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Comunicação Breve

Incentivo governamental para Arranjos Produtivos Locais de Plantas Medicinais e Fitoterápicos no âmbito do SUS

Government incentives for Local Productive Arrangements of Medicinal Plants and Herbal Medicines at Unified Health System (SUS)

Autores:
1FERREIRA, Leide Lene Coelho*;
1MATTOS, Jorge L. C.;
2OLIVEIRA, Danilo R. de;
3BEHRENS, Maria D.
Instituições
1Instituto Vital Brazil – IVB, Gerência de Fitoterápicos, Diretoria Industrial, Niterói, RJ, Brasil.
2Universidade Federal do Rio de Janeiro, Departamento de Produtos Naturais e Alimentos, Manguinhos, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
3Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz, Instituto de Tecnologia em Fármacos, Farmanguinhos, Departamento de Produtos Naturais, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
*Correspondência:
leide.farma@gmail.com

Resumo

O Ministério da Saúde vem publicando, desde 2012, editais para a seleção pública de projetos de Arranjos Produtivos Locais (APLs) em plantas medicinais e fitoterápicos no âmbito do SUS. APL pode ser definido como aglomeração de empresas, localizadas em um mesmo território, que apresentam especialização produtiva e mantêm algum vínculo de articulação, interação, cooperação e aprendizagem entre si e com outros atores locais, tais como: governo, associações empresariais, instituições de crédito, ensino e pesquisa. O presente estudo teve como objetivo descrever, de modo sistematizado e conciso, as informações essenciais sobre os APLs selecionados nos anos de 2012 e 2013. De dezembro de 2014 a março de 2015 foi solicitado aos coordenadores dos 23 APLs selecionados responder um questionário. Destes, 17 responderam. O recurso financeiro aportado pelo Ministério da Saúde possibilitou a aquisição de materiais de consumo e permanentes para a reestruturação dos setores de cultivo e de manipulação, bem como a realização de cursos de capacitação para profissionais de saúde e agricultores familiares envolvidos no projeto. Quanto aos problemas identificados, o mais citado pelos coordenadores foi a dificuldade na execução do recurso financeiro, o que resultou no atraso do início de alguns projetos. Contudo, o incentivo governamental para a formação de APLs consolida o serviço de fitoterapia na atenção primária à saúde no SUS.

Palavras-chave:
Editais e Programas de Saúde.
Arranjos Produtivos Locais.
Plantas Medicinais.
Fitoterapia.

Abstract

The Ministry of Health has since 2012 been issuing public bids for the selection of local productive arrangements (LPAs) projects in the area of medicinal plants and herbal medicines, under the auspices of the government's Unified Health System (SUS). LPAs can be defined as groups or communities, located in the same area, which have a productive specialization and possess some type of cooperation and exchange of knowledge among themselves and with other local stakeholders such as the government, business associations, credit institutions, educational and research. The present study aimed to describe, in a systematic and concise way, the essential informations about the LPAs which were selected in the years 2012 and 2013. From December 2014 to March 2015 coordinators of 23 LPAs were requested to answer a questionnaire. Of these, 17 replied. The resources invested by the Ministry of Health enabled the LPAs to purchase supplies and equipment for cultivation and production, as well as to provide technical training courses for health professionals and agricultural workers involved in the project.  The most problem reported was the management of financial resources, which resulted in startup delays of some projects. However, these government incentives for settling LPAs in Brazil has contributed to establishing phytotherapy in SUS clinics.

Keywords:
Program and Health Programmes.
Local Productive Arrangements.
Medicinal Plants.
Phytotherapy.

Introdução

Arranjo produtivo local (APL) pode ser definido como aglomerações de empreendimentos de um mesmo ramo, localizados em um mesmo território, que mantêm algum nível de articulação, interação, cooperação e aprendizagem entre si e com os demais atores locais como, o governo, instituições de pesquisa, ensino e instituições de crédito (BRASIL, 2008). A (FIGURA 1) representa a configuração de um APL, com a localização do governo no centro da figura sugerindo sua atuação como principal agente promotor da interação e articulação entre os demais atores. Todavia, é comum a rotatividade de posição dos atores, de acordo com a estrutura da aglomeração.

FIGURA 1 - Composição de um Arranjo Produtivo Local (Adaptado de CASSIOLATO; LASTRES e STALLIVIERI, 2008).
FIGURA 1. Composição de um Arranjo Produtivo Local (Adaptado de CASSIOLATO; LASTRES e STALLIVIERI, 2008)

No Brasil, o incentivo à formação de APLs é considerado uma importante estratégia governamental para o desenvolvimento do país. Tal medida resultou ao longo dos anos na estruturação de um grande número de APLs voltados para diversos segmentos econômicos e industriais, como os setores de madeira e móveis; cerâmica; couro e calçados; metalurgia, turismo, agricultura e outros (CASSIOLATO, LASTRES e STALLIVIERI, 2008).

