswaldo Cruz, NGBS/ Far-Manguinhos/Fiocruz, Rua Comandante Guaranys 447, Jacarepaguá, 22775-610, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
*Correspondência:
juremadiniz@hotmail.com

(#) Este artigo é parte do estudo apresentado pela autora Jurema Schinz Diniz como monografia de conclusão do Curso de Especialização em Gestão da Inovação em Fitomedicamentos do NGBS/Coordenação de Estudos de Far-Manguinhos.

Resumo

Este trabalho apresenta uma proposta de diagnóstico, pré-condição do planejamento para a implantação de ações relacionadas com a Política de Plantas Medicinais e Fitoterápicos no município de Maricá. Entende-se que este diagnóstico possa estimular o cultivo sustentável e a criação de um horto matriz, fundamental para cultivos sustentáveis, bem como estabelecer uma farmácia modelo no município de Maricá. Neste trabalho são abordados aspectos importantes das políticas públicas, características próprias locais, como informações sobre a população, a geografia, atores sociais que desempenham papel importante na fitoterapia do Município.

Unitermos:
Fitoterapia.
Maricá.
Plantas Medicinais.
Políticas Públicas.

Abstract

This work presents a proposal diagnostic, pre condition for planning deployment shares related to Politics of Medicinal and Phytotherapy in the city of Marica. It is understood that this diagnosis can encourage the cultivation and the creation of a garden, fundamental to sustainable farming, and establish a model pharmacy in the city of Marica. This paper addressed important aspects of public policy, local characteristics, such as information on population, geography, social actors that play an important role in phytotherapy in the city.

Key Words:
Phytotherapy.
Maricá.
Medicinal Plants.
Public Policy.

Introdução

História das plantas medicinais

Os vegetais fazem parte da cultura humana, desde seus antepassados, como fonte de alimentos, vestuários, habitação, combustível, como utensílios para manifestações artísticas e religiosas, e também como meio restaurador da saúde. Os vegetais e seus usos foram, desde sempre, fundamentais para a existência e desenvolvimento da sociedade contemporânea atual em todas essas esferas. O uso de Plantas Medicinais pelos homens foi descrito ao longo da história da humanidade. Acredita-se que o registro mais antigo seja na Medicina Chinesa realizado pelo imperador Shen Nong (2000 a.C.), que investigou o potencial medicinal de diversas plantas e outros produtos naturais, registrados no “Livro da Medicina Interna do Imperador Amarelo”, onde constavam registros de 365 drogas vegetais. Vários textos dessa época tratam de documentos religiosos, denotando a tradicional associação entre aspectos filosóficos e espirituais, aplicados para a Medicina Chinesa, Islâmica e Ayurvédica (BOTSARIS, 1995).

O respeito à milenar tradição da Fitoterapia Chinesa fez com que as fórmulas utilizadas naquela época fossem as mesmas de hoje. Estas fórmulas magistrais hoje são encontradas nos livros em diversos idiomas e são utilizadas e estudadas em quase todos os países. No Japão, desde 1950 o Ministério da Saúde Japonês reconhece 148 destas fórmulas como de utilidade pública (LOBOSCO, 2005). Nas antigas civilizações ocidentais, os primeiros registros datam de 1500 a.C. quando foi escrito o manuscrito egípcio “Papiro de Ebers”, considerado um dos mais importantes livros da cultura médica. A partir desse manuscrito o velho mundo tomou ciência de uma Farmacopéia egípcia contendo diversas espécies vegetais (ALMEIDA, 2000). Durante as chamadas civilizações clássicas, as drogas vegetais começaram a ser registradas de forma sistemática. Na Grécia, Dioscórides escreveu a obra que posteriormente foi traduzida para o latim no século XV, a chamada “De Matéria Médica”. Neste documento foram descritas mais de quinhentas espécies vegetais e seus usos na terapêutica.

Posteriormente o comércio de drogas vegetais passou a ser comum. As “Especiarias” eram extremamente valiosas e cobiçadas. A busca por estes produtos foi o motivo da criação de diversas rotas comerciais terrestres e marítimas com a intenção de fazer a conexão entre o Ocidente e o Oriente, como por exemplo, a rota da Seda e a Rota das Índias. Foi dessa forma que, plantas já usuais no oriente como a canela, gengibre e algumas pimentas chegaram ao Egito e ao Mediterrâneo (NEPO-MUCENO, 2005). Quando os turcos conquistaram Constantinopla, em 1453, os mercadores europeus assistiram ao bloqueio das suas principais rotas comerciais. Na tentativa de uma solução para contornar o problema, Portugal, seguido pela Espanha, organizou expedições para a exploração de rotas alternativas marítimas para o Oriente. O projeto português previa um ciclo oriental, contornando a África enquanto que o projeto espanhol apostou no ciclo ocidental, que culminou no descobrimento das Américas (AQUINO, 1988). Com o estabelecimento de colônias no continente americano, as nações européias introduziram nelas o plantio das especiarias asiáticas, barateando os custos e tornando-as mais acessíveis para o mercado. Essa expansão teve como conseqüência levar as próprias colônias a adotar essas especiarias, em detrimento de espécies nativas. Por outro lado, a colonização levou novas espécies de plantas para o Velho Mundo que posteriormente tornaram-se hábito no cotidiano europeu como exemplo a batata, o café e o chá preto (ALMEIDA, 2000).

