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Etnobotânica

Psittacanthus plagiophyllus Eichl. (Loranthaceae): Perfil fitoquímico, efeito gastroprotetor e toxicidade aguda

Psittacanthus plagiophyllus Eichl. (Loranthaceae): Phytochemical profile, gastroprotective effect and acute toxicity

Autores:
1BEZERRA, Adrielle Nara S.*;
1OLIVEIRA, Ricardo B. de;
1MOURÃO, Rosa Helena V.
Instituições
1Laboratório de Bioprospecção e Biologia Experimental - Universidade Federal do Oeste do Pará - UFOPA. Rua Vera Paz, s/n, bairro Salé. CEP 68035-110, Santarém - Pará.
adriellensb@gmail.com

Resumo

Psittacanthus plagiophyllus (Loranthaceae) é uma das "espécies" utilizadas no distrito de Alter do Chão, Santarém - PA, para o tratamento de gastrite. Levando em consideração o uso popular desta espécie, aliado à ausência de estudos farmacológicos e a sua grande disponibilidade nas savanas de Alter do Chão, o objetivo deste trabalho foi investigar o possível efeito gastroprotetor dos extratos aquoso e hidroalcoólico das folhas de P. plagiophyllus contra lesões gástricas induzidas por etanol em ratos, além de sua toxicidade aguda em ratos e de seu perfil fitoquímico por Cromatografia em Camada Delgada. No perfil cromatográfico dos extratos foi identificada a presença de flavonoides, taninos hidrolisáveis e cumarinas. O extrato aquoso de P. plagiophyllus nas doses de 500 e 1000 mg/Kg e o hidroalcoólico na dose de 500 mg/Kg inibiram significativamente a formação de lesões gástricas induzidas por etanol em ratos, quando comparados ao grupo controle, pelo teste de Dunnett (p<0,05). No ensaio de toxicidade aguda não foram observados sinais tóxicos de caráter geral e nem morte dos animais até a dose de 5000 mg/Kg dos extratos, o que indica baixa ou nenhuma toxicidade. Os compostos fenólicos detectados em P. plagiophyllus podem estar relacionados ao efeito gastroprotetor evidenciado.

Palavras-chave:
Erva-de-passarinho.
Fitoquímica.
Toxicidade.
Gastroproteção.

Abstract

Psittacanthus plagiophyllus (Loranthaceae) is one of the many species used in the district of Alter do Chão, Santarém - PA for the treatment of gastritis. Considering the popular use of this species, combined with the absence of pharmacological studies and its wide availability in the savanna of Alter do Chão, the aim of this study was to investigate the possible gastroprotective effect of hydroalcoholic and aqueous extracts of P. plagiophyllus leaves against ethanol-induced gastric lesions in rats, in addition to its acute toxicity in rats and phytochemical profile by Thin Layer Chromatography. The chromatographic profile of the extracts showed the presence of flavonoids, hydrolysable tannins and coumarins. The aqueous extract of P. plagiophyllus at doses of 500 and 1000 mg/Kg and hydroalcoholic at a dose of 500 mg/Kg significantly inhibited the formation of ethanol-induced gastric lesions in rats compared to the control group by the Dunnett's test (p <0.05). In the acute toxicity test were not observed signs of general toxic and no death of the animal to 5000 mg/Kg of the extracts, indicating low or no toxicity. Phenolic compounds found in P. plagiophyllus may be related to evidenced gastroprotective effect.

Key-words:
Mistletoe.
Phytochemical.
Toxicity.
Gastroprotection.

Introdução

A utilização de plantas como recurso para a cura e a prevenção de doenças é uma prática que acompanha a história da humanidade (FÜRST e ZÜNDORF, 2014). O Brasil é um dos países mais biodiversos do mundo e, no que concerne a plantas medicinais, já tem mais de 100 mil espécies catalogadas. No entanto, a maior parte destas plantas nunca teve sua ação terapêutica estudada cientificamente (CARVALHO, 2011; CARVALHO, SANTOS e SILVEIRA, 2014).