Assim, na perspectiva de ampliar o escopo de projetos de APLs e fortalecer a cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos, diretriz da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF) (BRASIL, 2006); o Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos (DAF), vinculado à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério da Saúde (MS), desde o ano de 2012, vem publicando editais para seleção de projetos de APL em plantas medicinais e fitoterápicos no âmbito do SUS (BRASIL, 2012 a).

Os editais são publicados anualmente, e as propostas de projetos devem ser submetidas para uma das três modalidades (FIGURA 2), por intermédio das Secretarias de Saúde, Municipais ou Estaduais.  O presente estudo teve como objetivo descrever, de modo sistematizado e conciso, as informações essenciais sobre os APLs selecionados nos anos de 2012 e 2013, somente para a Modalidade 2.

FIGURA 2 - Modalidades de apoio do MS para projetos de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (Adaptado de BRASIL, 2014).
FIGURA 2 - Modalidades de apoio do MS para projetos de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (Adaptado de BRASIL, 2014).

Material e Métodos

O presente trabalho utiliza o estudo exploratório-descritivo com abordagem quali-quantitativa. Para coleta das informações, a pesquisa foi aplicada, entre dezembro de 2014 e março de 2015, aos coordenadores das 23 Secretarias de Saúde, estaduais e municipais, selecionadas pelos editais do DAF/SCTIE/MS nos anos de 2012 e 2013, com projetos contemplados na Modalidade 2.  O instrumento de coleta foi um questionário com perguntas abertas, fechadas e de múltipla escolha (enviado por meio eletrônico e entregue pessoalmente), juntamente com o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido). Para os dados qualitativos, adaptou-se a técnica de análise temática de conteúdo, proposta por Minayo (2007). Os resultados obtidos foram contabilizados no Microsoft Excel®.  O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ (CEP/HUCFF/UFRJ) sob o parecer nº 901.40, em 07 de dezembro de 2014.

Resultados e Discussão

No ano de 2012, as Secretarias de Saúde de 12 municípios e dois (02) estados foram habilitadas para receber recursos financeiros de investimento e custeio para os referidos APLs, no valor total de R$ 10.129.228,09 (BRASIL, 2012 b). No ano de 2013 foram repassados recursos no valor total de R$ 6.159.565,90 para sete (07) municípios e dois (2) estados, também para a consolidação de APLs.  Em novembro do mesmo ano, com o objetivo de apoiar à Assistência Farmacêutica em Plantas Medicinais e Fitoterápicos, o MS convidou novamente municípios e estados de todo o país, para enviarem suas propostas, e foi aprovado um repasse na ordem de R$ 2.850.000,00 para as Secretarias de Saúde de 21 municípios e três (03) estados. No edital do ano seguinte (Edital Nº 1 SCTIE/MS, de 30 de maio de 2014), além das modalidades 1 e 2, foi incluída uma nova modalidade com o objetivo de apoiar o Desenvolvimento e Registro Sanitário de Fitoterápicos da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) por Laboratórios Farmacêuticos Públicos. Foram repassados recursos financeiros na ordem de R$ 7.176.801,69 para 19 municípios e estados (BRASIL, 2014). Em agosto de 2015 foi publicado o Edital N.º 2 SCTIE/MS, com o objetivo de apoiar projetos para as três modalidades. Um total de 12 secretarias municipais e estaduais das regiões Sul e Sudeste foram contempladas, com um valor total de R$ 3.994.473,96 (BRASIL, 2015). De 2012 a 2015 foram contemplados com recursos financeiros do MS um total de 78 projetos.

Está representada no mapa (FIGURA 3) a população do estudo, coordenadores das 23 Secretarias de Saúde, estaduais e municipais, selecionadas pelos editais do DAF/SCTIE/MS nos anos de 2012 e 2013. Somente 17 responderam ao questionário.

FIGURA 3: Número de projetos de APL de Plantas Medicinais e Fitoterápicos contemplados pelos editais de 2012 e 2013 – modalidade 2 (adaptado de BRASIL, 2012b; BRASIL, 2013).
FIGURA 1: Conteúdo de fenólicos totais obtido pelo método de Folin-Denis, comparando diferentes técnicas de extração e tamanhos de partícula do material vegetal.