No Brasil, os Jesuítas trouxeram as boticas portáteis para tratar os colonos e nativos acometidos por doenças como tuberculose, varíola e sarampo. Entretanto, foram obrigados a assimilar as plantas nativas, utilizadas pelos índios para suprir as deficiências de Portugal. Foi assim que a ipeca, a quina, a jurubeba e a copaíba passaram a fazer parte das boticas dos Jesuítas (DUNIAU, 2003). Em 1808, a Família Real Portuguesa mudou-se para o Brasil e instalou a sede do governo no Rio de Janeiro. Nesta época, D. João criou o Jardim Botânico, à época, chamado Jardim de Aclimação, com a finalidade de adaptar as espécies vindas das Índias Orientais. A publicação da primeira edição da Farmacopéia Brasileira representou um esforço significativo de regulamentar a manipulação de produtos derivados das plantas medicinais. Elaborada por Rodolfo Albino, essa obra contemplou mais de 280 espécies botânicas nacionais e estrangeiras, o que refletia as características terapêuticas da época (MARQUES; PETROVICK, 2004).

Após a segunda guerra mundial, na década de 50, houve um crescimento industrial nos países do terceiro mundo, principalmente incentivado pelo capital estrangeiro (HOBSBAWM, 1995). A indústria farmacêutica acompanhou esse movimento mundial e se desenvolveu no Brasil a partir desse momento histórico. Com o interesse no lucro, os medicamentos sintéticos conquistaram, a partir daí, lugar na terapêutica modificando completamente a forma de tratar doenças o que fez surgir o atual complexo médico industrialhospitalar (OLIVEIRA, 1985). Em conseqüência desse processo de industrialização, o conhecimento tradicional do uso de plantas medicinais passou a ser posto em segundo plano naquela época. Por falta de estudos científicos, o uso de plantas medicinais tornou-se sinônimo de atraso tecnológico e muitas vezes charlatanismo, o que fez os usuários, os médicos e os pesquisadores se afastarem desse campo. Foi um momento no qual o uso de plantas medicinais esteve mais próximo do misticismo do que da ciência (LORENZI & MATOS, 2002).

Na década de 70, o movimento social urbano da Contracultura incluiu, dentre outros campos, a importação de sistemas terapêuticos distintos daqueles já existentes, e mesmo opostos a eles numa atitude de rejeição cultural e insatisfação ao modelo médico já estabelecido (LUZ, 2005). Além da importação de antigos sistemas médicos, como a Medicina Tradicional Chinesa, Ayurvédica e Homeopatia, a incorporação de terapias ligadas às religiões de matrizes africanas e indígenas foi um fato histórico que atingiu o Brasil durante as décadas de 70 e 80, basicamente nos grandes centros urbanos. Tal fato se caracteriza pelos seguintes eventos: surgimento de diversas lojas de produtos naturais e esotéricos, revalorização dos agentes de cura (raizeiros, curandeiros, pais de santo), aparecimento freqüente no noticiário da grande imprensa escrita e televisiva de reportagens sobre terapias e práticas alternativas e, especificamente, o grande crescimento do consumo de produtos fitoterápicos (LUZ, 2005; CARRARA, 1994; CARLINI, 2002). Acompanhando esse processo histórico mundial, em 1978, na Conferência Internacional sobre Atenção Primária à Saúde de Alma-Ata, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendou aos governos, médicos e autoridades sanitárias dos países em desenvolvimento, que levassem em consideração os muitos recursos da Medicina Popular, incorporando essas formas culturalmente comprovadas pelo povo. A OMS preocupada com as doenças endêmicas e com o crescimento da incidência de doenças crônicas e degenerativas mostrava a importância das medicinas regionais como excelentes auxiliares dos sistemas organizados de saúde (OLIVEIRA, 1985).

Políticas Públicas

Em 1978 ocorreu a Conferência Internacional sobre Atenção Primária em Saúde em Alma-Ata (capital do Cazaquistão), promovida pela Organização das Nações Unidas. Nessa Conferência, foi recomendado aos estados-membros proceder à formulação de políticas e regulamentações nacionais referentes à utilização de remédios tradicionais e exploração das possibilidades de se incorporar os detentores de conhecimento tradicional às atividades de atenção primária em saúde, fornecendo-lhes treinamento correspondente. A Organização Mundial da Saúde através do seu Programa de Medicina Tradicional recomendou aos estados-membros desenvolvimento de políticas públicas para integrar a medicina tradicional e a medicina complementar alternativa nos sistemas nacionais de atenção a saúde. A Organização Mundial de Saúde, em 1987, recomendou aos estados-membros iniciar programas voltados para identificar, avaliar, preparar, cultivar e conservar plantas usadas em medicina tradicional, assim como o uso de técnicas e padrões de boas práticas de fabricação (BPF) para assegurar a qualidade das drogas derivadas de medicamentos tradicionais extraídas de plantas. Em 1991, a OMS reforçou a importante contribuição da medicina tradicional na prestação de assistência social, especialmente às populações que têm pouco acesso aos sistemas de saúde, e solicitou aos estados-membros que intensificassem a cooperação entre praticantes da medicina tradicional e da assistência sanitária moderna, principalmente no tocante ao emprego de remédios tradicionais, a fim de reduzir os gastos com medicamentos. Sugeriu, também, que todos esses remédios fossem aproveitados plenamente e que os produtos naturais, em particular os derivados de plantas, poderiam conduzir ao descobrimento de novas substâncias terapêuticas. Em sua estratégia global sobre medicina tradicional e medicina complementar e alternativa para o período 2002/2005, a OMS reforçou o compromisso em estimular o desenvolvimento de políticas públicas com o objetivo de inserir a fitoterapia no sistema oficial de saúde dos seus 191 estados-membros. Tal propósito é firmado porque naquela época apenas 25 estados-membros, entre os quais não se incluía o Brasil, desenvolveram uma política nacional de medicina tradicional como forma de fortalecer a atenção sanitária e de contribuir para a reforma do setor saúde.