Dentre as espécies vegetais nativas do Brasil com potencial terapêutico ainda não estudado, encontra-se a Psittacanthus plagiophyllus Eichl. (FIGURA 1), que pertence à família botânica Loranthaceae, cujas plantas são conhecidas popularmente no Brasil como ervas-de-passarinho.Esta espécie ainda não dispõe de estudos na literatura que evidenciem experimentalmente as suas ações terapêuticas. No entanto, é utilizada popularmente na vila de Alter do Chão, Santarém, Pará, Brasil, para combater desordens inflamatórias em geral e problemas estomacais, como gastrite e úlceras.

A doença ulcerosa péptica é conceituada como a perda da integridade do revestimento do estômago (úlcera gástrica) ou do duodeno (úlcera duodenal) (NATALE et al., 2004). A camada mucosa do estômago e do duodeno é constantemente exposta à ação do ácido clorídrico e da pepsina. Em condições fisiológicas, esta mucosa possui mecanismos que a protegem da autodigestão causada por estes agentes, além de preservá-la contra fatores agressivos exógenos, como o estresse e a ingestão de fármacos anti-inflamatórios não estereoidais (AINE), cafeína e etanol. Porém, quando os componentes protetores são insuficientes para limitar a injúria à mucosa gástrica, uma úlcera se desenvolve, como resultado da necrose tecidual desencadeada por isquemia, formação de radicais livres e diminuição da oferta de oxigênio e nutrientes (TARNAWSKI e AHLUWALIA, 2012).

A cada ano a úlcera péptica afeta quatro milhões de pessoas ao redor do mundo. Quando não há tratamento efetivo, complicações podem ocorrer e incluem hemorragia digestiva alta, hematêmese, perda de sangue oculto nas fezes, perfuração e obstrução piloro-duodenal. Tais complicações ocorrem em 10 a 20% dos casos, com perfuração do estômago em 2 a 14% dos pacientes, sendo que o risco de morte pode chegar a 40%. Deste modo, as úlceras pépticas representam um problema social e clínico de importância econômica global (BERTLEFF e LANGE, 2010; LAU et al., 2011).

Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito gastroprotetor dos extratos aquoso e hidroalcoólico de P. plagiophyllus contra lesões agudas induzidas por etanol em ratos, além de analisar o seu perfil fitoquímico e a sua toxicidade aguda oral.

FIGURA 1. Psittacanthus plagiophyllus Eichl. na savana de Alter do Chão, Santarém, Pará, Brasil. a) planta jovem; b) P. plagiophyllus florida; c) inflorescência; d) infrutescência. Fotos: Adrielle Bezerra. a - c:  maio de 2014; d: setembro de 2014. Em todas as imagens a escala indicada corresponde a 5 cm.
FIGURA 1. Psittacanthus plagiophyllus Eichl. na savana de Alter do Chão, Santarém, Pará, Brasil. a) planta jovem; b) P. plagiophyllus florida; c) inflorescência; d) infrutescência. Fotos: Adrielle Bezerra. a - c:  maio de 2014; d: setembro de 2014. Em todas as imagens a escala indicada corresponde a 5 cm.

Materiais e Métodos

Coleta e identificação do material botânico

A coleta dos espécimes de P. plagiophyllus foi realizada no mês de setembro de 2011, período seco da região, entre 08h e 09h, em uma área de savana localizada na vila de Alter do Chão (2°31' S, 59°00' W), Santarém, Pará, Brasil, onde ocorrem parasitando exclusivamente os cajueiros (Anacardium occidentale). A confirmação da espécie foi feita pelo Dr. Claudenir Simões Caires, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) e as exsicatas estão depositadas no Herbário HSTM, do Laboratório de Botânica da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), com o número de registro HSTM 000074 (ANEXO 1), sob responsabilidade da curadora Profª Drª Thaís Elias Almeida.

Obtenção dos extratos

Os extratos foram preparados tendo como base o uso popular, ou seja, aquoso (decocção) e hidroalcoólico (tintura), a partir do pó das folhas desidratadas em estufa com circulação forçada de ar a 40 ºC. Para a preparação do extrato aquoso das folhas de P. plagiophyllus (EAPP), 100 g do material foram diluídos em 500 mL de água destilada e mantidos em uma placa aquecedora a 70 ± 5 °C por 2 horas e 30 minutos, sob agitação constante (1.250 rpm). Em seguida, a mistura foi filtrada e liofilizada. Já o extrato hidroalcoólico das folhas de P. plagiophyllus (EHPP) foi preparado diluindo-se 100 g do pó em 700 mL de etanol 70%. A mistura foi mantida sob agitação ocasional por um período de 48 horas, após o qual foi filtrada e o solvente evaporado em capela. O rendimento foi de 34,6% e 18% para o EAPP e o EHPP, respectivamente.

