Artigo original

Influência do Processo Extrativo, Solvente e Tamanho da Partícula do Material Vegetal no Teor de Sólidos Totais da Solução Extrativa da Schinus terebinthifolius Raddi.

Influence of Extrative Process, Solvente and Particle Size of Plant Material on the Total Solids Content of Schinus terebinthifolius Raddi Extractive Solutions.

Vasconcelos, E. A. F1;
Barbosa, R. M1;
Medeiros, M. G. F.1;
Moura, T. F. A. L.2*
1Universidade Federal do Rio Grande do Norte
2Departamento de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Av. Gal. Cordeiro de Farias S/N, Petrópolis, 59010-180, Natal, RN, Brasil
*Correspondência:
mouratf@hotmail.com

Resumo

O objetivo deste estudo foi padronizar as condições para obtenção da solução extrativa da Schinus terebinthifolius Raddi. A solução extrativa foi selecionada através do delineamento fatorial do tipo 23 considerando o método de extração (maceração e percolação), líquido extrator (etanol 700 GL e água) e a granulometria (Fração I: partículas totais e Fração II: 710 μm ≥ φ ≥ 210 μm) na proporção planta solvente de 1:10 (m/v), utilizando o resíduo seco como parâmetro de avaliação. Os resultados foram submetidos à análise de variância para verificar a origem dos efeitos e/ou interações. Os resultados comprovaram a importância do método de extração, do solvente e da granulometria do material vegetal no processo extrativo, sendo a granulométrica o fator mais importante na eficiência do processo independente do método.

Unitermos:
Método de extração.
planejamento fatorial.
Schinus terebinthifolius Raddi.

Abstract

The aim of this study was to standardize the method of preparing the extractive solution of Schinus terebinthifolius Raddi. The extractive solution was selected through a 23 factorial design, considering the extraction method (maceration and percolation), extractor solvent (ethanol 70°GL and water) and particle size (Fraction I: total particle and Fraction II: 710 μm ≥ φ ≥ 210 μm) of the plant material into a plant: solvente of 1:10 (m/v), using the dried residue as criterion of evaluation. The ANOVA analysis showed the importance of the extraction method, the extractive solvent and the size of the particles from plant material. The granulometry the most important factor in the process efficiency, independent of the method employed.

Key Words:
Extraction method.
factorial design.
Schinus terebinthifolius Raddi.

Introdução

A espécie Schinus terebinthifolius Raddi é conhecida popularmente no Brasil como Aroeira da Praia, Aroeira do Paraná, Aroeira-pimenteira, Aroeira Mansa e Aroeira Vermelha. É uma planta da família Anarcadiaceae do gênero Schinus, encontrada em terrenos arenosos da Mata Atlântica litorânea do Nordeste do Brasil (LIOGIER, 1988). Como remédio, a Schinus terebinthifolius Raddi é bastante empregada no tratamento de inflamações uterinas e na cicatrização de feridas e úlceras. O decocto das cascas é usado como hemostático, febrífugo e depurativo, em banhos de cicatrização de feridas e no tratamento de aftas e gengivites (MATOS, 1989). Apresenta atividades farmacológicas cientificamente comprovadas como antiulcerogênica, antiinflamatória, antimicrobiana e cicatrizante (FORMIGONI et al., 1988; MARTINES et al., 1996; MAHENDRA et al., 1995; RAPOSO et al., 2002). Quanto à composição química, a literatura relata a presença de óleos essenciais, triterpenos, saponinas e outros polifenóis de menor peso molecular, ácidos pirogálicos e o ácido gálico, como precursor dos taninos hidrolisáveis (BÓRIO et al., 1973; SANTOS, 1988; MATOS, 1989).

A obtenção de fitomedicamentos envolve várias etapas tecnológicas, inseridas num ciclo, que tem início na qualificação da matéria-prima vegetal, passando pelas operações de transformação até a forma farmacêutica final. Durante todos os passos, os parâmetros de qualidade e procedimentos de preparação devem ser bem definidos considerando a complexidade do material vegetal (SONAGLIO et al., 2001). A padronização do processo de obtenção de extratos vegetais está diretamente relacionada com a qualidade do produto final, com o rendimento da operação, a eficácia e até a segurança do uso proposto (LIST; SCHIMIDT, 1989).

