Revisão
Evidências sobre a ação de compostos do Aloe vera em células cancerígenas: uma revisão da literatura
Evidences on the action of Aloe vera compounds on cancer cells: a literature review
Resumo
A pesquisa tem como objetivo encontrar evidências científicas que apontem a ação anticancerígena dos compostos aloe-emodina e aloína em células neoplásicas. Esse estudo consistiu em uma revisão bibliográfica sobre o tema, de artigos publicados em revistas indexadas nas bases de dados online PubMed, Lilacs e SciELO, utilizando os descritores de forma combinada: "câncer", "aloe-emodina" e "aloína". As buscas foram realizadas em março de 2020, optando por artigos publicados nos últimos 5 anos, nos idiomas inglês e português. Foram selecionados artigos que atendam aos seguintes critérios de inclusão: artigos originais; ensaios clínicos; estudos pré-clínicos e que se enquadram no tema pesquisado. Após aplicar os critérios de inclusão, foram selecionados 15 artigos que abordassem o efeito antineoplásico dos componentes do Aloe vera em células cancerígenas humanas. Os estudos in vitro e in vivo citados neste trabalho revelaram que os compostos derivados do Aloe vera (aloe-emodina e aloína) tiveram resultados satisfatórios quanto à atividade antineoplásica em diferentes linhas celulares de câncer humano. Porém, essas substâncias não foram testadas diretamente em seres humanos, revelando que são necessários experimentos clínicos para comprovar a eficácia do Aloe vera no tratamento do câncer.
- Palavras-chave:
- Câncer.
- Aloe vera.
- Aloe-emodina.
- Aloína.
Abstract
The research aims to find scientific evidence pointing to the anticancer action of aloe-emodin and aloin compounds in neoplastic cells. This study consisted of a bibliographic review on the subject, of articles published in journals indexed in the online databases PubMed, Lilacs and SciELO, using the descriptors in a combined manner: "cancer", "aloe-emodin" and "aloin". The searches were carried out in March 2020, opting for articles published in the last 5 years, in English and Portuguese. Articles were selected that met the following inclusion criteria: original articles; clinical trials; pre-clinical studies and that fit the researched theme. After applying the inclusion criteria, 15 articles were selected that addressed the antineoplastic effect of the components of Aloe vera on human cancer cells. The in vitro and in vivo studies cited in this work revealed that the compounds derived from Aloe vera (aloe-emodin and aloin) had satisfactory results regarding the antineoplastic activity in different human cancer cell lines. However, these substances haven't been tested directly on humans, revealing that clinical trials are needed to prove the effectiveness of Aloe vera in cancer treatment.
- Keywords:
- Cancer.
- Aloe vera.
- Aloe-emodin.
- Aloin.
Introdução
Entre 2018 e 2019 o Brasil teve uma previsão de aproximadamente 600.000 novos casos registrados de câncer, sendo os mais comuns no sexo masculino neoplasias de próstata, pulmão, intestino, estômago e cavidade oral. Enquanto que no sexo feminino, os tipos mais prevalentes são tumores mamários, de intestino, colo de útero, pulmão e tireoide. No geral, foram verificados 420.000 casos de câncer, sem contar com tumor de pele do tipo não melanoma[1].
Devido ao crescimento alastrante da doença, a medicina vem constantemente avançando em novas formas de diagnóstico e tratamento do câncer, a fim de aumentar as chances de cura e sobrevida dos pacientes[2]. O tratamento convencional do câncer com medicamentos antineoplásicos, radioterapia, quimioterapia e cirurgia é bastante eficaz na cura da doença. Contudo, essas formas de tratamento trazem diversos efeitos colaterais para os pacientes, incluindo sintomas gastrointestinais como diarreia, êmese, náuseas e anorexia, afetando não só a saúde física como também a psicológica dos pacientes[3].
A partir de tal problemática, terapias complementares (TC) estão sendo utilizadas por serem práticas humanizadas em sua aplicação, sendo bastante prescritas pelos profissionais da saúde. A partir de 2006, foi aprovado no Brasil a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde (SUS) após o contato com políticas nacionais de medicina tradicional em outros países. As terapias que pertencem a essa política são medicina tradicional chinesa ou acupuntura, homeopatia, termalismo social ou crenoterapia, medicina antroposófica, plantas medicinais e fitoterapia[4].