Análise fitoquímica

A análise fitoquímica dos extratos aquoso e hidroalcoólico das folhas de P. plagiophyllus foram realizadas por meio da técnica de Cromatografia em Camada Delgada (CCD), conforme descrito por Marini-Bettòlo e colaboradores (1981), com modificações. A fase estacionária utilizada foi à sílica gel G60 F254 (adsorvente), depositada em uma placa cromatográfica pré-fabricada de alumínio (Macherey-Nagel, Germany). Como fase móvel, foram utilizados diferentes sistemas de eluição, adequados a cada grupo de metabólitos secundários pesquisados. Alíquotas dos extratos de P. plagiophyllus diluídos em metanol (10 mg/mL) foram aplicadas nas cromatoplacas, para a pesquisa de terpenoides, flavonoides, cumarinas, alcaloides, taninos condensados e taninos hidrolisáveis. Para cada sistema de eluição foram utilizados reveladores específicos e amostras de referência para identificação qualitativa dos metabólitos, sob luz ultravioleta (λ= 264 ou 365 nm) e no visível (400-700 nm), conforme detalhado no QUADRO 1. Todos os reagentes utilizados nos sistemas de eluição, assim como os reveladores e os padrões, foram obtidos da Sigma-Aldrich®.

QUADRO 1. Protocolo para análise fitoquímica qualitativa do EAPP e do EHPP por Cromatografia em Camada Delgada (MARINI-BETTÒLO et al., 1981).
ELUENTE (fase móvel) REVELAÇÃO PADRÃO UTILIZADO RESULTADOS ESPERADOS
Apolar
hexano:acetato de etila:ácido fórmico
(85:10:5)
VAS 1%
Visível
Timol Terpenoides (rosa intenso)
Ácidos graxos (azul)
Polar ácido
acetato de etila: ácido fórmico: ácido acético:H2O (67,5:7,5:7,5:17,5)
VAS 1%
Visível
Rutina hidratada Ácidos graxos (azul)
Terpenoides (rosa intenso)
Cumarinas glicosiladas (azul, verde)
Flavonoides (amarelo)
AlCl3
UV 365 nm
Rutina hidratada Flavonoides totais (laranja)
Cumarinas glicosiladas (azul, verde)
KOH 5%
UV 365 nm
Esculina Cumarinas glicosiladas (azul, verde)
Polar básico
acetato de etila: isopropanol: dietilamina
(45:35:20)
Dragendorf Brucina Alcaloides (laranja amarronzado - 254 nm)
Média polaridade
tolueno: éter etílico
(50:50)
KOH 5%
UV 365 nm
1,2 - benzopirona Cumarinas simples (verde-amarelo)
Polar
butanol: ácido acético:H2O (40:10:50)
FeCl3 1%
Visível
Ácido gálico Taninos hidrolisáveis (azul)
Taninos condensados (verde)
VAS 1%
Visível
(+)-catequina hidratada Taninos condensados (vermelho)
Flavonoides (amarelo claro)
Legenda: EAPP= Extrato Aquoso de Psittacanthus plagiophyllus; EHPP=Extrato Hidroalcoólico de Psittacanthus plagiophyllus; VAS= Vanilina sulfúrica; AlCl3= Cloreto de alumínio; KOH= Hidróxido de potássio; FeCl3= Cloreto férrico; UV= Ultravioleta.

Animais

Para a realização dos experimentos in vivo foram utilizados ratos (Rattus norvegicus) da variedade Wistar, machos e fêmeas, com 2 a 3 meses de idade e peso entre 150 e 200 g. Os animais foram provenientes da Unidade de Biologia Experimental in vivo do Laboratório de Bioprospecção e Biologia Experimental (LabBBEx) da UFOPA, na qual foram mantidos em ambiente climatizado (22 ± 1 °C), com ciclo claro/escuro regulado de 12/12 horas, água e alimentação a vontade. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Universidade do Estado do Pará (UEPA), em Belém - PA, sob o protocolo nº 13/12, de 26/04/2012 (ANEXO 2).