A maceração e a percolação foram os métodos de extração avaliados em função da adequação tecnológica, considerando viabilidade econômica para a indústria farmacêutica e outros fatores que influenciam a eficiência da extração, como de grau de divisão do material vegetal, líquido ou mistura de líquidos extratores e às condições do sistema (estático e dinâmico) (LIST; SCHMIDT, 1989; VOIGT, 2000). Este trabalho teve como objetivo avaliar a influência dos parâmetros de extração no teor de sólidos totais dos extratos da solução extrativa da Schinus terebinthifolius Raddi.

Material e Métodos

Matéria vegetal. As cascas da Schinus terebinthifolius Raddi foram coletadas na região da Mata Atlântica da Paraíba. Uma exsicata desta espécie está depositada no Herbário Parque das Dunas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte sob o registro No. 20. O material vegetal foi secado em estufa de ar circulante a 45 ± 2°C, durante 7 dias, e triturado em moinho de facas de aço inox (Visa).

Análise granulométrica. 100g do material vegetal foram pesados e submetidos à passagem forçada através de tamises previamente tarados, com aberturas de malha de 710 μm, 500 μm, 420 μm, 250 μm e 210 μm. A operação foi realizada em tamisador vibratório, a 60 vibrações por minutos durante 20 minutos. Após a tamisação, os materiais recolhidos dos tamises foram pesados individualmente. Para avaliação da distribuição granulométrica foi utilizada a média de três determinações (VOIGT, 1982).

Obtenção dos extratos. O estudo das condições de extração e padronização do método para obtenção dos extratos foi realizado tomando como variáveis: os métodos de extração (Percolação e Maceração), o líquido extrator (Etanol 70 °GL e água destilada) e a granulometria do material vegetal (Fração I: partículas totais e Fração II: 710 μm ≥ φ ≥ 210 μm). A determinação do resíduo seco dos extratos foi utilizada como parâmetro de avaliação. Os extratos macerados foram preparados numa relação material vegetal/líquido extrator na proporção de 100 g/ 1000 mL durante cinco dias a temperatura ambiente. Os extratos percolados foram preparados na mesma relação planta/líquido extrator, empregando percolador com velocidade de gotejamento de 10 gotas.min.-1, perfazendo um volume final de 1000 mL

Determinação do resíduo seco. Em pesa-filtros previamente tarados, foram pesadas amostras de 20,0 g do extrato hidroalcoólico, em seguida evaporados em banho-maria até secura. Os pesa-filtros foram colocados em estufa a 105 ± 2 °C por duas horas, resfriados em dessecador e pesados. Em seguida, recolocados em estufa por mais 30 minutos, repetindo este procedimento até peso constante. Os resultados foram expressos em relação a 100,0 g do extrato líquido, pela média de cinco determinações (DEUTSCHES, 1986).

Tabela 1: Fatores e níveis para realização do planejamento fatorial do processo de extração
Fatores Níveis
A: Método de Extração + Percolação
- Maceração
B: Solvente + Etanol 70°GL
- Água
C: Granulometria + Fração II
- Fração I
Tabela 2: Avaliação padrão dos efeitos principais e interação em um planejamento fatorial 23
N de Ensaios Tratamento Efeitos Interações Resultados
A B C AB AC BC ABC
1 (1) - - - + + + - Y1
2 a + - - - - + + Y2
3 b - + - - + - + Y3
4 ab + + - + - - - Y4
5 c - - + + - - + Y5
6 ac + - + - + + - Y6
7 bc - + + - - - - Y7
8 abc + + + + + + + Y8

Planejamento fatorial. O planejamento fatorial foi utilizado como um tratamento racional para avaliar o efeito de cada fator sobre o resíduo seco dos extratos. O delineamento fatorial foi do tipo 23, onde foram estudados três fatores em dois níveis (Tabela 1). Os experimentos foram ordenados ao acaso e sem repetições (Tabela 2) (10). Para verificar o comportamento dos efeitos dos fatores selecionados na resposta do experimento, utilizou-se a ferramenta estatística análise de variância - ANOVA. As observações foram descritas pelo seguinte modelo de efeitos fixos:

γijkl=μ+αijk+(ατ)ij+(αβ)ik+(τβ)jk+(ατβ)ijkijkl

Onde:

γijkl: teor de resíduo seco; m: média geral; αi: método de extração, ι = 1,2; τj: solventes, j = 1,2; βk: granulometria, κ = 1,2; (ατ)ij: método de extração x solvente; (αβ)ik: método de extração x granulometria; (τβ)jk: solvente x granulometria; (ατβ)ijk: método de extração x solvente x granulometria; εijkl: erros aleatórios.