Quanto ao uso de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos, muitos pacientes oncológicos têm utilizado esse tipo de tratamento complementar associado à terapia convencional com a finalidade de minimizar os efeitos colaterais relacionados à quimioterapia, à radioterapia e aos medicamentos antineoplásicos, sendo a automedicação com plantas medicinais muito comum por esses indivíduos[5].
Uma dessas plantas utilizadas com finalidade terapêutica é a Aloe vera, a qual possui origem na África e na região do Mediterrâneo. No Brasil, a planta é popularmente conhecida como babosa e é amplamente utilizada em cuidados com pele e cabelo, na cicatrização e em outros fins medicinais, devido à atividade anti-inflamatória e antioxidante[6].
A folha da Aloe vera possui em sua composição aproximadamente 98,5% de água, macronutrientes (carboidratos e aminoácidos), vitaminas (A, B12, C, E, colina e ácido fólico) e minerais (cálcio, sódio, zinco, magnésio, cromo e cobre), além de substâncias como ácidos orgânicos, ligninas e compostos fenólicos (antraquinonas e fitoesterois). Seus principais compostos são derivados antracênicos sendo as aloínas (barbaloína e isobarbaloína) as mais conhecidas[7,8].
Quanto à atuação contra o câncer, estudos pré-clínicos vêm descobrindo, ao longo do tempo, atividades terapêuticas potenciais do Aloe vera e de seus compostos bioativos, especialmente contra doenças neoplásicas. Essas pesquisas indicam possíveis efeitos preventivos e terapêuticos do Aloe vera contra a doença[9]. Dentre os componentes da planta, destacam-se os derivados das antraquinonas, os quais são ricos em diversidade estrutural e exibem propriedades pleiotrópicas, dentre elas encontra-se a modulação da autofagia, promissora no que diz respeito à resistência ao câncer[10].
A aloe-emodina (1,3,8-tri-hidroxi-antraquinona) (AE) é uma antraquinona e uma variedade de emodina presente no látex, um exsudato da planta Aloe e tem sido relatado que exerce uma variedade de ações farmacológicas, especialmente conhecidas pela atividade antineoplásica em vários tipos de tumores. Pesquisas demonstraram que o composto pode aumentar a citotoxicidade do tamoxifeno nas células de câncer de mama, exercer ação fotodinâmica na apoptose de células cancerígenas gástricas humanas, além de suprimir a proliferação e induzir apoptose no carcinoma escamoso pulmonar humano por meio da geração de espécies reativas de oxigênio (ROS)[11].
A aloína (ALO) (10-glucopiranosil-1,8-dihidroxi-3-hidroximetil-9(10H)-antracenona) também é um composto natural de antraquinona extraído da planta de Aloe vera e os efeitos incluem ação anti-inflamatória, antipirética, hepatoprotetora e antioxidante. Nos últimos anos, muitos estudos comprovaram que a aloína tem potencial anticâncer e que o composto pode inibir a proliferação de células cancerígenas e induzir seu declínio sobre câncer de pulmão, colorretal e de mama[12].
Um estudo in vitro nas quais células de melanoma B16-F10 foram tratadas com aloína evidenciou que o composto obteve um efeito inibitório na proliferação celular, invasão e adesão das células em concentrações não citotóxicas[13].
Outro estudo utilizando os métodos in vivo e in vitro mostraram que a aloína inibiu a formação e a proliferação de células de câncer colorretal e induziu a apoptose in vitro. In vivo, reduziu o tamanho e o peso do tumor em camundongos utilizados nos experimentos[14].
Em relação ao aloe-emodina, um estudo in vitro e in vivo com linhas celulares do câncer de próstata também evidenciou que o composto inibiu a atuação das vias de sinalização que contribuem na proliferação nas células cancerígenas e in vivo, foi observado um efeito supressor nos tumores presentes em camundongos [15].