Avaliação da atividade gastroprotetora

Este teste foi realizado por meio do modelo de úlceras agudas induzidas por etanol, conforme metodologia descrita por Robert e colaboradores (1979). Foram utilizadas no experimento somente ratas Wistar fêmeas, divididas em 8 grupos (n=6) que, após jejum de sólidos por 24 horas e de água por 1 h, receberam por via oral os seguintes tratamentos:

Passados 60 minutos da administração dos tratamentos, todos os animais receberam por via oral o agente ulcerogênico, etanol 75% na dose de 2,5 mL/kg de peso corpóreo. Ao final de 1 hora após a administração do agente lesivo, todos os animais foram sacrificados por deslocamento cervical, os estômagos retirados, abertos pela curvatura maior, lavados com solução salina (NaCl 0,9%), prensados em placas de vidro e escaneados. A área das ulcerações foi medida por meio do software ImageJ® e os valores expressos através da área relativa de lesão (%), que refere-se à porcentagem de área ulcerativa em relação à área glandular total do estômago.

Avaliação da toxicidade aguda oral

Para a avaliação da toxicidade aguda oral foi seguida a metodologia descrita por Hor e colaboradores (2011). Os animais foram divididos em 5 grupos (n= 6♂ e 6♀) que, após jejum de sólidos por 12 horas, receberam por via oral os seguintes tratamentos:

Após a administração, durante as primeiras 24 horas (nos períodos de 0, 15, 30 e 60 minutos e a cada 4 horas) e diariamente durante 14 dias, foram observados sinais tóxicos de caráter geral. Foram avaliados os seguintes parâmetros: agitação, irritabilidade, depressão, resposta ao toque, aperto de cauda, contorções abdominais, força de agarrar, tremores, convulsões, hipnose, alteração na locomoção, na frequência respiratória, piloereção, sialorreia, ptose palpebral, alteração no tônus muscular, diarreia, constipação, alteração nos pelos, pele e mucosas e também o número de mortos, com possível causa da morte e respectivos exames histopatológicos.

A partir da 24ª hora até 14 dias após a administração dos tratamentos, foram monitorados diariamente a variação de peso dos animais e o consumo de alimentos. Ao fim do período de observação, foi contabilizado o número de mortos para cálculo da DL50 (Dose Letal capaz de matar 50% dos indivíduos) e todos os animais sobreviventes foram sacrificados por deslocamento cervical e autopsiados para a observação das características macroscópicas dos órgãos internos. Foram pesados os pulmões, coração, rins, baço e fígado e seu peso relativo calculado, dividindo-se o peso de cada órgão (em gramas) pelo peso corporal de cada animal no dia da coleta e multiplicando-se por 100. O resultado foi expresso em gramas/100 g de peso corpóreo (g/100 g p.c).

Análise estatística

Os resultados quantitativos foram expressos como médias ± erro padrão das médias. As análises estatísticas foram realizadas por meio de análise de variância (ANOVA), seguida do teste de Dunnett ao nível de 5% de probabilidade, para comparação entre os grupos teste e os controles, utilizando o software ASSISTAT® 7.6. Valores de p<0,05 foram considerados significativos.

Resultados e Discussão

Perfil fitoquímico         

Na análise fitoquímica dos extratos das folhas de P. plagiophyllus por CCD foi observada a presença de flavonoides, cumarinas e taninos hidrolisáveis (TABELA 1), classes de compostos fenólicos que apresentam grande importância farmacológica (FUNAKOSHI-TAGO et al., 2015; LIU et al., 2015; YANG, LEE  e SHIN, 2015).

TABELA 1. Perfil fitoquímico dos extratos aquoso (EAPP) e hidroalcoólico (EHPP) das folhas de P. plagiophyllus por Cromatografia em Camada Delgada.
Classe de metabólitos investigada Resultados
EAPP EHPP
Terpenoides - -
Flavonoides + +
Cumarinas + +
Alcaloides - -
Taninos hidrolisáveis + +
Taninos condensados - -
+ indica a presença e - indica a ausência das classes de metabólitos secundários nos extratos.