No Brasil, recentemente foi aprovada a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF), que por meio do Decreto Nº 5.813, de 22 de junho de 2006, que tem como premissas o respeito aos princípios de segurança e eficácia na saúde pública e a conciliação de desenvolvimento socioeconômico e conservação ambiental, tanto no âmbito local como em escala nacional. Além disso, o respeito às diversidades e particularidades regionais e ambientais é também princípio norteador desta Política. Para tanto, o modelo de desenvolvimento almejado deverá reconhecer e promover as práticas comprovadamente eficazes, a grande diversidade de formas de uso das plantas medicinais desde o uso caseiro e comunitário, passando pela área de manipulação farmacêutica de medicamentos até o uso e fabricação de medicamentos industrializados. Essencialmente, deverá respeitar a diversidade cultural brasileira, reconhecendo práticas e saberes da medicina tradicional, contemplar interesses e formas de usos diversos, desde aqueles das comunidades locais até o das indústrias nacionais.

Por ser a PNPMF recente, ainda não foram encontrados relatos de projetos que tenham incorporado suas diretrizes. Nesse sentido, surge a necessidade de se realizar um diagnóstico das experiências já desenvolvidas nesta área, bem como um diagnóstico da própria PNPMF; antes de se desenvolverem projetos com plantas medicinais e fitoterápicos em qualquer município. As medidas de estruturação de cadeias e arranjos produtivos locais, voltados à exploração agrícola e comercial das plantas medicinais e fitoterápicos, podem contribuir para a diminuição de discrepâncias de concentração de renda entre as regiões do país, com impacto maior nas regiões com menos oportunidades para inclusão econômica e social. A convergência e a sintonia entre políticas setoriais são fatores que devem ser considerados na elaboração de políticas públicas na área de plantas medicinais e fitoterápicos, como a Política Nacional de Saúde, Lei N.º 8.080/1990, a Política Nacional de Biodiversidade, Decreto no 4.339/2002, a Política Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior, lançada em 31 de março de 2004 e a Política Nacional de Desenvolvimento Regional, decreto nº 6.047, de 22 de fevereiro de 2007, que contemplam biotecnologia e fármacos em suas ações estratégicas, nas denominadas “áreas portadoras de futuro”.

Com o objetivo de desenvolver um projeto pioneiro com base nas novas diretrizes da PNPMF, projetou-se, primeiramente, a realização de um diagnóstico para fornecer as informações necessárias e as bases para um posterior trabalho seguro. Para este fim, foi selecionado o município de Maricá, no estado do Rio de Janeiro. Esta escolha fundamentou-se no fato de ser um município com características rurais, podendo se tornar produtor de plantas medicinais para fornecimento às unidades de saúde do próprio município e também para outros municípios e instituições. Maricá fica bem próximo ao município do Rio de Janeiro e por isso também poderia fornecer a matéria-prima aos laboratórios que manipulam plantas medicinais, já que na maioria das Unidades de Saúde que contemplam grupos e serviços de fitoterapia não são adequados para a promoção de cultivo, devido à falta de espaço e estrutura, ou por estarem em sua maioria localizados em centros urbanos. Por outro lado, a observação de casos de projetos desenvolvidos em outros municípios pode contribuir decisivamente no diagnóstico, no sentido de reproduzir e aperfeiçoar as experiências positivas e evitar os pontos negativos.

A partir deste cenário, a elaboração de um diagnostico à luz das políticas relacionadas às plantas medicinais e aos fitoterápicos, que estabeleça as bases para o planejamento de ações possíveis no âmbito do Município de Maricá, foram considerados neste estudo: (i) as diretrizes da PNPMF; (ii) o espaço geográfico do município de Maricá; (iii) o setor agrícola do município de Maricá; (iii) o setor saúde do município de Maricá; (iv) o panorama socioeconômico do município de Maricá.

Metodologia

Foram levantadas as informações sobre:

• A PNPMF, assim como a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), Portaria GM nº 971 publicada em 03 de maio de 2006, para o entendimento e estabelecimento sobre a forma pela qual suas diretrizes seriam implementadas no âmbito do município de Maricá.

• O Programa Estadual de Plantas Medicinais - PRO-PLAM, Lei Estadual nº 2.537 de 16/04/96, regulamentada por Decreto Governamental nº 23.052, de 16/04/97, que foi publicado antes das outras duas.

• O Programa de Fitoterapia do Município do Rio de Janeiro, institucionalizado em 1992, também serão resgatados nesta discussão.

Em seguida, foram levantados os dados preliminares no município de Maricá, referentes à: (1) caracterização geográfica; (2) setor agrícola (3) setor de saúde (4) setor sócio-econômico.

Foram realizadas pesquisas na internet e na biblioteca Chico Mendes, incluindo entrevistas com o secretário de agricultura do município de Maricá e com o antropólogo responsável pela Biblioteca Chico Mendes e conhecedor do município e das plantas medicinais (junho de 2009).

Foi tambem realizada uma visita exploratoria, da qual se destacaram informacoes de diversos setores relacionados a este projeto. Entre estas informações, incluídas nas ferramentas metodológicas, destacam-se os fatos abaixo:

• O ano de 2009 iniciou uma nova gestão na prefeitura; daí o surgimento de novos projetos para o desenvolvimento do município.

• Neste âmbito, está em curso, através da Secretaria de Agricultura, um recadastramento dos agricultores do município; fato que poderá fornecer dados importantes sobre a agricultura local, quando estiver finalizado.

