Farmacologia
Análise morfométrica dos túbulos seminíferos de camundongos suplementados com óleo de alho
Morphometric analysis of seminiferous tubules of mice supplemented with garlic oil
- Autores:
- 1Alexandre Schneider Angioletti;
- 1Nilo Francisco Zancanaro Filho;
- 1Silvana Tomazoni de Oliveira.
- Instituições
- 1Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI
- Correspondência:
- nilozancanaro@hotmail.com
Resumo
Introdução: O alho (Allium sativum) é amplamente utilizado na culinária e no tratamento e prevenção de diversas patologias. A literatura carece quanto à toxicidade e os efeitos que o consumo exacerbado de alho pode ocasionar no sistema reprodutor masculino. O óleo de alho é composto por compostos voláteis presentes em seus bulbos. Este estudo tem como objetivo avaliar a morfometria de túbulos seminíferos de camundongos suplementados com óleo de alho. Metodologia: Foram tratados 32 camundongos BALB/c machos divididos em 4 grupos experimentais: 1,4 mg/kg (dose terapêutica); 14 mg/kg; 28 mg/kg; e controle incorporado ao farelo de ração. Após o período experimental os animais foram sacrificados e tiveram os testículos removidos e pesados. Após os procedimentos padrões para preparação das lâminas histológicas, foi medida a espessura dos túbulos seminíferos, através da distância da parede até o lúmen. Resultados e Discussão: Através das medições, não foram observadas diferenças estatísticas que pudessem indicar alterações nestas estruturas em animais suplementados com óleo de alho quando comparados aos animais do grupo controle. A partir deste estudo conclui-se que camundongos suplementados com óleo de alho, em diferentes doses, em um período de 35 dias, não apresentaram alterações na morfometria de túbulos seminíferos que pudessem indicar toxicidade.
- Palavras-chave:
- Alho;
- Allium sativum;
- túbulos seminíferos;
- histologia;
- camundongos;
- fitoterápicos.
Abstract
Introduction: Garlic (Allium sativum) is widely used in cooking and in the treatment and prevention of various diseases. The literature lacks for toxicity and the effects that excessive consumption of garlic can cause the male reproductive system. The garlic oil comprises volatile compounds in their bulbs. This study aims to evaluate the morphometric of the seminiferous tubules with garlic oil supplemented mice. Methods: We treated 32 BALB/c mice divided into 4 experimental groups: 1,4 mg/kg (therapeutic dose); 14 mg/kg; 28 mg/kg; and control incorporated into feed meal. After the experimental period, the animals were sacrificed and had their testes removed and weighed. Following standard procedures for preparation of histological slides, we measured the thickness of the seminiferous tubules through the distance from the wall to the lumen. Results and Discussion: Through the measurements of the seminiferous tubules, no statistical differences could indicate changes in these structures in animals supplemented with garlic oil compared with the control group were observed. From this study it is concluded that supplemented mice with garlic oil, in different doses, for a period of 35 days, showed no morphometric changes in the seminiferous tubules which could indicate toxicity.
- Key-words:
- Garlic;
- Allium sativum;
- seminiferous tubules;
- histology;
- mice;
- phytotherapics.
Introdução
O Allium sativum, de nome popular “alho”, é um vegetal da família das Liláceas. É uma planta utilizada tanto na culinária como no tratamento e prevenção de doenças com registros datados desde o período medieval (Leonêz, 2008).
Caracteriza-se por um bulbo arredondado, conhecido como cabeça, composto por 10 a 12 bulbilhos (dentes), envolto por uma casca, que pode apresentar coloração branca, rosada ou roxa. Existem diferentes tipos de alho e quase todos diferem em relação a tamanho, cor, forma, sabor, número de dentes por bulbo e acidez. A botânica classifica todos os tipos de alho derivados da espécie Allium sativum. Desta espécie originam-se duas subespécies: a ophioscorodon e a sativum. Destas duas subespécies existem oito variedades de alho: seis do tipo ophioscorodon e dois do tipo sativum. Abaixo dessas oito variedades existem outros 17 grupos de sub-variedades de alho; acredita-se que existem mais de 600 sub-variedades de alho no mundo. Isso ocorre porque as características individuais do alho são modificadas de acordo com as condições de cultivo, do solo, da temperatura, do período de chuvas, da altitude e do tempo de cada lugar (Revista Aditivos e Ingredientes, 2010).