Atividade gastroprotetora

Os extratos aquoso e hidroalcoólico das folhas de P. plagiophyllus foram eficazes em proteger a mucosa gástrica de ratas das lesões causadas pela administração oral do etanol. O efeito inibitório dos extratos sobre a formação das lesões gástricas foi aproximado ao apresentado pela droga padrão, omeprazol, cuja média de ulceração foi 87,02% menor do que a do grupo controle negativo.

O EAPP foi capaz de reduzir potencialmente a área relativa de lesão, quando comparado ao controle negativo, em todas as doses administradas, de maneira dose-dependente. Porém, foram significativas somente as reduções obtidas com as duas maiores doses, quando comparadas ao grupo controle negativo, pelo teste de Dunnett (p<0,05) (FIGURA 2). Já em relação ao EHPP, somente a dose de 500 mg/Kg inibiu significativamente a formação das lesões gástricas (p<0,05), ou seja, apesar de o extrato hidroalcoólico ter reduzido a área ulcerada em todas as doses testadas, não agiu de forma dose-dependente, já que a dose de 1000 mg/Kg exibiu uma gastroproteção inferior à apresentada pela menor dose testada, 250 mg/Kg (FIGURA 2).

Muitas espécies da família Loranthaceae são utilizadas popularmente no tratamento de gastrite, úlceras e outras desordens do trato gastrointestinal (AMEER et al., 2010; SCUDELLER, VEIGA e ARAÚJO-JORGE, 2009; PATIL et al., 2011; OUEDRAOGO et al., 2011). Entretanto, são escassos os estudos científicos que comprovem o potencial antiulcerogênico dessas espécies. Os resultados dos experimentos conduzidos por Freire e colaboradores (2011) evidenciaram que os extratos aquoso e hidroalcoólico das folhas da erva-de-passarinho Struthanthus marginatus (Desr.) Blume apresentam efeito gastroprotetor contra lesões agudas induzidas por diferentes agentes ulcerogênicos (etanol, AINE e estresse), apresentando efeito inibitório da secreção ácida gástrica e estimulando a secreção de muco. Em relação ao gênero Psittacanthus não foram encontrados na literatura registros de estudos pré-clínicos que avaliem o potencial gastroprotetor de suas espécies.

O fenômeno da lesão gástrica ocorre quando uma agressão ou diminuição na resistência da mucosa quebra o equilíbrio fisiológico entre as barreiras de proteção e os fatores ulcerogênicos (MALFERTHEINER, CHAN e MCCOLL, 2009; TARNAWSKI e AHLUWALIA, 2012). Desse modo, o tratamento da úlcera apresenta como possíveis alvos atenuar os fatores de agressão da mucosa ou estimular suas defesas, como, por exemplo, na produção de muco citoprotetor, bicarbonato, prostaglandinas e óxido nítrico (LAU et al., 2011).

Os compostos fenólicos encontrados nos extratos de P. plagiophyllus (flavonoides, taninos e cumarinas) representam um importante grupo de metabólitos secundários envolvidos na atividade antiulcerogênica de diversas espécies vegetais, devido, ao menos em parte, ao seu poder antioxidante (ARBOS, 2004; PRADO, 2013). As cumarinas podem inibir a secreção ácida gástrica em ratos e proteger a mucosa gástrica contra lesões induzidas por etanol, AINE e estresse (BIGHETTI et al., 2005). Já a citoproteção conferida pelos taninos pode ocorrer pela interação entre esses compostos e as mucinas do tecido gástrico, formando um complexo que pode atuar como uma camada protetora contra danos causados por H+, enzimas proteolíticas e etanol (CARVALHO, 2007; PRADO, 2013). Os flavonoides, por sua vez, são capazes de proteger a mucosa gastrointestinal de lesões produzidas por diversos modelos experimentais de úlcera e contra diferentes agentes necróticos, apresentando um potencial terapêutico mais eficaz e menos tóxico, ideal para o tratamento de doenças gastrointestinais como as úlceras pépticas (MOTA et al., 2009).

Apesar de o modelo experimental utilizado neste trabalho evidenciar principalmente a ação de substâncias citoprotetoras, P. plagiophyllus pode ter ação tanto na proteção da mucosa estomacal, como na redução da secreção ácida ou de outros fatores agressores, sendo necessários estudos mais aprofundados que elucidem os mecanismos de ação dos extratos brutos e de seus compostos isolados.

