ARTIGO DE PESQUISA

Assentamento Lagoa do Prado: ações de intervenção em saúde no Nordeste do Brasil

Lagoa of the Prado settlement: social intervention actions in Northeastern Brazil

https://doi.org/10.32712/2446-4775.2024.1449

Melo, André Cades Barbosa Paz Oliveira1*
ORCID https://orcid.org/0000-0002-0246-4453
Santos, Maria Hortencia Borges2
ORCID https://orcid.org/0000-0002-2787-3843
Santos, Clara Luz Borges3
ORCID https://orcid.org/0000-0002-9523-594X
Rodrigues, Rosângela Sousa de Gois4
ORCID https://orcid.org/0000-0003-3864-7945
Rodrigues, Brenda Maria de Gois4
ORCID https://orcid.org/0000-0003-2976-5237
Meireles, Dhwliane Silva2
ORCID https://orcid.org/0000-0001-5267-6430
Pereira, Lucas Gabriel Nunes3
ORCID https://orcid.org/0009-0007-6434-993X
1Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar), Av. São Sebastião, nº 2819, B. Nossa Senhora de Fátima, CEP 64202-020, Parnaíba, PI. Brasil.
2UFPI - Universidade Federal do Piauí (UFPI), Campus Universitário Ministro Petrônio Portella Bairro Ininga, CEP 64049-550, Teresina, PI, Brasil.
3Instituto Federal do Piauí (IFPI), Avenida Monsenhor Antônio Sampaio, S/N. Bairro Dirceu Arcoverde. CEP 64211-145, Parnaíba, PI, Brasil.
4Centro Universitário Maurício de Nassau Piauí (UNINASSAU), Rodovia BR-343, Km 7,5 S/N, Floriópolis, CEP 64204-260, Parnaíba, PI, Brasil.
*Correspondência:
andrekcades@gmail.com

Resumo

A interação do homem com o meio ambiente é complexa e dinâmica, envolvendo fatores que podem sofrer alterações ao longo do tempo, como o controle de doenças, que se baseia em intervenções sociais. No Nordeste do Brasil, em Parnaíba, Piauí, existe uma comunidade rural distante da cidade, o assentamento Lagoa do Prado. As famílias que residem na região não têm acesso a programas de saúde contínuos; o posto de saúde mais próximo fica localizado na Baixa da Carnaúba, outra localidade do município de Parnaíba, Piauí. Diante disso, foram realizadas ações sociais de saúde no assentamento Lagoa do Prado, em Parnaíba, Piauí, por meio da aferição da pressão arterial, glicemia capilar, teste de COVID-19 e verificação de dados antropométricos. Para a coleta de dados, foram utilizadas técnicas de pesquisa como observação direta, intervenção e entrevistas. A população do estudo foi composta por 87 trabalhadores rurais. Assim, a promoção da saúde em áreas rurais torna-se necessária, especialmente as atividades direcionadas à transformação dos comportamentos dos indivíduos, com foco na análise e mudança de hábitos de vida.

Palavras-chave:
Comunidade rural.
Programa de saúde.
Estratégias.
Covid-19.

Abstract

The interaction between humans and the environment is complex and dynamic, involving factors that may change over time, such as disease control, which relies on social interventions. In Northeast Brazil, in Parnaíba, Piauí, there is a rural community located far from the city, the Lagoa do Prado settlement. The families living in the region do not have access to continuous health programs; the nearest health post is located in Baixa da Carnaúba, another locality in the municipality of Parnaíba, Piauí. Therefore, social health actions were carried out in the Lagoa do Prado settlement, Parnaíba, Piauí, through blood pressure measurement, capillary blood glucose testing, COVID-19 testing, and anthropometric data collection. For data collection, research techniques such as direct observation, intervention, and interviews were used. The study population consisted of 87 rural workers. Thus, health promotion in rural areas becomes necessary, especially activities aimed at transforming individuals' behaviors, focusing on the analysis and change of lifestyle habits.

Keywords:
Rural Community.
Health program.
Strategies.
Covid-19.

Introdução

A interação entre o homem e o meio ambiente é complexa e dinâmica, envolvendo fatores que podem sofrer alterações ao longo do tempo, como o controle de doenças, que se baseia em intervenções sociais[1].