A atividade farmacológica do alho envolve uma variedade de compostos de organoenxofre, destes o mais notável é a alicina, responsável pelo odor característico do alho. Quando o alho é cortado, amassado ou moído, ocorre a lise da membrana celular do bulbo, isto faz com que o composto precursor aliína (sulfóxido de S-alil-L-cisteína) entre em contato com a enzima alinase formando a alicina e outros tiossulfinatos. Esses compostos da decomposição enzimática têm função importante na dieta, apresentando efeitos farmacológicos contra diversas patologias. A atividade terapêutica é demasiadamente extensa, como por exemplo, combater patologias cardiovasculares e endócrinas, além de apresentar caráter antimicrobiano, antifúngico, anti-helmíntico, antiviral e antineoplásico (Katzung, 2010).
Os fitoterápicos são medicamentos obtidos exclusivamente a partir de matérias-primas ativas vegetais (Brasil, 2004). A utilização de plantas para fins terapêuticos é uma das mais antigas formas de prática medicinal da humanidade (Veiga Jr., Pinto e Maciel, 2005). Ao longo dos séculos os produtos de origem vegetal constituíram as bases para tratamento das mais diversas patologias (Hohenberger et al., 2012).
Na terapia contemporânea observa-se crescente redescoberta do valor das plantas medicinais para a cura, prevenção e tratamento de patologias. Entretanto, o uso incorreto desses fitoterápicos pode causar danos à saúde do indivíduo. Desta forma, estudos envolvendo propriedades e toxicidade de plantas com propriedades medicinais têm sido exaustivamente investigadas.
Os herbanários e curandeiros utilizam o alho para combater inúmeras doenças há milhares de anos. Há indícios de seu uso no antigo Egito, na Grécia (onde era conhecido como “rosa fedida”) e na Babilônia há mais de cinco mil anos. Foi Hipócrates o primeiro a descrever com detalhes o uso terapêutico do alho, como diurético e laxante. Plínio e Galeno, médicos romanos, também utilizavam o alho para o tratamento de infecções intestinais, problemas digestivos, hipertensão, senilidade e impotência. Atualmente, médicos naturalistas e outros adeptos da cura pelas ervas receitam o alho para prevenir resfriados, gripes e outras doenças infecciosas (Revista Aditivos e Ingredientes, 2010).
Os compostos ativos do alho mostram-se eficazes quanto à prevenção de doenças cardiovasculares: aumentam os níveis séricos de HDL (colesterol “bom”), reduzem as taxas de triglicerídeos, inibem a agregação plaquetária, além de possuírem propriedades hipoglicemiantes. Estudos em relação ao potencial antimicrobiano do alho mostraram-se eficaz no combate da Helicobacter pylori, bactéria responsável pela maioria dos casos de dispepsia (dificuldade de digestão), câncer gástrico e também de úlceras gástricas e duodenais (Machado et al., 2010). Entretanto, a atividade antifúngica do alho é mais intensa do que a sua atividade antibacteriana (Simões et al., 2010). Alguns dos princípios ativos do alho inibem as nitrosaminas, substâncias tóxicas associadas ao câncer de estômago (Prati, 2012).
Apesar de o alho ser amplamente utilizado tanto na culinária quanto para fins medicinais, o seu consumo excessivo pode provocar efeitos adversos tais como, transtorno gastrointestinal, flatulência e mudanças na flora intestinal. Não há um consenso bem estabelecido quanto à ingestão diária recomendada, entretanto, a ingestão de um a dois dentes de alho cru por dia é considerada segura para adultos (Silva, 2009).
Há milhares de anos os óleos essenciais são extraídos de plantas e usados nas indústrias de perfumes, cosméticos e fármacos. São frações voláteis, naturais, extraídas de plantas aromáticas que evaporam à temperatura ambiente. Os óleos essenciais são geralmente extraídos das plantas nas partes aéreas (folhas e ramos finos), cascas, troncos, raízes, frutos, flores, sementes e resinas (Santos et al., 2004). O óleo de alho (Allium sativum) é composto por óleos voláteis presentes em seus bulbos, cuja composição inclui os compostos como o dialilsulfeto, dialildisulfeto e dialiltrisulfeto (Herbarium, 2013).