Resultados e Discussão

A obtenção de soluções extrativas da Schinus terebinthifolius Raddi, teve como variáveis os métodos de extração, o líquido extrator e a granulometria do material vegetal. A análise granulométrica do material vegetal por tamisação demonstrou que as partículas encontram-se predominantemente distribuídas nas classes entre 250 a 710 μm (Tabela 3). Segundo a classificação da Farmacopéia Brasileira (1988), a faixa granulométrica do material vegetal foi classificada como pó moderadamente grosso. A influência da granulometria do material vegetal foi estudada quanto à eficiência do método de extração e do solvente utilizado, através da determinação do teor de resíduo seco (teor de sólidos totais).

Figura 1: Influência do tamanho de partículas, do solvente e do método de extração no teor de resíduo seco dos extratos da Schinus terebinthifolius Raddi
Figura 1
MA1: Macerado aquoso (fração I), PA1: Percolado aquoso (fração I), ME1: Macerado hidrolacoólico (fração I), PE1: Percolado hidroalcoólico (fração I), MA2: Macerado aquoso (fração II), PA2: Percolado aquoso (fração II), ME2: Macerado hidrolacoólico (fração II) e Percolado hidroalcoólico (fração II).
Tabela 3: Granulometria do material vegetal após tamisação
CG (μ m) ∆ m (µm) m (µm) F% R% P% F x m
Acima de 710 - - 24,0 24,0 76,0 17040
710 - 500 210 605 41,0 65,0 35,0 24805
500 - 420 80 460 4,0 69,0 31,0 1840
420 - 250 170 335 9,0 78,0 22,0 3015
250 - 210 40 230 2,0 80,0 20,0 460
Menores que 210 210 105 20,0 100,0 0,0 2100
Total 49260
CG(μm): Classe granulométrica; Äm (μm): Intervalo de abertura de malha; m (μm): Abertura média da malha; F%: Fração retida em percentagem; R%: Fração retida acumulada; P%: Fração de passagem acumulada; Fxm: fração retida x abertura média.
Tabela 4: Análise de variância do experimento fatorial para a variável teor de resíduo seco
Fonte de Variação Grau de
liberdade
Quadrado Médio F p-valor
métodos de extração 1 1,450417 771,840 0,000000
solvente 1 3,300417 1756,319 0,000000
granulometria 1 1,983750 1055,654 0,000000
métodos de extração x solvente 1 0,066150 35,202 0,000021
métodos de extração x granulometria 1 0,874017 465,109 0,000000
solvente x granulometria 1 0,066150 35,202 0,000021
métodos de extração x solvente x granulometria 1 0,036817 19,592 0,000423
CG(μm): Classe granulométrica; Äm (μm): Intervalo de abertura de malha; m (μm): Abertura média da malha; F%: Fração retida em percentagem; R%: Fração retida acumulada; P%: Fração de passagem acumulada; Fxm: fração retida x abertura média.

Conforme pode ser observado na Figura 1, os maiores valores de resíduo seco foram obtidos tanto por maceração quanto por percolação com partículas selecionadas, tornando necessário estudar as causas de variação e as interações. Analisando a probabilidade de significância do teste F, verificou-se que o teste foi significativo, em nível de 5% para as causas de variação: método de extração, solvente, granulometria, e as interações: método de extração x solvente, método de extração x granulometria, solvente x granulometria, método de extração x solvente x granulometria (Tabela 4).