Toxicidade aguda oral

Não foi possível calcular a DL50 para os extratos, pois não houve mortes durante todo o período de observação, nas doses avaliadas de 2500 e 5000 mg/Kg do EAPP e do EHPP. A dose de 5000 mg/Kg é a maior dose a ser administrada nos testes de toxicidade pré-clínica de fitoterápicos e, de acordo com a classificação de Loomis e Hayes (1996), compostos com DL50 maior que 5000 mg/kg são considerados praticamente não-tóxicos. Sendo assim, os extratos aquosos e hidroalcoólico de P. plagiophyllus podem ser caracterizados como não tóxicos, quando administrados em uma única dose oral de até 5000 mg/Kg.

Também não foram observados sinais tóxicos de caráter geral, sejam alterações na aparência ou no comportamento dos animais que receberam os extratos. O consumo de alimentos pelos animais durante os 14 dias de observação se apresentou normal e não houve diferenças significativas (p>0,05) no percentual de ganho de peso dos grupos tratados em relação ao grupo controle (FIGURA 3).

Durante a autópsia não foram observadas alterações nos órgãos internos em relação à coloração, textura e tamanho e, portanto, exames histopatológicos foram dispensados. A média do peso relativo do baço, rins, pulmões, coração e fígado dos grupos tratados não apresentou diferença significativa (p>0,05) em relação ao grupo controle, que recebeu apenas água (FIGURA 4).

Não foram encontrados na literatura estudos de toxicidade com espécies do gênero Psittacanthus. No entanto, em estudo com a espécie Struthanthus marginatus, pertencente à mesma família botânica (Loranthaceae), Freire e colaboradores (2011) avaliaram a toxicidade aguda dos extratos aquoso e hidroalcoólico e também não observaram qualquer sinal indicativo de toxicidade.

Os resultados deste experimento mostram que tanto o EAPP como o EHPP apresentaram baixa ou nenhuma toxicidade, o que já representa uma maior segurança na utilização desta espécie como remédio caseiro. Porém, faz-se necessário, ainda, a complementação dos experimentos, de modo a expor os animais a doses diárias do extrato por um período prolongado (±30 dias), para o estudo da possível toxicidade subcrônica deste, com avaliação de parâmetros histológicos, bioquímicos e hematológicos.

A espécie P. plagiophyllus apresenta potencial para utilização futura como fitoterápico no tratamento e/ou prevenção da formação de úlceras gástricas. Ademais, esta pesquisa representa uma importante contribuição ao estudo farmacológico, toxicológico e fitoquímico do gênero Psittacanthus e da família Loranthaceae.

FIGURA 2
FIGURA 2. Área relativa de lesão do estômago de ratas que receberam por via oral água (controle negativo) omeprazol (droga padrão), EAPP ou EHPP, uma hora antes da administração oral de etanol 75% para indução de lesões gástricas. Cada coluna representa à média (n=6) da área relativa de lesão e as barras representam o erro padrão da média. * indica diferença significativa (p<0,05) entre os grupos tratados e o controle negativo pelo teste de Dunnett. EAPP = Extrato aquoso das folhas de Psittacanthus plagiophyllus. EHPP = Extrato hidroalcoólico das folhas de P. plagiophyllus.
FIGURA 3
FIGURA 3. Percentual de ganho de peso de ratos após 14 dias da administração de água (controle), EAPP ou EHPP. As colunas representam a média (n=6) do percentual de ganho de peso dos animais e as barras representam o erro padrão da média. A análise de variância não mostrou diferença significativa entre os grupos tratados e o controle. EAPP = Extrato aquoso das folhas de Psittacanthus plagiophyllus. EHPP = Extrato hidroalcoólico das folhas de P. plagiophyllus.
FIGURA 4
FIGURA 4. Peso relativo dos órgãos de ratos após 14 dias da administração de água (controle), EAPP ou EHPP. As colunas representam a média (n=6) do peso relativo dos órgãos e as barras representam o erro padrão da média. A análise de variância não mostrou diferença significativa entre os grupos tratados e o controle. EAPP = Extrato aquoso das folhas de Psittacanthus plagiophyllus. EHPP = Extrato hidroalcoólico de P. plagiophyllus.

Agradecimentos

Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação Amazônia Paraense de Amparo à Pesquisa (FAPESPA).

Referências