Já são de domínio e conhecimento popular os inúmeros benefícios comprovados que o consumo de alho traz à saúde. Entretanto, a literatura carece de informações quanto à toxicidade e os efeitos que o consumo exacerbado de alho pode ocasionar, em especial, ao sistema reprodutor masculino.
Estudos recentes que investigaram os efeitos da utilização do óleo de alho, na gestação de fêmeas de camundongos da linhagem Swiss, demonstraram que a administração diária desta substância, em doses mais elevadas do que aquelas recomendadas terapeuticamente, causou redução da taxa de implantação, viabilidade fetal e diminuição do peso dos fetos, embora não tenham apresentado más formações externas (Macedo, 2012).
A partir destes resultados, que sugeriram a toxicidade do óleo de alho em fêmeas gestantes, surgiu o interesse em investigar a toxicidade no sistema reprodutor de camundongos machos, neste caso, em especial, nos testículos.
Os efeitos colaterais do consumo de alho sobre as funções reprodutivas permanecem pouco investigadas. Neste contexto, estudos recentes evidenciaram que o consumo bruto, durante um mês, de alho cru em doses de 5%, 10%, 15% e 30%, ocasionaram a redução da secreção de testosterona e alterou a espermatogênese de roedores (Hammami et al., 2008). Outros estudos apontaram que a ingestão de doses em 5%, 10% e 15% de alho cru induziu a apoptose em células germinativas testiculares de roedores provocando a inibição da expressão de enzimas das células de Leydig e marcadores das células de Sertoli (Hammami et al., 2009).
Ao investigar os efeitos do extrato aquoso de alho sobre a morfologia testicular em ratos albinos, Obidike e colaboradores (2012) observaram um aumento na reserva de esperma no epidídimo. Estes resultados, de acordo com o autor do trabalho, sugerem que o alho possa ser utilizado para melhorar a fertilidade masculina.
O sistema reprodutor masculino é composto de testículos, da genitália interna (glândulas acessórias e ductos) e da genitália externa. Os testículos são estruturas pares ovoides e possuem uma cápsula externa fibrosa resistente que envolve uma massa de túbulos seminíferos enrolados e agrupados em cerca de 250 a 300 compartimentos. Os túbulos seminíferos constituem aproximadamente 80% da massa testicular de um homem adulto. Cada túbulo individual tem 0,3 a 1 metro de comprimento e é o local de produção dos espermatozoides. No interior dos túbulos seminíferos podem ser visualizados dois tipos de células: as células germinativas em vários estágios de maturação e as células de Sertoli, que regulam o desenvolvimento dos espermatozoides. A espermatogênese, que é o processo de desenvolvimento da espermatogônia até a liberação do espermatozoide, ocorre em cerca de 60 dias em humanos (Silverthorn, 2010). Em camundongos este processo leva cerca de 40 dias para ser finalizado (Nagy et al.,2003).
As células germinativas, conhecidas como espermatogônias, são encontradas agrupadas próximo à extremidade basal das células de Sertoli, logo acima da lâmina basal dos túbulos seminíferos. Elas sofrem divisões mitóticas produzindo células germinativas adicionais, onde algumas permanecem próximo da borda externa do túbulo para produzir as futuras espermatogônias, e outras entram em meiose e tornam-se espermatócitos primários. Cada espermatócito primário sofre meiose e se divide em dois espermatócitos secundários. Destes, cada um se divide em duas espermátides. As espermátides, que contém 23 cromossomos simples, amadurecem formando os espermatozoides que são liberados dentro do lúmen dos túbulos seminíferos. O desenvolvimento dos espermatócitos ocorre em colunas, da borda externa do túbulo em direção ao lúmen. Entre cada coluna existe uma única célula de Sertoli que se estende da borda externa até o lúmen do túbulo. Circundando o lado de fora do túbulo existe uma lâmina basal que atua como barreira, impedindo que algumas moléculas, presentes do líquido intersticial, entrem no túbulo seminífero. Esta lâmina basal permite a entrada da testosterona, produzida pelas células de Leydig, que se encontram na parte externa do túbulo, onde existe um tecido intersticial que consiste principalmente em vasos sanguíneos e estas células (Silverthorn, 2010).