• Cursos da área rural também estão sendo ministrados para esses agricultores: com a proposta das plantas medicinais, haverá incentivo natural ao cultivo, incluindo as perspectivas de cursos técnicos e consultorias.

Resultados e Discussão

Considerações sobre as Políticas Nacionais

A ampliação das opções terapêuticas ofertadas aos usuários do Sistema Único de Saúde, com garantia de acesso a plantas medicinais, fitoterápicos e serviços relacionados à fitoterapia, com segurança, eficácia e qualidade, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde, é uma importante estratégia com vistas à melhoria da atenção à saúde da população e à inclusão social. Em 1990, a Lei nº 8.080/90 instituiu que o dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. No campo de atuação do SUS, a formulação de política de medicamentos teve como propósito garantir a necessária segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, a promoção do uso racional e o acesso da população àqueles considerados essenciais. Em virtude das recomendações descritas na referida lei e do crescente interesse popular e institucional no sentido de fortalecer a fitoterapia no SUS, foram intensificadas iniciativas a partir da década de 1980. Nesse contexto, políticas, programas, resoluções, portarias e relatórios foram elaborados com ênfase nesse tema. Entre elas, pode-se citar a priorização do estudo de plantas medicinais de investigação clínica e a implantação do Programa de Pesquisa de Plantas Medicinais da Central de Medicamentos. Esse programa objetivou desenvolver uma terapêutica alternativa e complementar, com embasamento científico, por meio do estabelecimento de medicamentos fitoterápicos originados a partir da determinação do real valor farmacológico de preparações de uso popular, à base de plantas medicinais, com vistas à sua inclusão na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME).

A Política Nacional de Medicamentos, aprovada pela Portaria n.º 3.916, de 30 de outubro de 1998, em sua diretriz, “Desenvolvimento Científico e Tecnológico”, prevê a continuidade e expansão do apoio a pesquisas para o aproveitamento do potencial terapêutico da flora e fauna nacionais, enfatizando a certificação de suas propriedades medicamentosas. A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPICS) foi publicada por meio de Portaria GM nº 971 em 03 de maio de 2006 e a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, aprovada por meio do Decreto Nº 5.813, de 22 de junho de 2006. A Política Nacional de Assistência Farmacêutica, aprovada por resolução nº 338, de 06 de maio de 2004, parte integrante da Política Nacional de Saúde (PNS), lei nº 8.080/1990, contempla em seus eixos estratégicos a definição e pactuação de ações intersetoriais que visem à utilização das plantas medicinais e de medicamentos fitoterápicos no processo de atenção à saúde, com respeito aos conhecimentos tradicionais incorporados, com embasamento científico, com adoção de políticas de geração de emprego e renda, com qualificação e fixação de produtores, envolvimento dos trabalhadores em saúde no processo de incorporação dessa opção terapêutica e baseada no incentivo à produção nacional, com a utilização da biodiversidade existente no país.

Por sua vez, a PNPICS, pactuada na Comissão Intergestores Tripartite, aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde no ano de 2005 e publicada por meio de Portaria GM nº 971, de 03 de maio de 2006, propõe a inclusão das plantas medicinais e fitoterapia, homeopatia, medicina tradicional chinesa/acupuntura e termalismo social/crenoterapia como opções terapêuticas no sistema público de saúde. Essa política traz dentre suas diretrizes para plantas medicinais e fitoterapia, a elaboração da Relação Nacional de Plantas Medicinais e de Fitoterápicos (RENISUS, 2009), assim como o provimento do acesso às plantas medicinais e aos fitoterápicos pelos usuários do SUS. Já a PNPMF, aprovada pelo Decreto Nº 5.813, de 22 de junho de 2006, estabelece diretrizes e linhas prioritárias para o desenvolvimento de ações pelos diversos parceiros em torno de objetivos comuns voltados à garantia do acesso seguro e do uso racional de plantas medicinais e de fitoterápicos no Brasil; ao desenvolvimento de tecnologias e inovações, assim como ao fortalecimento das cadeias e dos arranjos produtivos, ao uso sustentável da biodiversidade brasileira e ao desenvolvimento do Complexo Produtivo da Saúde. A preocupação com esta área pode ser explicitada pela aprovação da portaria número 3237, de dezembro de 2007, do Ministério da Saúde, que incluiu dois fitoterápicos (espinheira santa e guaco) na rede SUS, já em conformidade com o que hoje recomenda a PNPIC.

A Portaria Interministerial nº 2.960 foi publicada em 10 de dezembro de 2008, aprovando o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, e criando o Comitê Nacional que deliberará sobre o assunto. O Programa tem por objetivo dar concretizar as ações decorrentes da PNPMF e PNPIC, com vistas à melhoria do acesso da população aos medicamentos, à inclusão social e regional, ao desenvolvimento industrial e tecnológico, além do uso sustentável da biodiversidade brasileira e da valorização e preservação do conhecimento tradicional associado das comunidades tradicionais e indígenas. Literalmente, o objetivo geral deste programa é “garantir à população brasileira o acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos, promovendo o uso sustentável da biodiversidade, o desenvolvimento da cadeia produtiva e da indústria nacional”, desdobrandose nos seguintes objetivos específicos:

• Ampliar as opções terapêuticas aos usuários, com garantia de acesso a plantas medicinais, fitoterápicos e serviços relacionados a fitoterapia, com segurança, eficácia e qualidade, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde, considerando o conhecimento tradicional sobre plantas medicinais.

• Construir o marco regulatório para produção, distribuição e uso de plantas medicinais e fitoterápicos a partir dos modelos e experiências existentes no Brasil e em outros países.