Devido aos potenciais benefícios da Aloe vera, muito se tem despertado quanto ao uso desta planta. Porém, assim como outros fitoterápicos, há poucas evidências sobre os efeitos da Aloe vera na prevenção e tratamento de doenças crônicas não transmissíveis como o câncer.
Dessa forma, o presente estudo tem como encontrar evidências científicas que apontem a atividade anticancerígena dos compostos aloe-emodina e aloína em células neoplásicas.
Material e Método
Este estudo consiste em uma revisão bibliográfica sobre o tema, de artigos publicados em revistas indexadas nas bases de dados online PubMed, Lilacs (Literatura Latino-Americana do Caribe em Ciências da Saúde) e SciELO (Scientific Eletronic Library Online), utilizando os descritores de forma combinada: "cancer", "aloe-emodin" e "aloin". As buscas foram realizadas em março de 2020, optando por artigos publicados nos últimos 5 anos, nos idiomas inglês e português.
Foram selecionados artigos que atendam aos seguintes critérios de inclusão: artigos originais; ensaios clínicos; estudos pré-clínicos; que se enquadram no tema pesquisado e publicado nos idiomas supracitados. Os critérios de exclusão foram: artigos com mais de 5 anos de publicação, dissertações, teses, artigos de revisão da literatura, artigos que não tinham o texto completo disponível e estudos que fugiam do tema proposto por esta revisão. Foi feita a leitura inicial dos títulos e dos resumos dos artigos para avaliar se atendiam aos critérios de inclusão ou de exclusão definidos.
Resultados e Discussão
Encontrou-se, no total, 222 publicações utilizando os descritores citados na metodologia, apenas na base de dados online PubMed. Todos os estudos foram realizados em países estrangeiros, principalmente na China, e redigidos no idioma inglês. Após aplicar os critérios de inclusão, foram selecionados 15 artigos que abordassem o efeito antineoplásico dos componentes do Aloe vera em células cancerígenas humanas.
Todos os estudos citados nesta pesquisa utilizaram a metodologia experimental in vitro com aplicação de compostos secundários da Aloe vera (aloe-emodina e aloína) em diversas linhas celulares de cânceres humanos e in vivo com implantação das células cancerígenas em camundongos. As metodologias são descritas na TABELA 1.
Autor/ano | Título | Metodologia |
Cheng C; Dong W, 2018 [11] | Aloe-Emodin Induces Endoplasmic Reticulum Stress-Dependent Apoptosis in Colorectal Cancer Cells. | Estudo in vitro com linhas celulares SW620 e HT29 tratadas com concentrações de 10, 20 e 40 μM de aloe-emodina por 24 horas. |
Wang Z et. al, 2018 [12] | Aloin induces apoptosis via regulating the activation of MAPKs signaling pathway in human gastric cancer cells in vitro. | Estudo in vitro com linhas celulares de câncer gástrico MKN-28 e HGC-27 tratadas com concentrações de 100, 200 e 400 µg/ml de aloína por 24 horas. |
Akev N et al., 2020 [16] | Comparative Study on the Anticancer Drug Potential of a Lectin Purified from Aloe Vera and Aloe-Emodin | Estudo in vitro com diversas linhas celulares de câncer humano (gástrico AGS, câncer de cólon HCT116, hepatoma HEP3B, leucemia promielocítica aguda HL60, leucemia mieloide crônica K562 e osteossarcoma humano Saos-2) tratadas com concentrações de 400, 800 e 1000 mcg/ml de aloctina e aloe-emodina por 72 horas. |
Gao R et al., 2019 [17] | Anti-tumor effect of aloe-emodin on cervical cancer cells was associated with human papillomavirus E6/E7 and glucose metabolism. | Estudo in vitro com células de câncer cervical HeLa e SiHa associadas ao papiloma vírus humano E6 e E7 tratadas com concentrações de 50 e 100 µM aloe-emodina por 24 horas. |
Trybus W et al., 2018[18] | Induction of Mitotic Catastrophe in Human Cervical Cancer Cells After Administration of Aloe-emodin. | Estudo in vitro com linhas celulares de câncer cervical SiLa e HeLa tratadas com concentrações de 1 a 100 µM aloe-emodina por 48 horas. |