Na saúde pública, são comuns as ações de intervenção social voltadas para a promoção da saúde e a prevenção de doenças. Essas ações fornecem informações de forma clara e acessível às comunidades, visando gerar mudanças de comportamento e facilitar a transferência de conhecimento[2].

Nesse sentido, a definição social do processo saúde/doença ocorre por meio da organização dos serviços de atenção integral à saúde no território. Através da observação das dinâmicas das atividades humanas e das situações de risco nelas concretizadas, é possível intervir nos condicionantes, nos riscos e nos impactos à saúde[3].

Considerando que os dados estatísticos sobre a propagação de doenças no Brasil se referem a populações de diferentes localidades, as estratégias de políticas de saúde são direcionadas para combater os fatores que colocam em risco a saúde dessas populações. O Sistema Único de Saúde (SUS) torna-se mais resiliente em cada região, garantindo integralidade, equidade e descentralização em todo o território brasileiro[4,5].

No entanto, há dificuldades em relação às políticas de saúde descentralizadas, pois existem populações de difícil acesso que tendem a ficar desamparadas nos processos de desenvolvimento epidemiológico[4,5]. Inclusive, recentemente, com a disseminação do vírus SARS-CoV-2 durante a pandemia de COVID-19 em todo o mundo[6].

Os atores sociais de comunidades rurais enfrentam maiores dificuldades de adesão ao tratamento de patologias, que muitas vezes são apenas subdiagnosticadas ou até mesmo desconhecidas. Um exemplo disso é o diagnóstico da hipertensão arterial e do diabetes mellitus, que requer monitoramento contínuo[7,8].

Em comunidades isoladas, onde não há acompanhamento contínuo de equipes de saúde da família, muitos pacientes desconhecem as patologias crônicas que possuem. Frequentemente, essas condições só são descobertas durante crises agudas, quando os pacientes são internados em hospitais de média ou alta complexidade. Situação semelhante ocorre com pacientes obesos, hipertensos e diabéticos, que necessitam de acompanhamento ambulatorial regular.

No Nordeste do Brasil, em Parnaíba, Piauí, há uma comunidade rural distante da cidade chamada assentamento Lagoa do Prado. As famílias que residem nessa região não têm acesso a programas de saúde contínuos, e o posto de saúde mais próximo está localizado na Baixa da Carnaúba, outra localidade do município de Parnaíba.

Dessa forma, foram realizadas ações sociais de saúde no assentamento Lagoa do Prado, em Parnaíba, Piauí. As intervenções incluíram a aferição da pressão arterial, a medição da glicemia capilar, testes de identificação para COVID-19, palestras e a verificação dos dados antropométricos.

Materiais e Métodos

Área de estudo

Este é um estudo de intervenção realizado com a população rural do assentamento Lagoa do Prado, no município de Parnaíba, Piauí. A pesquisa foi conduzida na Baixada Carnaúba, uma área rural que abriga 75 famílias distribuídas em 970 hectares[9].

Coleta de dados

Para a coleta de dados, foram empregadas as seguintes técnicas de pesquisa: observação direta, intervenções (como aferição da pressão arterial, medição de glicemia capilar, teste de COVID-19, palestras e verificação de dados antropométricos), entrevistas e revisão de literatura, incluindo pesquisas no acervo da biblioteca virtual do Portal de Periódicos da Capes e publicações do Ministério da Saúde.

A observação direta foi realizada durante as visitas à Associação de Trabalhadores Rurais, com duração média de cinco horas cada. Segundo Yin[10], as observações diretas podem ocorrer durante as visitas de campo, inclusive quando outras evidências estão sendo coletadas. Nesse contexto, cinco visitas foram conduzidas, e durante essas ocasiões foram realizadas as intervenções.

Os momentos foram oportunos para observar e captar aspectos que nem sempre foram verbalizados durante a etapa de intervenção. A análise dos dados seguiu a técnica de análise de conteúdo e sua abordagem qualitativa[11,12].

População e amostra: critérios de inclusão e exclusão

A população do estudo foi composta por 87 trabalhadores rurais, contatados intencionalmente e por acessibilidade, todos residentes no assentamento. Inicialmente, foi estimado um total de 80 participantes, com mais de dezoito anos, residentes da comunidade.