• Promover pesquisa, desenvolvimento de tecnologias e inovações em plantas medicinais e fitoterápicos, nas diversas fases da cadeia produtiva.

• Promover o desenvolvimento sustentável das cadeias produtivas de plantas medicinais e fitoterápicos e o fortalecimento da indústria farmacêutica nacional neste campo.

• Promover o uso sustentável da biodiversidade e a repartição dos benefícios decorrentes do acesso aos recursos genéticos de plantas medicinais e ao conhecimento tradicional associado.

Por sua vez, o Comitê tem atribuição de monitorar e avaliar o referido programa e possui caráter consultivo e deliberativo. É composto por representantes do governo (Casa Civil/PR, MAPA, MCT, MDA, MDIC, MDS, MEC, MI, MinC, MMA, MS, ANVISA, FIOCRUZ) e da sociedade civil (Agricultura Familiar, Agricultura, Biomas (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Ecossistemas Costeiros e Marinhos, Pampa, Pantanal), Indústria, Manipulação, Pesquisa, Povos e comunidades tradicionais, Serviços de Saúde (Gestor Municipal e Estadual do SUS). A Portaria GM/MS nº 1.274, de 25 junho de 2008 instituiu Grupo Executivo para apoiar o MS na coordenação do Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos - DAF, DES ANVISA, NGBS/FIOCRUZ, NEPFITO/GHC (DOU, 26/06/2008, p. 41).

Considerações sobre a Política Estadual do Rio de Janeiro

No Estado do Rio de Janeiro, o desenvolvimento de políticas voltadas para Plantas Medicinais e Fitoterapia começou através da Lei n° 2.537 de 16 de Abril de 1996, que criou o Programa Estadual de Plantas Medicinais (PROPLAM) e depois a Resolução SES n° 1590 de 12 de fevereiro de 2001; esta republicada no D.O. N° 51 de 18/03/2004, que regulamenta a prática de fitoterapia e o funcionamento dos serviços de fitoterapia no Estado do Rio de Janeiro. Assim, o Estado do Rio, ao antecipar sua legislação própria, foi pioneiro no país. O PROPLAM é homologado pela Lei Estadual nº 2.537 de 16/04/96, regulamentada pelo Decreto Governamental nº 23.052 de 16/04/97, que também cria o Conselho Estadual de Plantas Medicinais - CEPLAM. Tem como objetivo estabelecer políticas públicas nas áreas de preservação, pesquisa e utilização terapêutica de plantas medicinais visando a exploração organizada dos recursos da flora medicinal do Estado. O CEPLAM é integrado por instituições do âmbito Estadual das áreas técnicas, científicas e políticas, e tem por objetivo principal instituir nos órgãos do Estado, que mantêm interface com atividades da área de plantas medicinais, ações que venham respaldar as iniciativas municipais, fundamentadas em diretrizes propostas pelo PROPLAM (1997).

No que se refere à área de Fitoterapia, o PROPLAM tem como responsabilidade o fomento à implantação dos Serviços de Fitoterapia, a coordenação das ações no nível municipal, bem como a assessoria visando o cumprimento da Resolução com base ética e qualidade técnica. Já existem diversos municípios no Estado do Rio de Janeiro desenvolvendo atividades na área de fitoterapia. De acordo com o PROPLAM (1997), a implantação dos serviços de fitoterapia nos municípios foi instrumentalizada pela disponibilização do guia específico “Fitoterapia nos Municípios: Guia para o Desenvolvimento do Trabalho”, elaborado para orientar o desenvolvimento de um projeto no modelo de “Farmácia Viva”, contendo informações de materiais necessários, tamanho da área, procedimentos e etapas, além de entre outras diretrizes (PROPLAM, 1997). Para oficializar e fornecer cunho legal às orientações no documento elaborado, e assim possibilitar fomento às ações municipais com recursos financeiros estaduais, foi construída em parceria com a Coordenação Estadual de Vigilância Sanitária a Resolução Estadual SES nº 1590, de 12 de fevereiro de 2001, criando o Serviço de Fitoterapia. Segundo o PROPLAM (1997), existem dois níveis de implantação. Na Farmácia Viva I (primeiro nível) ocorre somente o cultivo e beneficiamento primário de plantas medicinais, incluindo a dispensação de plantas “in natura” ou da droga vegetal para preparação caseira. Já a Farmácia Viva II (segundo nível) contempla a produção e/ou aquisição de matéria prima, assim como uma Oficina Terapêutica de Fitoterápicos.

Considerações sobre o Programa de Fitoterapia do Município do Rio de Janeiro

No município do Rio de Janeiro, o programa de fitoterapia foi oficializado através do decreto 11.608 de 11 de novembro de 1992 (LEDA, 2004), portanto bem antes das políticas nacionais, e já com os seguintes objetivos:

• Produção de medicamentos fitoterápicos;

• Atividades em grupos de usuários;

• Capacitação de recursos humanos e implementação de pesquisas com plantas medicinais.

Após uma pesquisa a respeito das patologias mais freqüentes nas unidades de saúde (SANTOS, 1998), a equipe do Programa de Fitoterapia selecionou plantas medicinais que apresentavam segurança e eficácia comprovadas na literatura para este objetivo. Atualmente, o programa conta com um elenco de 25 plantas, organizadas no Memento Terapêutico (REIS, 2002) e manipula tinturas, cremes, géis, pomadas, óvulos, xampus, colutórios e xaropes nas seis Oficinas Farmacêuticas. A maioria das plantas utilizadas para a manipulação dos fitoterápicos é cultivada em 18 hortas, espalhadas em diversas unidades de saúde, sob com a supervisão de uma equipe de agrônomos. Os grupos de usuários de plantas medicinais do Programa de Fitoterapia da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro caracterizam-se por encontros que acontecem regularmente com pessoas da comunidade e profissionais de saúde. Os grupos têm como finalidade trocar conhecimentos, envolver a comunidade nos cuidados com a horta local (cultivo, preparo e uso) e passar conhecimentos científicos na forma de palestras e cursos (POSSE, 2007).