Tao H et al., 2019 [19] | The molecular mechanisms of Aloin induce gastric cancer cells apoptosis by targeting High Mobility Group Box 1. | Estudo in vitro com células de câncer gástrico HGC-27 tratadas com diferentes doses de aloína (100, 200 e 400 µg / ml) por 24 horas. |
Wan L et al., 2017 [20] | Aloin promotes A549 cell apoptosis via the reactive oxygen species-mitogen activated protein kinase signaling pathway and p53 phosphorylation | Estudo in vitro com células de câncer pulmonar A549 com proficiência em p53 tratadas com 200, 300 e 400 µM de aloína por 72 horas. |
Wu YY et al., 2017 [21] | Aloe-emodin (AE) nanoparticles suppresses proliferation and induces apoptosis in human lung squamous carcinoma via ROS generation in vitro and in vivo. | Estudo in vitro com linhas celulares H520, H226, SK-MES-1 e H1299 de células escamosas do pulmão tratadas com concentrações de 10 a 40 µM de aloe-emodina e nano AE por 24 horas. In vivo, foram feitas aplicações das células cancerígenas em ratos e uma semana depois, tratados com 20mg/kg de peso por dia das substâncias durante 22 dias. Apos isso, os animais foram abatidos para análise. |
Peng C et al, 2019 [22] | Study of the aqueous extract of Aloe vera and its two active components on the Wnt/β-catenin and Notch signaling pathways in colorectal cancer cells. | Estudo in vitro utilizando linhas celulares de câncer colorretal NIH/3T3, RKO e HCT-15 tratadas com concentrações de 0 a 9 μM de aloína e aloesina por 24 horas. |
Tseng HS et al., 2017[23] | Aloe-Emodin Enhances Tamoxifen Cytotoxicity by Suppressing Ras/ERK and PI3K/mTOR in Breast Cancer Cells. | Estudo in vitro com as linhas celulares de câncer de mama MCF-7, MDA-MB-231, MDA-MB-468, BT-474 e HCC-1954 tratadas com aloe-emodina por 72 horas. |
Wang S et al., 2020 [24] | Aloe emodin inhibits telomerase activity in breast cancer cells: transcriptional and enzymological mechanism | Estudo in vitro com linhas celulares de câncer de mama MDA-MB-453, MDA-MB-231 and MCF-7 tratadas com doses de 0 a 30 µM aloe-emodina por 48 horas. |
Du Y et al., 2019[25] | Aloe emodin exerts potent anticancer effects in MIAPaCa-2 and PANC-1 human pancreatic adenocarcinoma cell lines through activation of both apoptotic and autophagic pathways, sub-G1 cell cycle arrest and disruption of mitochondrial membrane potential (ΛΨm). | Estudo in vitro com linhas celulares de adenocarcinoma pancreático humano MIAPaCa-2 e PANC-1 tratadas com concentrações de 0, 10, 20 e 40 µM aloe-emodina por 48 horas. |
Sun R et al., 2019 [26] | Combination of aloin and metformin enhances the antitumor effect by inhibiting the growth and invasion and inducing apoptosis and autophagy in hepatocellular carcinoma through PI3K/AKT/mTOR pathway. | Estudo in vitro com células de carcinoma hepatocelular HepG2 e Bel‐7402 tratadas com 50 μmol/L aloína e 400 μmol/L metformina por 48 horas. In vivo, foram inoculados células HepG2 em ratos e após o tumor se tornar palpável, os animais foram tratados com 40 mg/kg de aloína. Após 30 dias, os camundongos foram abatidos e análises realizadas. |
Chang X et al., 2016 [27] | Aloe-emodin suppresses esophageal cancer cell TE1 proliferation by inhibiting AKT and ERK phosphorylation | Estudo in vitro com células cancerígenas do esôfago TE1, KYSE140, Eca109 e EC9706 tratadas com doses de 0, 2.5, 5, 10 e 20 µM de aloe-emodina por 48 horas. |
Li Q et al., 2018 [28] | Aloe-emodin induces apoptosis in human oral squamous cell carcinoma SCC15 cells. | Estudo in vitro com células SCC15 de carcinoma epidermoide oral humano tratadas com doses 0, 12,5, 25, 50, 100 e 200 μM de aloe-emodina por 48 horas. |
No que diz respeito aos compostos secundários do Aloe vera, foram encontrados um maior número de estudos relacionados ao aloe-emodina. Porém, mesmo que a aloína tenha poucos estudos publicados, foi perceptível que ambos os compostos tiveram efeitos citotóxicos em células cancerígenas.