O critério de inclusão considerou os trabalhadores rurais residentes na localidade estudada, enquanto o critério de exclusão foi a recusa em participar da pesquisa. As intervenções foram realizadas com a ajuda de um profissional de saúde local. Assim, estudos dessa natureza são recomendáveis para a avaliação de políticas e programas de saúde, pois permitem detectar com maior precisão o sucesso ou a falha da intervenção, aumentando a validade dos resultados[13].

Resultados e Discussão

Assentamentos (assentamento lagoa do prado)

De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), assentamentos de reforma agrária são conjuntos de unidades agrícolas estabelecidas pelo INCRA em imóveis rurais. Cada unidade, conhecida como parcela ou lote, é destinada a uma família de agricultores ou trabalhadores rurais sem condições econômicas para adquirir um imóvel rural. A família beneficiada deve residir e explorar o lote, desenvolvendo atividades produtivas diversas. A quantidade de lotes ou parcelas em um assentamento é determinada com base em um estudo da capacidade de geração de renda do imóvel[14].

Atualmente, há 9.256 assentamentos em todo o Brasil, ocupando uma área total de 88.314.857 hectares. No Piauí, existem 499 assentamentos, beneficiando 31.169 famílias. Cada unidade é chamada de parcela, lote ou gleba, e é concedida pelo INCRA a grupos familiares que não têm condições econômicas de adquirir e manter um imóvel rural por outros meios[15].

No Piauí, em Parnaíba, o assentamento Lagoa do Prado, apoiado pelo MST, enfrenta ameaças de despejo ilegal. O povoado, que existe há 17 anos e é registrado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), tem a atividade agrícola como uma das principais fontes de subsistência. A região abrange uma área de 970 hectares, desapropriada pelo INCRA/PI em 27 de novembro de 2003[16,17].

Nos últimos anos, empresários de Parnaíba têm tentado, de forma furtiva, se apropriar das terras destinadas a mais de 75 famílias de pequenos agricultores. O assentamento, com quase duas décadas de existência, possui benfeitorias construídas pelas famílias assentadas e foi desapropriado com o objetivo de reforma agrária. O despejo dessas famílias não apenas deixaria os moradores sem moradia e meios de sobrevivência, mas também constitui um crime e uma violação dos direitos e do estado democrático de direito (FIGURA 1).

FIGURA 1: Assentamento Lagoa do Prado em Parnaíba, Piauí.
Figura 1
Fonte: autores (2020).

No município, a agricultura familiar é predominante, com uma variedade de atividades nas propriedades. Cerca de 80 famílias vivem da agricultura familiar, produzindo aproximadamente 50 toneladas de macaxeira (Manihot esculenta) por ano, além de milho (Zea mays), arroz (Oryza sativa), feijão (Phaseolus vulgaris), legumes diversos e pequenos animais[16].

Atualmente, a população local conta com parcerias de universidades da região, como a Universidade Estadual do Piauí (UESPI), através do Projeto Cajuí, que promove a produção de alimentos em quintais produtivos, incluindo plantas frutíferas e hortaliças.

É importante destacar que os assentados pagam pelo lote recebido do INCRA e pelos créditos contratados. Além da distribuição de terras, os assentamentos da reforma agrária oferecem condições de moradia e produção familiar, assegurando a segurança alimentar para brasileiros das zonas rurais que, anteriormente, estavam em risco alimentar e social[14].

Ações de intervenção no assentamento Lagoa do Prado, Parnaíba, Piauí

A saúde é essencial para o desenvolvimento humano. Os indivíduos devem estar cientes e no controle de sua própria saúde[18]. Entre os principais meios de capacitação para a promoção da saúde estão: criar ambientes favoráveis, desenvolver habilidades para uma vida melhor e garantir o acesso à informação sobre saúde. Tanto na promoção da saúde quanto na prevenção de doenças, é crucial utilizar estratégias eficazes.

Empregar estratégias para captar a atenção dos indivíduos e facilitar a transferência de informações, adaptando-se aos elementos culturais da sociedade, é uma abordagem válida[18]. Assim, o uso de estratégias é fundamental para colaborar na construção dos aspectos relacionados à promoção e prevenção da saúde. Essas estratégias podem agregar valor às informações transmitidas.