As atividades desenvolvidas pela equipe de cultivo de plantas medicinais do Município do Rio de Janeiro são: identificação botânica da espécie medicinal; produção de mudas: propagação sexuada (sementes), propagação assexuada (estacas de galho, folha, raiz/rizoma, divisão de touceiras, filhotes ou rebentos, mergulhia e alporquia); plantio (covas, canteiros ou leiras, vasos e jardineiras); tratos culturais [poda, compostagem, produção de húmus, controle de plantas concorrentes, controle fitossanitário (defensivos alternativos, ciclo de colheitas, catação manual, rotação de culturas)]; irrigação; colheita; secagem (secagem natural e artificial); embalagem e armazenamento; Distribuição de matéria-prima para as oficinas farmacêuticas; assistência técnica e manutenção (POSSE, 2007). De acordo com Posse (2007), dentre as atividades do Programa de Fitoterapia junto às comunidades, o programa também realiza levantamentos etnobotânicos nas comunidades, pesquisando dados como: plantas mais utilizadas, sintomas e doenças prevalentes, formas de uso interno (chá, xarope, tintura, infusão) e externo (pomada, cataplasma, compressa). As comunidades participam continuamente na manutenção das hortas, principalmente no tocante à irrigação essencial, e aos tratos culturais. Para orientá-las, existe um curso de capacitação sobre o cultivo, abrangendo a parte agronômica, de acordo com o local disponível para a horta, onde a equipe de cultivo oferece assistência técnica. As comunidades fazem permuta de conhecimentos sobre plantas medicinais, e participam de oficinas onde aprendem a fazer remédios caseiros e participam de passeios pedagógicos, sempre acompanhados por profissionais da área de saúde e agronomia. A TABELA 1 sumariza as plantas utilizadas programa municipal.

Tabela 1: Lista de Plantas Medicinais do Programa de Fitoterapia do Município do Rio de Janeiro
Agrião Nasturtium officinale Curcuma Curcuma longa
Arnica Brasileira Solidago chilensis Embaúba Cecropia sp.
Arnica * Arnica montana Erva Baleeira Cordia curassavica
Arruda Ruta graveolens Erva Cidreira Lippia alba
Boldo-do-Chile* Peumus boldus Erva Doce* Foeniculum vulgare
Boldo Nacional Plectranthus barbatus Espinheira Santa* Maytenus ilicifolia
Calêndula Calendula officinalis Gengibre Zingiber officinale
Camomila* Matricaria recutita Guaco Mikania glomerata
Carqueja Baccharis trimera Laranja da Terra Citrus aurantium
Chapéu-de-Couro Echinodorus macrophyllus Maracujá Passiflora alata
Colônia Alpinia zerumbet Melão de São Caetano Momordica charantia
Confrei Symphytum officinale Pata de Vaca Bauhinia forficata
Crataego* Crataegus oxyacantha Transagem Plantago major
*Adaptadas ao clima do município do Rio de Janeiro

As farmácias associadas estão localizadas em:

• Posto de Assistência Médica Nilton Alves Cardoso, na Ilha do Governador

• Centro Municipal de Saúde Ernani Agrícola, em Santa Tereza

• Unidade Integrada de Saúde Manoel Arthur Villaboim, em Paquetá

• Hospital Rafael de Paula Souza, em Jacarepaguá

• Unidades Auxiliares de Cuidados Primários de Saúde Cecília Donnângelo, em Vargem Grande

• Instituto Municipal de Assistência à Saúde Juliano Moreira, em Jacarepaguá

• Instituto Municipal de Medicina Física Oscar Clark, no Maracanã

Caracterização do Município de Maricá

O município de Maricá foi escolhido para desenvolver um futuro projeto de fitoterapia, pois além da proximidade com o município do Rio de Janeiro, tem o diferencial de ser um município basicamente rural, com potencial de cultivo de plantas medicinais para uso em suas unidades de saúde, bem como possibilidades de fornecer matéria prima para instituições e ao Rio de Janeiro, grande consumidor dessas plantas em seus vários grupos de fitoterapia. Além disso, conta com uma área de vegetação preservada, que serve para estudos prospectivos de espécies medicinais.

Levantamento geográfico: A geografia do município de Maricá é composta pelas serras Calaboca, Mato Grosso, Lagarto, Silvado, Espraiado e Tiririca. Apresenta também um grande complexo lagunar, que contempla as lagoas de Maricá, Barra de Maricá, do Padre, Guaripina e Jaconé, além dos canais de Ponta Negra e de Itaipuaçu que ligam as lagoas ao mar. A região possui florestas do tipo tropical de altitude, restinga, planícies costeiras, com uma área total de matas e florestas de 17.049 ha (IBGE, 2007). Com a expansão imobiliária existe a preocupação em preservar e desde 1980 existe ali uma APA (Área de proteção Ambiental), que protege, além de outras áreas, a restinga. Apesar disso, faz-se necessária a constante observação da população, a fim de evitar que ocorram construções nessa área. Com alto potencial ecológico e com um passado agrícola, é possível um resgate do conhecimento das plantas medicinais pelos moradores, bem como a produção de plantas medicinais por pequenos agricultores da região, visando atender uma população que cresce muito.