Em um estudo in vitro com diversas linhas celulares de câncer humano, as análises revelaram que células de câncer gástrico (AGS) foram mais sensíveis aos efeitos tanto da aloctina como da aloe-emodina, aumentando a citotoxicidade conforme a dose (FIGURA 3). Os autores destacaram também as concentrações citotóxicas que fornecem 50% da inibição de crescimento celular (IC50) das substâncias aplicadas (TABELA 2). Em conclusão, os autores esperam que o estudo revele achados importantes para o uso futuro do Aloe vera e do aloe-emodina para o tratamento do câncer [16].
Linha celular | Aloe-emodina (µM) |
AGS | 19,03±0,25 |
HCT116 | > 150 |
HEP3B | 201,64± 1,43 |
HL60 | 20,93 ± 1,96 |
K562 | 60,98± 0,90 |
Saos-2 | 33,44 ± 0,68 |
Fonte: Akev et al.[16] |
Em relação ao carcinoma cervical humano, foi comprovado em um estudo in vitro que o composto promoveu a apoptose das células conforme o aumento da dose (FIGURA 4) e diminuiu a expressão das proteínas E6 e E7 relacionadas ao HPV. Outro estudo in vitro realizado com as mesmas linhas celulares mostrou que diferentes concentrações da aloína também aumentou o número de células defeituosas e inibiu a divisão celular nas fases G2 e M. Em conclusão, os autores afirmaram que a substância induz a apoptose e a catástrofe mitótica de células de câncer de colo uterino [17,18].
No câncer gástrico, foi demonstrado em um estudo in vitro que aloína inibiu a proliferação e a migração das linhas celulares MKN-28 e HGC-27, ao interferir negativamente nas vias de sinalização das células através do estresse oxidativo promovido pela enzima Nox 2. Também foi evidenciado em outro ensaio in vitro com a linha celular HGC-27, que o composto aumentou a taxa apoptótica das células em proporção ao aumento da dose e inibiu o nível das proteínas caspase-3, HMGB1 e RAGE (FIGURA 5). Os achados das pesquisas sugerem um papel importante da aloína na proliferação e na migração de células cancerígenas gástricas, com incentivo para novos estudos sobre as propriedades anticancerígenas da substância [12,19]
Em células cancerígenas pulmonares, um estudo in vitro evidenciou nas análises que a aloína induziu apoptose nas células por meio da interrupção do potencial de membrana mitocondrial, elevação dos níveis citosólicos de Ca2+ e ativação do antagonista homólogo do linfoma de células B (Bcl-2) (FIGURA 6). Em outro estudo in vitro e in vivo, a nano aloe-emodina (nano AE) teve efeito supressor significativamente maior que a aloe-emodina na proliferação celular do câncer, realizando uma interrupção induzida do ciclo celular e apoptose. In vivo, a nano AE exibiu efeitos inibitórios no crescimento do tumor com pouca toxicidade. Os autores concluíram que ambos os compostos podem atuar como potenciais agentes terapêuticos no tratamento do câncer de pulmão [20,21].