No contexto da saúde, as estratégias empregadas nas ações de intervenção social são éticas, pois visam salvar vidas e melhorar as condições de vida. As intervenções informacionais baseadas em estratégias também são éticas, pois adaptam as informações às necessidades do indivíduo e do grupo, promovendo a inclusão social (QUADRO 1).

QUADRO 1: Estratégias informacionais.
ESTRATEGIA CONCEITO
Estratégias comunicacionais Construídas a partir de conceitos e modelos teóricos da Comunicação e atuam no momento da transferência da informação do emissor para o receptor da informação.
Estratégias discursivas Construídas a partir de conceitos e modelos teóricos extraídos da Comunicação e da Linguística. Elas são empregadas na formatação dos diversos tipos de discursos, inclusive os imagéticos.
Estratégias cognitivas Observam conceitos e modelos da Cognição e atuam na percepção da informação pelo indivíduo. É baseada no saber, nos sentimentos e nas crenças do indivíduo que, por sua vez, tem uma ligação com uma classe social, época ou cultura.
Estratégias socioculturais Construídas a partir de conceitos e modelos extraídos da Sociologia e da Antropologia e atuam na contextualização da informação. Esse tipo de estratégia que atua a partir do conhecimento da realidade, da vida cotidiana do indivíduo, de suas necessidades, comportamento, interação e expectativa social, auxiliando a transferência da informação.
Estratégias de poder Estabelecidas a partir do lugar de fala de quem transfere a informação. Elas se constituem por meio do próprio discurso, da imagem, do contexto social dentro de um tempo e um espaço histórico. Elas atuam na imposição ou legitimação da informação.
Estratégias educacionais Construídas a partir de conceitos e modelos obtidos da educação e atuam na formação e renovação dos indivíduos pela informação, para a vida individual, estando fortemente ligada à comunicação. Ela mune o indivíduo com informações, proporcionando-lhe senso crítico e desenvolvendo capacidades para resolver problemas. Aprender significa saber como agir.
Fonte: Moraes[18].

No presente estudo, foram empregadas estratégias informacionais educativas. Os pesquisadores realizaram palestras abordando o contexto da COVID-19, métodos preventivos para pressão arterial, diabetes mellitus, colesterol, e a incorporação de hábitos saudáveis na alimentação, proteção contra raios solares, e, especialmente, a prevenção por meio do uso de máscaras para evitar doenças respiratórias, além de promover a higiene das mãos e dos alimentos.

A ação em saúde ofereceu um breve histórico da saúde da comunidade estudada por meio de consultas médicas e triagem, incluindo aferição da pressão arterial, teste glicêmico e cálculo do IMC. Foram identificadas pessoas em risco de hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus, e todos os participantes realizaram o teste de identificação para a COVID-19. Além das palestras sobre hábitos saudáveis e qualidade de vida, foram discutidos métodos preventivos para evitar a COVID-19 (FIGURA 2).

FIGURA 2: Palestra sobre a pandemia de COVID-19 no assentamento Lagoa do Prado, em Parnaíba, Piauí.
Figura 2
Fonte: autores (2020).

Dos 87 indivíduos atendidos, 44,52% relataram ser portadores de hipertensão arterial, 33,58% de diabetes mellitus, e 21,90% apresentaram ambos os problemas, hipertensão e diabetes mellitus. Outros parâmetros analisados incluíram: frequência de cefaleia (62,70%), alergias (16,32%), conjuntivite (12,29%), uso de medicação controlada (5,41%) e histórico de câncer na família (3,28%).

Entre as aferições de pressão arterial, 71,33% estavam dentro do padrão normal, variando entre 100x80 e 130x80 mmHg. Em relação à glicemia capilar, 89,21% dos participantes apresentaram níveis entre 80 e 127 mg/dL, considerando a glicemia antes e após as refeições.