Levantamento agronômico: A visita ao Horto Municipal e ao Secretario de Agricultura revelou informações a respeito dos agricultores da região e da produção agrícola. Além disso, foi destacado o interesse da Prefeitura em desenvolver o projeto.

Para a Secretaria de Agricultura o bairro do Silvado, na região, é destaque na concentração da maioria dos agricultores e conseqüentemente da produção agrícola do município. A partir desta informação, este bairro poderá ser o primeiro a desenvolver o projeto. Segundo o IBGE (2007), existem no município de Maricá 163 estabelecimentos agropecuários, com uma área total de 20.976 ha. São cultivados basicamente mandioca, banana, laranja, limão, feijão e coco. Mas o que realmente predomina em todo município é a pecuária.

Levantamento do setor saúde: Segundo o IBGE (2007) existem no Município de Marica 20 estabelecimentos de saúde públicos, sendo dois federais e dezoito municipais. De acordo com o DATASUS (2007) A distribuição percentual das principais doenças levantadas no município de Maricá estão dispostas na Tabela 2.

Tabela 2: Distribuição percentual das internações por grupo de causas e faixa etária - CID 10, no ano de 2007
Capítulo CID Menor 1 1 a 4 5 a 9 10 a 14 15 a 19 20 a 49 50 a 64 65 e mais 60 e mais Total
I. Algumas doenças infecciosas e parasitárias 6,0 11,4 7,0 5,6 2,0 2,2 2,2 4,3 3,8 3,1
II. Neoplasias (tumores) 0,6 4,8 1,7 3,7 2,8 10,8 12,8 8,5 8,7 9,1
III. Doenças sangue órgãos hemat e transt imunitár - 1,0 - - - 1,0 1,3 1,9 1,7 1,0
IV. Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas - - - 0,9 0,6 2,7 7,6 11,3 10,8 4,4
V. Transtornos mentais e comportamentais - - - - - 2,9 0,4 0,3 0,2 1,5
VI. Doenças do sistema nervoso 1,8 1,9 - 0,9 - 1,5 1,6 0,8 0,6 1,2
VII. Doenças do olho e anexos - 1,0 5,2 4,6 - 0,3 2,4 1,1 1,4 1,0
VIII. Doenças do ouvido e da apófise mastóide - 1,9 - - - - - - - 0,0
IX. Doenças do aparelho circulatório - - - 1,9 2,3 7,2 27,6 30,7 31,2 12,9
X. Doenças do aparelho respiratório 20,5 28,6 12,2 8,3 2,3 2,9 8,5 13,9 13,0 7,2
XI. Doenças do aparelho digestivo 2,4 15,2 18,3 12,0 2,3 8,9 14,0 8,5 10,2 9,4
XII. Doenças da pele e do tecido subcutâneo 2,4 12,4 8,7 3,7 1,1 2,8 3,4 3,0 2,8 3,2
XIII. Doenças sist osteomuscular e tec conjuntivo 0,6 - 4,3 3,7 0,6 1,8 2,8 1,9 1,7 1,9
XIV. Doenças do aparelho genitourinário 3,6 3,8 16,5 12,0 13,6 8,9 3,4 3,8 3,7 7,6
XV. Gravidez parto e puerpério - - - 9,3 56,0 31,1 0,1 - - 19,9
XVI. Algumas afec originadas no período perinatal 52,4 - 0,9 - - 0,1 - - - 2,2
XVII. Malf cong deformid e anom cromossômicas 5,4 2,9 7,8 3,7 0,9 0,2 - - - 0,8
XVIII. Sint sinais e achad anorm ex clin e laborat 1,8 3,8 2,6 3,7 3,7 4,1 1,5 2,2 2,3 3,2
XIX. Lesões enven e alg out conseq causas externas 2,4 11,4 14,8 24,1 11,9 10,0 9,9 7,7 7,9 10,0
XX. Causas externas de morbidade e mortalidade - - - - - - - - - -
XXI. Contatos com serviços de saúde - - - 1,9 - 0,7 0,1 - - 0,4
CID 10a Revisão não disponível ou não preenchido
Total 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100
CID = Código Internacional de Doenças. Fonte: SIH/SUS

Levantamento sócio-econômico: Maricá é um município situado no litoral do estado do Rio de Janeiro, sob as coordenadas S 22º 55’ 10” O 42º 49’ 07”, com a média de 5 metros de altitude. Possui uma população de 105.294 habitantes (IBGE, 2007). É conhecido por suas propriedades rurais, chácaras, e grandes fazendas, muitas delas ricas em conteúdo histórico. Nas últimas décadas do século XVI foram feitas doações de sesmarias a Antônio de Mariz, Manoel Teixeira e Duarte Martins Moirão, que estabeleceram os primeiros colonos na região, desenvolvendo atividades extrativistas, agrícolas e pastoris. Com a Lei Áurea, muitas lavouras foram abandonadas e as atividades agropastoris, indústrias de pequeno porte, exploração minerais, construção civil, pesca e turismo, passaram a constituir as principais atividades econômicas (MACHADO, 1977).

Muitas destas informações, além de outras sobre plantas medicinais; história do Município, projetos já realizados e em andamento, foram colhidas na visita realizada à biblioteca Chico Mendes e ao horto da mesma biblioteca. A entrevista com o responsável pela biblioteca apontou outros atores sociais possíveis participantes do projeto a ser realizado, os quais são os principais conhecedores da região: agricultores, profissionais de saúde e de outras áreas, moradores do município empenhados em desenvolver a fitoterapia em sua região. Destaca-se a participação da Igreja Católica empenhada no desenvolvimento de projetos sociais na região do Silvado, junto aos moradores e na busca de soluções para os problemas que afetam esta região mais afastada.