Materiais e Método
Para os testes foram utilizados 32 camundongos BALB/c machos (3 meses de idade) pesando entre 22 a 26g, provenientes do Biotério da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA – UNIVALI), sob o parecer n° 014/12. Os animais foram mantidos sob temperatura controlada a 22 ± 2ºC e com fotoperíodo de 12 horas, com água e ração ad libitum, exceto durante o procedimento experimental. Os animais foram distribuídos em 9 caixas conforme os grupos e as doses administradas. As caixas foram forradas com maravalha, que são lâminas finas de madeira, a fim de manter o ambiente interno livre da umidade provocada pela urina e fezes que certamente de maneira contrária desfavoreceriam o bem estar dos animais. Além disto, houve o fornecimento de papel toalha para enriquecimento ambiental e para construção de ninhos, prática esta adotada em todos os protocolos experimentais do Laboratório de Reprodução Assistida, local onde o protocolo experimental foi desenvolvido.
Os estudos in vivo foram realizados de acordo com as normas e cuidados com o bem estar e biossegurança na experimentação, conforme descritas na Lei nº 11.794, de 08 de outubro de 2008, e de acordo com as diretrizes da Sociedade brasileira de Ciência em Animais de Laboratório (SBCAL).
Para o tratamento foi utilizado óleo de alho (Allium sativum) adquirido em farmácias de manipulação. As doses administradas foram calculadas por extrapolação alométrica, que significa estabelecer através de cálculo matemático as doses de fármacos entre animais de grupos taxonômicos diferentes, possibilitando o uso das referências farmacológicas de um animal modelo para um animal alvo. Essa metodologia utiliza a taxa metabólica basal, possibilitando calcular doses em miligramas por quilocaloria consumida pelo animal (mg/kcal) (Pachaly, 2006).
De acordo com as diretrizes estabelecidas pela Organisation for Economic Co-operationand Development - OECD (1996) para teste de produtos químicos, as doses administradas seguiram uma sequência descendente dividida em três grupos de teste e um grupo controle. Os animais foram tratados com diferentes doses de óleo de alho, baseando-se na dose terapêutica para seres humanos que é de 500 mg/dia que equivale a 7,350 mg/kg/dia de alho cru, considerando um adulto de 70kg.
Os animais foram tratados durante um período experimental de 35 dias, período que compreende um ciclo da espermatogênese em camundongos (Nagy et al., 2003). Os grupos tratados receberam o óleo de alho incorporado ao farelo de ração umedecido com água no período matutino, após um período de jejum de 12h. Este protocolo de jejum foi estabelecido para que se tivesse a garantia de que os animais comeriam todo farelo e desta forma o tratamento acontecer de acordo com o padrão pré-estabelecido. Após todo o consumo da ração com o tratamento a ração convencional retornava as caixas e assim permanecia durante o restante do dia e, novamente, retirada durante o período noturno. Os grupos testes foram organizados da seguinte maneira:
- Grupo 1 – Controle (8 camundongos): receberam somente água filtrada em volume igual ao tratamento incorporada ao farelo de ração durante 35 dias.
- Grupo 2 – Dose Terapêutica (8 camundongos): receberam a dose terapêutica correspondente a posologia utilizada para seres humanos (1,4 mg/kg) incorporada ao farelo de ração, durante 35 dias.
- Grupo 3 – Dose 10x (8 camundongos): receberam 10x a dose terapêutica (14 mg/kg) incorporada ao farelo de ração, durante 35 dias.
- Grupo 4 – Dose 20x (8 camundongos): receberam 20x a dose terapêutica (28 mg/kg) incorporada ao farelo de ração, durante 35 dias.
Após o término do período experimental os camundongos foram sacrificados em câmara de O2/CO2. Os testículos foram coletados e tiveram seus pesos registrados. Após a pesagem deu-se início aos processamentos para análise histológica, adaptados de Banzato (2010). Os testículos esquerdos foram imersos em formol 10% por 10 horas para fixação. Em seguida, foram removidos do fixador e cortados transversalmente em três pedaços. As extremidades dos testículos foram desprezadas e somente a porção mediana foi considerada para a análise histológica. Após 72 horas no formol, a solução foi substituída por álcool 70º, para sofrer o processo de desidratação. Após 24 horas em álcool 70º, as peças receberam quatro banhos nas concentrações alcoólicas de 90º - 90º - 100º - 100º no período de 24 horas. Depois de 24 horas em álcool 100º, em cada peça foram aplicados três banhos de xilol, com duração de 30 minutos cada banho. Após os banhos em xilol, as peças receberam três banhos de parafina, com duração de 1 hora cada banho.