No que diz respeito ao índice de massa corporal (IMC), 90,52% dos participantes estavam com índice normal, 6,20% estavam acima do peso e 3,28% abaixo do peso. Para os testes de diagnóstico de COVID-19, todos os resultados foram negativos. Esse resultado sugere que a baixa incidência de casos pode estar relacionada ao cuidado da comunidade com o uso de máscaras, ao distanciamento social e à localização do assentamento, que é distante dos centros urbanos (FIGURA 3).

FIGURA 3: Realização de teste de covid-19 e glicemia capilar na comunidade.
Figura 3
Fonte: autores (2020).

Apesar dos testes de detecção de COVID-19 realizados no assentamento piauiense terem apresentado resultados negativos, a doença continua sendo uma preocupação significativa. No Brasil, em 3 de fevereiro de 2022, a média móvel de infecções registrou 189,5 mil casos, conforme o painel sobre COVID-19 do Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass). Este número supera o recorde anterior de 77,3 mil infecções, registrado em 23 de junho de 2021.

A onda da variante ômicron, em particular, causou um pico de casos 2,4 vezes maior do que o recorde anterior[19]. Embora a situação atual seja relativamente melhor, é prematuro considerar a COVID-19 como uma doença endêmica no país. Na prática, isso significa que o uso de máscaras pode continuar sendo recomendado em determinados espaços públicos. Além disso, é importante manter hábitos como a lavagem constante das mãos e a permanência em casa ao surgirem sintomas típicos de infecções respiratórias. É necessário um cuidado especial com grupos vulneráveis, como idosos e pessoas imunossuprimidas.

Portanto, mesmo quando a COVID-19 for considerada uma endemia, não haverá relaxamento no sistema de saúde; ao contrário, serão necessários mais recursos para atender à demanda e cuidar das pessoas[19]. No que se refere às Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), elas são atualmente responsáveis pela maioria das doenças e mortes em muitos países, sendo consideradas uma verdadeira epidemia.

Em 2011, as DCNT representaram dois terços (36 milhões) de todas as mortes globais, um aumento de 60% em relação aos 31 milhões registrados em 2000. Aproximadamente 80% das mortes por DCNT ocorrem em países de baixa renda, onde 29% da população tem menos de 60 anos, comparado a apenas 13% em países de alta renda[20]. No Brasil, as DCNT são o problema de saúde de maior magnitude, responsáveis por 72% das mortes, destacando-se doenças do aparelho circulatório (31,3%), câncer (16,3%), diabetes (5,2%) e doenças respiratórias crônicas (5,8%). Essas condições afetam indivíduos de todas as camadas socioeconômicas, com maior impacto em grupos vulneráveis, como idosos e pessoas com baixa escolaridade e renda[21].

Em relação aos atendimentos de saúde no assentamento estudado, observou-se que 64,46% dos moradores relataram adoecer e tratar-se em casa, enquanto 25,31% procuraram os postos de saúde mais próximos para cuidados paliativos, como a Unidade Básica de Saúde da Baixa da Carnaúba e Parnaíba, Piauí. Além disso, 10,23% dos moradores disseram não precisar de atendimento médico. Essa situação contribuiu para as alterações nas pressões arteriais e glicemias, devido à falta de atendimento médico adequado na região.

Alguns moradores relataram que, apesar de viverem há muito tempo sem atendimento médico, continuam enfrentando problemas de saúde. Como foi mencionado por alguns senhores da comunidade:

(...) fui mordido por um jacaré há mais de 10 anos, meu pé ainda ta ferido, nunca sarou, nunca fui atendido por médico, eu cuido do meu pé lá em casa com os remédios do mato. M, 53.

(...) coloquei veneno nas minhas plantações, minha mulher tava perto e cheirou o veneno junto, ficou envenenada o jeito foi levar na cidade pro médico ver. M, 49.

No assentamento, não há hospitais ou postos de saúde disponíveis. A comunidade conta apenas com a assistência de uma técnica de enfermagem, que realiza orientações de saúde e procedimentos simples, como aferição da pressão arterial, teste de glicemia e curativos.

Em áreas rurais, os profissionais de saúde precisam ser mais versáteis e realizar uma gama mais ampla de procedimentos do que em centros urbanos, onde há maior disponibilidade de especialistas e recursos. Portanto, os profissionais devem estar preparados para atender uma população com características distintas da urbana, encontrando pessoas e histórias moldadas pelo contexto em que vivem[22].