Conclusões

A análise das políticas públicas deixa explícito que existem duas vertentes distintas. De um lado, a vertente da inovação, sua implantação, a inovação realizada através dos setores que lidam com a cadeia produtiva, ou cadeia de fornecimento ou ainda a cadeia de valores como, por exemplo, fábricas, empresa agrícola, cooperativas, instituições técnico científicas. De outro, a vertente da assistência farmacêutica, com o serviço de farmácia, com pequenas hortas, mais próxima do conhecimento popular. Também é reconhecido o pioneirismo dos programas estaduais e municipais do Rio de Janeiro. Entretanto observa-se que são necessários ajustes, tanto semânticos quanto operacionais, para que estes programas sejam efetivamente um guia para a prática. Também algumas questões subjacentes, ligadas à garantia da sustentabilidade, devem ser revistas, como por exemplo, o número de plantas que uma farmácia está autorizada a processar é crucial para sua sobrevivência. Desta forma, o desdobramento deste diagnóstico, considerado dentro do contexto de implantação do programa em um município como Maricá, aponta para ações iniciais necessárias para seu êxito:

a) Deve-se considerar o horto da Biblioteca Chico Mendes como pólo de conhecimento e fornecimento de mudas, incluindo o eventual desenvolvimento de uma Farmácia Viva no modelo original do Professor Francisco Matos;

b) Ainda nesta vertente deve se organizar um estudo etnobotânico na região;

c) Deve-se obter o compromisso do Governo Municipal em investir na área;

d) Na área do conhecimento cientifico deve ser estimulada a realização de inventários botânicos;

e) Devem ser articuladas as instituições ambientais que lidam com a preservação;

f) O projeto deverá contar com a Prefeitura e suas secretarias de Agricultura e Saúde, Ciência e Tecnologia e/ou Desenvolvimento Social. O compromisso e os vínculos estabelecidos entre os diversos atores envolvidos através de dinâmicas participativas definirão o escopo bem como o modelo de gestão deste programa, considerando todas as iniciativas inclusive as público-privadas;

g) Devem ser realizadas diversas entrevistas pré-estruturadas com os atores principais, junto à Secretaria de Agricultura, também com professores e alunos da UFRRJ, com médicos e administradores do Posto de Saúde de Maricá, com pacientes, agricultores e moradores de Maricá em geral interessados nas propostas do projeto e que possam contribuir seja na gestão, no conhecimento, em pesquisa, na produção, e na sugestão de melhorias. Será realizada uma visita exploratória ao Município de Maricá para completar os levantamentos bem como aplicar as entrevistas semi-estruturadas.

h) Devem ser escolhidas as plantas a serem utilizadas no futuro projeto, de acordo com as doenças predominantes no município.

Na implantação da fitoterapia no Município de Maricá a questão da sustentabilidade deve ser o fio condutor, considerando-se um financiamento específico voltado para a implantação do projeto. Ao permitir à população do município o acesso aos fitomedicamentos, um programa como este melhorará a qualidade de vida da população de Maricá. O grande diferencial será a auto-suficiência em matéria prima vegetal, pois sendo Maricá um Município rural, os agricultores podem desenvolver o cultivo das plantas medicinais a serem utilizadas na farmácia, e extrapolar, na medida do conveniente, o abastecimento de outros municípios e/ou instituições. A venda contribuirá certamente para o aumento da renda dos agricultores. Neste contexto, é necessário se desenvolver um planejamento prévio no que diz respeito às espécies a serem cultivadas e qual a área que cada um deverá reservar para essa atividade. A agricultura familiar é uma das prioridades do governo federal e apresenta como vantagens a disponibilidade de terra e trabalho, a detenção de conhecimentos tradicionais, a experiência acumulada na relação com a biodiversidade e as práticas agroecológicas voltadas ao atendimento dos mercados locais e regionais, bem como potencial de agregação de valor e renda nas cadeias e nos arranjos produtivos de plantas medicinais e fitoterápicos. Outras estratégias de inclusão social das comunidades integrantes da cadeia e dos arranjos produtivos locais a serem estimulados pelo governo federal são os programas de transferência de renda, combate ao trabalho infantil e segurança alimentar.

Atualmente, os fitoterápicos constituem importante oportunidade de inovação em saúde, sendo objeto de interesses empresariais privados e fator de competitividade no Complexo Industrial da Saúde. Esse contexto impõe a necessidade de uma ação transversal voltada ao fortalecimento da base produtiva e de inovação local e à competitividade da indústria nacional. A valorização da biodiversidade da região pode contribuir na preservação e no interesse por parte de pesquisadores e instituições de pesquisa em conhecer as espécies, objetivando-se novos fitoterápicos. A população desse Município, que muitas vezes não tem condições financeiras para adquirir medicamentos, poderá desfrutar de um Serviço de Fitoterapia no Posto de Saúde e Hospitais. A capacitação de pessoal por profissionais que conhecem a fitoterapia favorecerão também as medidas de prevenção e a valorização de hábitos saudáveis para a população. No geral, o processo educacional, que inclui o resgate de conhecimentos antes passados de geração em geração e a proximidade do ser humano com a natureza, está na base da melhoria da qualidade de vida da população. A aprovação da PNPMF e a consolidação paulatina da Fitoterapia no SUS são um passo concreto nesta direção, e o município de Maricá, ao incorporar formulações atualizadas dos programas para a área, tem condições de exercer um pioneirismo no Estado.

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