Devido à evidência de ocorrência de comportamento diferenciado para o efeito das interações tornou-se necessário estudar cada uma delas separadamente, detectando qual combinação que realmente influencia neste comportamento. Observando o Diagrama de Pareto, representado na Figura 2, vê-se a importância de cada fator no teor de resíduo seco. O solvente foi a fonte de variação que mais influenciou na eficiência das extrações, o etanol 70 oGL foi o que conferiu os maiores valores de resíduo seco, isto pode ser explicado pela diferença de polaridade entre os solventes em questão, sendo os constituintes majoritários (taninos, saponinas, açúcares dentre outros) dessa espécie altamente solúvel em misturas hidrolacoólicas e, dentro das interações, o método de extração x granulometria foi o mais significante.

Como ocorreram interações entre os três fatores, estudou-se o que acontece dentro de cada nível de granulometria para os métodos de extração x solvente, através da técnica de contrastes ortogonais (Figura 3). De acordo com a ANOVA dos contrastes dentro do nível de granulometria não-selecionada, em nível de significância de 5%, ocorreram diferenças significativas entre os efeitos dos métodos de extração x solvente, com exceção de (ME1 x PA1).

Figura 2: Diagrama de Pareto para os efeitos padronizados da variável resíduo seco
Figura 2
Figura 3: Médias do teor do resíduo seco para observações dos efeitos dos tratamentos no processo extrativo.
Figura 3

Isto corrobora a Figura 2, que indica que o solvente de polaridade adequada exerce maior impacto sobre o resíduo seco. Além disso, a percolação percebeuse ser considerado um método mais eficiente nessas condições, o que explicaria o teor de resíduo seco semelhante para (PA1 x ME1). No entanto, sabe-se que num processo extrativo o grau de divisão do material vegetal irá influenciar diretamente na eficiência do método. No caso de órgão como caule, os tecidos são extraordinariamente compactados, portanto o poder de penetração dos solventes depende, entre outros fatores, da consistência dos tecidos que formam o material a extrair, sendo necessário considerar que quanto mais rígido o material, menor deve ser sua granulometria. Porém, considerando os métodos em questão o grau de divisão das partículas pode representar um fator limitante, pois partículas muito pequenas tendem a formar uma camada de pó compacta dificultando a penetração do solvente, conseqüentemente influenciando no rendimento da extração. Para a granulometria selecionada (tamanho intermediário), de acordo com a ANOVA dos contrastes, em nível de significância de 5%, observouse diferenças significativas entre os efeitos método de extração x solvente para (MA2 x ME2), (ME2 x PA2), (PA2 x PE2), (MA2 x PA2). Neste caso, verificou-se um aumento circunstancial no rendimento da extração pelo método de maceração em comparação às extrações realizadas com droga de granulometria não-selecionada, ressaltando a importância da seleção granulométrica em função do rendimento do processo de extração.

Assim, utilizando-se o solvente adequado (etanol 70 oGL) e selecionando-se a granulometria, não houve diferença significativa no teor de resíduo seco em função do método de extração (PE2 x ME2). Estes resultados comprovam a importância do método de extração, do solvente extrator e da granulometria do material no processo extrativo e, conseqüentemente, no rendimento da operação, onde a limitação de um fator pode ser superada pela mudança de nível dos outros fatores. A padronização granulométrica do material vegetal e o líquido extrator foram os fatores mais importantes na eficiência do método de extração, considerando a quantidade de sólidos totais na solução extrativa como critério de avaliação. O planejamento fatorial aplicado na padronização do processo extrativo confirmou que a percolação foi o método mais eficiente, devendo salientar que outros fatores também são muito importantes no sucesso da extração. Os fatores de granulometria e líquido extrator foram os mais importantes na eficiência do método de extração, considerando-se a quantidade de sólidos totais no extrato vegetal como critério de avaliação, podendo até superar a deficiência do método.

Referências

DEUTSCHES Arzneibuch. 9. Ausgabe. Stuttgart: Wissens Chafttiche, 1986.

FARMACOPÉIA Brasileira, 4 ed. São Paulo: Ateneu, 1988.

FORMIGONI, M.L.O.; CARLINI, E.A. Efeitos dos decoctos da aroeira da praia (Schinus terebinthifolius Raddi) e da aroeira do sertão (Astronium urundeuva Engl) sobre a úlcera experimental em ratos. In: Anais do 10o Simpósio de Plantas Medicinais Do Brasil, São Paulo, SP, 1988.

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