Os recursos e profissionais de saúde no assentamento são limitados. Os moradores recorrem a outros meios para manter seu bem-estar, utilizando os recursos naturais disponíveis para sua subsistência. No processo de adoecimento, também fazem uso desses recursos naturais.

Atualmente, a população local conta com parcerias de universidades da região, como a Universidade Estadual do Piauí (UESPI), através do Projeto Cajuí. Este projeto promove a produção de alimentos em quintais produtivos, incluindo plantas frutíferas e hortaliças. Ao final do projeto, após as orientações médicas, procedimentos de enfermagem e palestras, os membros do Projeto Cajuí doaram frutas ricas em vitamina C, como a tangerina (Citrus reticulata Blanco), à comunidade. Essa doação foi importante para fortalecer a imunidade dos moradores, especialmente considerando que o projeto foi realizado no primeiro ano da pandemia no município.

O estudo foi conduzido de maneira satisfatória. A população mostrou-se disciplinada e atenta durante as reuniões, demonstrando gratidão ao longo das visitas. Há planos para retornar à região e repetir o projeto para avaliar a situação atual da comunidade. Os projetos de intervenção social na área da saúde têm como objetivo principal reduzir a incidência de doenças em áreas urbanas e rurais, prevenindo a formação de epidemias. Além disso, buscam melhorar a qualidade de vida e educar os indivíduos e suas comunidades.

No entanto, é fundamental que a capacitação da população alcance um nível educacional adequado para assimilar as informações transmitidas, e que essas informações sejam apresentadas de maneira adequada, seja em contextos rurais ou urbanos. A Atenção Primária é a porta de entrada do SUS e aborda os problemas mais comuns na comunidade, oferecendo serviços de prevenção, tratamento e reabilitação para maximizar a saúde e o bem-estar[22]. É importante destacar que, apesar das intervenções em saúde, a presença e o acompanhamento contínuo por profissionais de saúde são essenciais para o bem-estar dos moradores rurais.

Conclusão

Neste artigo, a proposta foi intervir nos cuidados paliativos para a saúde, com o objetivo de compreender a realidade dos moradores rurais e auxiliá-los no tratamento e prevenção de determinadas patologias. A análise não se concentrou em como os informantes viviam, mas sim em como adaptar suas práticas para promover uma vida mais saudável.

Embora a compreensão das condições de vida dos moradores rurais seja relevante para uma análise crítica, o foco principal foi a adaptação para um estilo de vida mais saudável. As triagens, consultas médicas e palestras foram essenciais para identificar possíveis doenças crônicas ou agudas.

Em comunidades rurais, onde o acesso à saúde é frequentemente limitado, essas informações colaborativas são cruciais para o bem-estar dos habitantes. Através dos relatos dos moradores, foi possível perceber a carência de atenção por parte dos órgãos assistenciais. Mesmo vivendo em um assentamento, esses indivíduos têm direito à saúde e cidadania. Portanto, a promoção da saúde em áreas rurais é fundamental, especialmente na transformação dos comportamentos dos indivíduos e na mudança de hábitos de vida.

Fontes de Financiamento

O apoio da Universidade Estadual do Piauí (UESPI), por meio do Projeto Cajuí, incluiu a disponibilização de transporte para a área de estudo, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e aparelhos, como balanças, fita métrica, glicosímetros, lancetas, esfigmomanômetro e testes de identificação para a COVID-19.

Conflito de Interesses

Não houve conflito de interesses entre os autores.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela disponibilidade dos manuscritos para a elaboração do artigo, e às instituições de ensino superior: Universidade Federal do Piauí (UFPI), Universidade Estadual do Piauí (UESPI), Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar), Instituto Federal do Piauí (IFPI) e Uninassau, por fornecerem o aparato essencial para a condução da pesquisa.

Colaboradores

Concepção do estudo: ACBPOM
Curadoria dos dados: MHBS; DSM
Coleta de dados: CLBS; ACBPOM; MHBS
Análise dos dados: RSGR; BMGR; MHBS  
Redação do manuscrito original: BMGR; MHBS
Redação da revisão e edição: DSM; ACBPOM; MHBS; LGNP.

Referências

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