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Farmacologia

Farmacovigilância de plantas medicinais e fitoterápicos no Brasil: uma breve revisão1

Pharmacovigilance in medical plants and phytotherapics in Brazil: a brief review

DOI:
http://dx.doi.org/10.5935/2446-4775.20150020
Autores:
2Leonardo Ramos Leal;
3Carla Junqueira Moragas Tellis.
Instituições
1Monografia apresentada junto ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu de Especialização em Gestão da Inovação em Fitomedicamentos, do Instituto de Tecnologia de Fármacos, Farmanguinhos/FIOCRUZ.
2Aluno do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu de Especialização em Gestão da Inovação em Fitomedicamentos, do Instituto de Tecnologia de Fármacos, Farmanguinhos/FIOCRUZ.
3Departamento de Produtos Naturais, Farmanguinhos/FIOCRUZ.
Correspondência:
carlatellis@far.fiocruz.br

Resumo

Atualmente, o consumo de medicamentos à base de plantas vem aumentando em todo o mundo. Este uso descontrolado pode representar um risco grave para a saúde da população porque as plantas medicinais e fitoterápicos representam misturas complexas de substâncias que podem muitas vezes interagir com outras e ter um efeito adverso. Este trabalho pretende enfatizar a importância da farmacovigilância de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos no Brasil, a fim de diminuir a ameaça que os efeitos adversos e interações medicamentosas têm sobre a população e contribuir para a tomada de decisão racional e correta por profissionais de saúde que trabalham nesta área. Farmacovigilância de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos no Brasil ainda estão em sua infância. Este fato pode ser explicado pela deficiência na formação dos profissionais de saúde, a crença em plantas naturais inócuos medicinais e fitoterápicos e automedicação.

Palavras-chave:
farmacovigilância;
plantas medicinais;
fitoterápicos;

Abstract

Nowadays consumption of herbal medicines has been increasing worldwide.This uncontrolled use can present a serious risk to the health of the population because medicinal plants and herbal medicines represent complex mixtures of substances that can often interact with others and have an adverse effect. This work intends to emphasize the importance of the pharmacovigilance of medicinal plants and herbal medicines in Brazil, in order to decrease the threat that the adverse effects and drug interactions have on the population and to contribute to the rational and correct decision making by health professionals working in this area. Pharmacovigilance of medicinal plants and herbal medicines in Brazil is still in its infancy. This fact can be explained by deficiency in the training of health professionals, the belief in innocuous natural medicinal plants and herbal medicines and self-medication.

Key-words:
pharmacovigilance;
medicinal plants;
herbal medicines;

Introdução

A prática da utilização das plantas medicinais é milenar e passada de geração em geração de acordo com a cultura de cada local. Esta tradicionalidade de uso, por muitas vezes, subentende que as drogas de origem vegetal não representam riscos de toxicidade (Lorenzi e Matos, 2002). Tal realidade tornou-se um fator de grande preocupação para estudiosos e pesquisadores, pois proporcionalmente ao seu uso, o número de casos de reações adversas a plantas medicinais e seus derivados tem aumentado não apenas no Brasil, como em todo o mundo (Gallo et al. 2000). Este aumento pode ser explicado pelo aumento na propaganda e divulgação nos meios de comunicação, pela fraca atuação dos organismos estatais de vigilância sanitária e amplo comércio em locais públicos e no caso específico do Brasil, pela crise econômica que dificulta o acesso da população a assistência médica e farmacêutica e o alto custo dos medicamentos industrializados (Simões et al. 1998).

Farmacovigilância, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é definida como a ciência que se refere à detecção, avaliação, compreensão e prevenção dos efeitos adversos ou quaisquer problemas relacionados a medicamentos (WHO, 2003). Ela visa detectar precocemente eventos adversos conhecidos ou não, monitorando também possíveis aumentos na incidência dos mesmos. Um sistema de farmacovigilância deve ter a capacidade de avaliar os benefícios e riscos do produto, para assegurar que esse mantenha a qualidade, segurança e eficácia compatíveis com seu uso racional (ANVISA, 2009).

Em 2003, a OMS ampliou o conceito de farmacovigilância através da publicação de diretrizes de monitorização e farmacovigilância de plantas medicinais. Este documento propôs a inclusão de plantas medicinais, medicina tradicional e complementar ao Sistema Internacional de Farmacovigilância. Além da identificação e prevenção de eventos adversos às plantas medicinais e quantificação de seus riscos, tais diretrizes objetivam a capacitação dos países membros para o fortalecimento da farmacovigilância; inclusão das plantas no Sistema Internacional de Farmacovigilância; padronização dos termos; promoção e fortalecimento de trocas de informações seguras e coordenadas internacionalmente entre os centros e promoção da segurança no uso de plantas medicinais (WHO, 2003).