Concluído os banhos, as peças foram incluídas transversalmente em parafina. Com a utilização do micrótomo, os blocos de parafina com as peças incluídas foram submetidos a cortes histológicos de 7μm (micrômetros) de espessura. A partir daí, foram realizados os procedimentos do protocolo padrão de coloração H&E (hematoxilina e eosina) para posterior análise em microscópio óptico de luz.
Para a análise foi confeccionada uma lâmina para cada testículo, obtido dos animais de cada grupo. Cada lâmina correspondente ao testículo de um único animal contendo 5 secções histológicas. O intervalo entre cada secção histológica foi de 10 μm (micrômetros). Em cada secção histológica foram analisados 2 túbulos seminíferos. Os túbulos seminíferos selecionados para análise foram os que se encontravam no parênquima cortical do testículo por conta da sua uniformidade. Em cada estrutura foi realizada a medição da distância da parede externa até o lúmen do túbulo seminífero utilizando-se a lente objetiva que fornece um aumento ampliado 400X. As medições foram realizadas em microscópio óptico de luz com a utilização de ocular micrométrica OSM 221817.
Os parâmetros registrados foram submetidos a testes estatísticos por análise de variância (ANOVA). Todas as análises foram avaliadas com confiança de 95% (α =0,05).
Resultados e Discussão
O alho é uma planta que vem sendo cultivada e consumida pelos seres humanos há muitas décadas. Além do seu uso na culinária para realçar e recriar o sabor dos alimentos o alho é igualmente popular por conta dos benefícios que o seu consumo pode trazer para a saúde reduzindo o mau colesterol e a pressão arterial. O alho também tem sido utilizado no combate a infecções, como vermífugo e também no combate a fungos do gênero Aspergillius encontrado em amendoins que quando consumido por humanos podem causar câncer hepático (Viegas et al., 2005).
Por possuir antioxidantes e flavonoides, compostos extraídos a partir do alho, tem sido utilizado, também, pela indústria de cosméticos no combate ao envelhecimento. Acredita-se que a maioria dessas propriedades atribuídas ao alho se deve à riqueza de substâncias sulfurosas presentes na sua composição. Entretanto, o consumo excessivo desta planta pode trazer efeitos indesejáveis ao trato gastrointestinal, e isto também já é conhecido. Não há um consenso estabelecido quanto à dose diária recomendada (Silva, 2009).
Estudos sobre toxicologia clínica de fitoterápicos são importantes para a determinação de efeitos adversos e/ou tóxicos, já que existe uma grande quantidade de fitoterápicos disponíveis para consumo no mercado e para a maioria deles não há dados suficientes que comprovem cientificamente a veracidade dos seus efeitos (Turolla e Nascimento, 2006).
Quanto à toxicidade e os efeitos que o consumo exacerbado de alho pode ocasionar, há escassez na literatura, em especial, referentes ao sistema reprodutor masculino. A toxicidade reprodutiva está relacionada com qualquer interferência na capacidade reprodutiva, tanto em machos quanto em fêmeas, provocada por um agente causador da toxicidade. A avaliação toxicológica é utilizada para analisar resultados experimentais de um composto com o objetivo de classificá-lo e ao mesmo tempo obter informações a respeito da forma correta quanto à sua utilização.
Os ensaios pré-clínicos de toxicidade reprodutiva avaliam o potencial de uma determinada substância em interferir sobre o sistema reprodutor e causar efeitos indesejáveis capazes de comprometer a fertilidade, o acasalamento, o desenvolvimento embriofetal, o parto e o desenvolvimento pós-natal dos descendentes até à maturidade sexual (Santos, 2012).
Para se avaliar o efeito tóxico causado por uma substância pode ser analisado alterações do peso corporal e de órgãos como fígado, baço, rins e gônadas (Reboredo et al., 2006).
Estudos realizados por Souza, Silva e Amaral (2013) onde foi utilizado a suplementação com óleo de alho, em camundongos, não foram observadas mudanças físicas e/ou comportamentais, que pudessem caracterizar sinais de toxicidade sistêmica nos grupos estudados. O peso dos rins e do fígado não foi diferente do encontrado no grupo controle. Alterações no peso e morfologia do fígado são bons indicadores de toxicidade, por ser este o órgão que detém grande concentração de enzimas responsáveis pela detoxificação dos agentes tóxicos através dos hepatócitos (OGA, 2003).