Quanto ao câncer colorretal, um estudo in vitro demonstrou que a aloe-emodina suprimiu a viabilidade celular e induziu a apoptose das células. Além disso, ambas as linhas celulares, quando expostas ao AE, geraram espécies reativas de oxigênio (ERO), induzindo estresse no retículo endoplasmático (RE). Também foi comprovado em outro estudo in vitro que a aloína ativou a via Wnt/β-catenina e inibiu a via de sinalização Notch na presença de Wnt3a, os quais estão intimamente relacionados ao início e desenvolvimento do carcinoma colorretal (FIGURA 7 e 8). Porém, os impactos do Aloe vera nessas vias cancerígenas ainda não foram completamente determinados. Através desses achados, os autores consideraram que os compostos também podem ser utilizados no tratamento de câncer colorretal através da indução de apoptose e podem auxiliar em mais estudos para entender melhor a carcinogenicidade colônica do Aloe vera [11,22].
No câncer de mama, um estudo in vitro evidenciou que o aloe-emodina aumentou a citotoxicidade na célula induzida por tamoxifeno, reduzindo proteínas relacionadas à neoplasia (EGFR, ER, Ras, ERK, c-Myc) e bloqueando PI3K e ativação mTOR [23]. A exposição contínua ao composto das células por 48 horas também resultou em encurtamento dos telômeros e inibição da telomerase. A transcrição do hTERT foi reprimida pela ativação do E2F1 e inativação das proteínas c-myc nas linhas celulares MDA-MB-231, MDA-MB-453 e MCF-7 (FIGURA 9). Portanto, autores consideram o aloe-emodina como um importante quimiossensibilizante por facilitar a morte celular do câncer mamário [24].
No adenocarcinoma pancreático, um estudo in vitro com as linhas MIAPaCa-2 e PANC-1 tratadas com aloe-emodina, revelou em seus resultados que o aloe-emodina induziu a toxicidade dependente da dose em ambas as células de carcinoma pancreático, sendo as células MIAPaCa-2 mais suscetíveis que PANC-1, além de inibir a formação de colônias de células cancerígenas (FIGURAS 10, 11 e 12). Os autores esperam que estes estudos revelem achados importantes para o uso futuro do Aloe vera e aloe-emodina na pesquisa do câncer [25].
Quanto a outros tipos de células cancerígenas humanas, foi confirmado através de estudo in vitro e in vivo que a aloína induziu a apoptose e a autofagia das células através da via de sinalização celular PI3K/AKT/mTOR em células do carcinoma hepático HepG2 e Bel-7402, diminuiu o número de células invasivas e in vivo, reduziu consideravelmente o peso do tumor e aumentaram o tempo de sobrevivência dos camundongos em relação ao grupo controle (FIGURA 13) [26]. Outros experimentos in vitro também demonstraram que o aloe-emodina suprimiu a proliferação e o crescimento celular e inibiu a fosforilação de AKT e ERK de maneira dependente da dose em células de câncer de esôfago (FIGURA 14) [27]. No carcinoma epidermoide oral humano, o aloe-emodina aumentou a proporção de células apoptóticas e aumentaram os níveis de expressão das proteínas caspase-9 e caspase-3 (FIGURA 15 e 16) [28].
Conclusão
Com o número crescente de casos de câncer no Brasil e no mundo, o desenvolvimento de pesquisas com plantas medicinais torna-se necessário, a fim de auxiliarem ou até mesmo substituírem tratamentos mais invasivos e agressivos ao corpo humano, já que temos uma rica biodiversidade vegetal de caráter terapêutico no país e afora.
Estudos sobre o Aloe vera vêm amplamente demonstrando o efeito cicatrizante da planta, porém, o efeito antioxidante e anticâncer vêm sendo pouco elucidado na literatura. Não foram encontradas publicações brasileiras a respeito de estudos experimentais sobre o efeito citotóxico dos componentes do Aloe vera em células cancerígenas, portanto, o incentivo a pesquisas nacionais seria importante tanto para a evolução do tratamento do câncer quanto para a visibilidade da comunidade científica.
Os estudos in vitro e in vivo citados neste trabalho revelaram que os compostos derivados do Aloe vera (aloe-emodina e aloína) tiveram resultados satisfatórios quanto à atividade antineoplásica em diferentes linhas celulares de câncer humano. Porém, essas substâncias não foram testadas diretamente em seres humanos, revelando que são necessários experimentos clínicos para comprovar a eficácia do Aloe vera no tratamento do câncer.
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