Obedecendo as diretrizes traçadas pela OMS, o Ministério da Saúde (MS) vem promovendo uma série de mudanças em suas políticas objetivando ampliar o acesso seguro às plantas medicinais e fitoterápicos para a população. Em 2006, com este propósito, publicou a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) e a Política Nacional de Plan­tas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF), ambas com a finalidade maior de promover o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos no Brasil. A PNPMF apresenta diretrizes que regulamentam desde o cultivo das plantas medicinais até a produção e comer­cialização dos fitoterápicos por indústrias farmacêuticas nacionais (Brasil, 2006).

Em 2009, com a criação do Sistema Nacional de Notificações para a Vigilância Sanitária (NOTIVISA), o Centro Nacional de Monitorização de Medicamentos (CNMM), que existia desde 2001 passou a coletar e armazenar informações de farmacovigilância de diversos produtos sob vigilância sanitária, incluindo medicamentos fitoterápicos. O sistema NOTIVISA, tem a finalidade de receber notificações de eventos adversos (EA) e queixas técnicas (QT) de diversos produtos e permite também que cidadãos notifiquem qualquer caso de EA e QT, possibilitando um maior fornecimento de dados relacionados à segurança.

Os métodos empregados em farmacovigilância de plantas medicinais e fitoterápicos - notificação espontânea de RAM (Reação Adversa a Medicamento), monitorização de pacientes e estudos analíticos - são semelhantes ao que se utiliza na farmacovigilância de medicamentos convencionais, onde se verifica as relações de casualidade e gravidade segundo método estabelecido pela OMS (WHO, 2003).

O presente trabalho tem o objetivo de enfatizar a importância de se intensificar os estudos em farmacovigilância de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos no Brasil com vistas à diminuição da ameaça que os efeitos adversos e as interações medicamentosas exercem sobre a população e ainda contribuir para o uso racional e a correta tomada de decisão por parte dos profissionais de saúde que atuam nesta área. 

Materiais e Métodos

Este trabalho caracteriza-se por ser uma revisão bibliográfica dos principais estudos da literatura sobre o assunto. Foram compilados dados informativos de livros, artigos e dissertações disponíveis nas bases de dados BIREME e SciELO nos últimos 10 anos.

Resultados e Discussão

A farmacovigilância de plantas medicinais e fitoterápicos no Brasil encontra-se ainda muito incipiente. Esta afirmativa pode ser corroborada por pesquisas recentes que mostram uma grande diferença no número de notificação das mesmas quando comparadas às dos medicamentos convencionais.

Skalli e Soulaymani Bencheikh (2012) informam que o VigiSearch (Sistema internacional de recebimento de notificações sobre as reações adversas a medicamentos) não conta com nenhuma notificação brasileira.

Lima (2013) usou dados do NOTIVISA para mostrar que entre os anos de 2009 e 2012 foram realizadas 50.824 notificações de EA e QT ligadas à categoria de medicamentos. Deste total, o percentual referente a notificações de plantas medicinais foi de apenas 0,79%. Este número evidencia a grande negligência existente por parte da sociedade usuária e dos profissionais de saúde com o uso e a notificação de EA para esta categoria de produtos.  Ainda segundo Lima (2013), as principais reações adversas citadas pelos usuários de plantas medicinais foram diarréia, hepatotoxicidade, alterações gastrointestinais, inibição da agregação plaquetária, dificuldade visual e excitabilidade neuronal.

O trabalho de Lima (2013) foi ainda importante para identificar que a região nordeste foi a que mais apresentou notificações (31%), fato que pode ser explicado pela cultura local da fitoterapia e falta de acesso aos medicamentos convencionais (Silveira, Bandeira e Arrais, 2008). Tanto Lima (2003) quanto Balbino e Dias (2010) apontam para a importância dos profissionais de saúde, especialmente os farmacêuticos nas notificações de EA e QT.

Puppo e Silva (2008) avaliaram o uso concomitante de medicamentos fitoterápicos e medicamentos convencionais na Farmácia Escola da Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Eles constataram que dos 56 pacientes idosos que faziam o uso de ácido acetilsalicílico, 18 utilizavam concomitantemente o fitoterápico Ginkgo biloba. Tal associação aumenta os riscos da ocorrência de hemorragias. Esta situação ilustra a necessidade de uma maior atuação dos profissionais de saúde a fim de evitar possíveis interações medicamentosas, especialmente para a terceira idade, quando é comum a ocorrência de polifarmácia.

Conclusões

Embora tenha conseguido estabelecer um sistema de farmacovigilância condizente com o preconizado pela OMS, o Brasil apresenta uma grande dificuldade na obtenção e divulgação dos dados referentes a interações entre medicamentos e plantas medicinais ou fitoterápicos, o que gera preocupações quanto aos riscos destas associações. Tal dificuldade justifica-se por fatores como a falta de preparo dos profissionais de saúde, crença na natureza inócua das plantas medicinais e fitoterápicos e a automedicação.

Referências