No presente estudo os animais do grupo controle e os animais tratados com Allium sativum também não apresentaram alterações significativas no peso corporal. Um estudo similar realizado por Santiago e colaboradores (2009) para avaliar alterações cardiovasculares em ratos tratados com alho (125 mg/Kg por via oral) não apresentou diferença nos valores do peso corporal.
Os agentes nocivos podem exercer seus efeitos ao nível pré-testicular, testicular e pós-testicular. O nível pré-testicular envolve alterações no eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal, com impedimento da dinâmica hormonal necessária à ocorrência da espermatogênese. Efeitos citotóxicos e genotóxicos nas células da linhagem germinativa caracterizam os efeitos testiculares (Oshio e Guerra, 2009).
A histopatologia testicular é um dos parâmetros mais sensíveis para avaliar as possíveis alterações na fertilidade masculina. Aspectos degenerativos testiculares podem ser identificados em secções coradas por hematoxilina e eosina. A exemplo disso, a hipocelularidade e a morte celular no epitélio seminífero, a formação de células multinucleadas (células gigantes compostas de espermatócitos e espermátides) e a presença de espermátides arredondadas e restos celulares no epidídimo (Oshio e Guerra, 2009).
Realizadas as medições dos túbulos seminíferos (parede externa até o lúmen) através da microscopia óptica, não foram observadas diferenças estatísticas que pudessem indicar alterações morfológicas nestas estruturas em animais suplementados com óleo de alho com relação aos animais do grupo controle.
Tanto os animais do grupo controle quanto os animais dos grupos que foram suplementados com doses específicas de óleo de alho, mostraram suas características morfológicas inalteradas, não apresentando sinais de toxicidade durante o período de 35 dias de tratamento. Os valores das medições dos túbulos seminíferos e peso dos testículos encontram-se nas TABELAS 1 e 2.
Dose | Controle (Água) | Terapêutica (1,4 mg/kg) | 10x (14 mg/kg) | 20x (28 mg/kg) |
---|---|---|---|---|
Nº de túbulos seminíferos analisados por grupo | 80 | 80 | 80 | 80 |
Média e Desvio Padrão | 243 ± 27 | 270 ± 25 | 265 ± 27 | 272 ± 15 |
Máximo | 308 | 321 | 324 | 307 |
Mínimo | 200 | 211 | 220 | 232 |
Testículo | Direito | Esquerdo* |
Total de testículos pesados | 32 | 32 |
Média e Desvio Padrão | 0,087 ± 0,007 | 0,088 ± 0,008 |
Máximo | 0,101 | 0,112 |
Mínimo | 0,072 | 0,073 |
*Testículo utilizado na pesquisa |
Estudos com o óleo de alho realizados por Souza, Silva e Amaral (2013), comprovaram que o peso dos testículos e índice gonadossomático permaneceram inalterados assim como os parâmetros espermáticos, corroborando com os resultados encontrados neste trabalho.
Obidike e colaboradores (2012), que analisaram a morfologia testicular em ratos albinos, sugeriram que o extrato aquoso de alho resultou em uma melhora significativa, ao observar um aumento na reserva de esperma no epidídimo.
Estudos existentes a respeito do Allium sativum em diferentes doses de alho cru apresentaram toxicidade significativa nas funções reprodutivas de camundongos machos (Hammami et al., 2008, 2009). A eficácia quanto à terapêutica do alho na prevenção das mais diversas patologias vem sendo divulgadas e pesquisadas ano após ano. A cada dia surgem novos trabalhos apresentando novas metodologias de pesquisas com padrões e protocolos experimentais aprimorados. Novos estudos poderão confirmar ou questionar os dados já existentes e assim determinar qual a melhor forma de preparo e dosagens necessárias de alho para a obtenção de seus efeitos, ou mesmo se apresentará efeitos tóxicos.
A partir deste estudo, foi possível concluir que em camundongos suplementados com óleo de alho em diferentes doses em um período de 35 dias, não apresentaram toxicidade significativa na histologia dos túbulos seminíferos.Referências
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