Em relação à participação da agricultura familiar nos projetos de APLs, foi informado um total de 189 agricultores familiares, um número considerado alto, frente ao número de APLs avaliados. A agricultura familiar é considerada estratégica no segmento produtivo e social do país. Seu modelo produtivo, baseado na produção familiar, tende a utilizar, de maneira racional, os insumos produtivos, e contribui para a manutenção da biodiversidade no país (BRASIL, 2012 c). Foi identificada a participação de profissionais de saúde como: médicos, farmacêuticos, odontólogos, nutricionistas, agentes comunitários de saúde, agrônomos e técnicos agrícolas. Os APLs realizam cursos de capacitação para agricultores e profissionais de saúde na forma de oficinais, encontros e seminários. Estas atividades estão em consonância com a recomendação dos editais do MS para o eixo capacitação. Todos os 17 APLs possuíam parcerias em seus projetos, como universidades públicas e privadas; institutos de ciência e tecnologia; empresas de insumos/extratos; indústrias farmacêuticas; ONGs, cooperativas, associação de agricultores, dentre outros. No entanto, não foi possível identificar as responsabilidades dos parceiros.

Em relação à aquisição de materiais de custeio e permanente para estruturação dos APLs, no período da coleta de dados, muitos projetos encontravam-se ainda no estágio inicial e, portanto, não haviam iniciado os processos de compra. Outros afirmaram que após o repasse do recurso foi possível a aquisição de insumos e equipamentos para as áreas de manipulação, controle de qualidade e produção de derivados vegetais. Quanto à infraestrutura para o cultivo, nove (09) APLs já possuíam hortos de plantas medicinais ou áreas para o cultivo de mudas. Após a obtenção do recurso financeiro do MS, foi possível estruturar novos viveiros e canteiros de plantas medicinais apropriados para a produção de matrizes; unidade de cultivo de uso comunitário; aquisição de sistema de irrigação, ferramental para o cultivo, dentre outros. Ressalta-se que melhorias foram apontadas, após o aporte do recurso, mas estes dados poderiam ser mais representativos.

No que diz respeito aos resultados sobre a gestão dos APLs, explorou-se o material para codificar as respostas em categorias e identificar os problemas mais citados, a fim de sistematizá-los (QUADRO 1).

QUADRO 1. Categorias dos problemas mais citados pelos coordenadores dos APLs pesquisados.
CATEGORIAS DOS PROBLEMAS PROBLEMAS MAIS CITADOS
GESTÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA Execução do recurso financeiro
Contrato de parcerias
MUDANÇAS GOVERNAMENTAIS Troca de governo
Motivação e comprometimento
AQUISIÇÃO DE MATERIAIS Processo licitatório
Fonte: Dados da pesquisa

Entre os mais citados, como primeira categoria indica-se a gestão orçamentária e financeira, cujos problemas foram identificados em 13 APLs. O principal problema apontado pelos coordenadores foi a execução dos recursos financeiros, de responsabilidade da Secretaria de Saúde. Outro tipo de problema identificado foi a formalização dos contratos de parcerias. Os coordenadores informaram a demora nos trâmites administrativos e jurídicos para efetivação destes contratos por parte da gestão administrativa e jurídica das secretarias. Na segunda categoria, as mudanças governamentais são apontadas pelos coordenadores como problemas que se apresentaram no período de execução dos projetos.  A troca de governo, municipal ou estadual, muitas vezes implica em troca do quadro funcional das secretarias. Tais mudanças podem ter relação com a falta de motivação e comprometimento por parte do novo corpo administrativo, ou, possivelmente, por falta de entendimento do projeto. A terceira categoria (aquisição de materiais) é apontada como uma dificuldade operacional de execução das atividades nos projetos de APL e contribui significativamente para o atraso dos projetos. Os coordenadores afirmam que as secretarias municipais e estaduais de saúde não estão familiarizadas com os processos licitatórios de compra de materiais permanentes e materiais de custeio específicos para os projetos com plantas medicinais e fitoterápicos, como exemplo, ferramental agrícola, materiais de irrigação, adubos e etc.

Todos os problemas apresentados podem ter contribuído para a solicitação de prorrogação de prazo de todos os 14 projetos de APL, referente ao edital do ano de 2012, como informado pelo DAF/SCTIE/MS em junho de 2015.

Conclusão

Os recursos financeiros obtidos do Ministério da Saúde foram de grande importância para os projetos de APL avaliados, visto que possibilitaram às secretarias de saúde municipais e estaduais a aquisição de materiais e equipamentos para implantar e/ou adequar programas e ações com plantas medicinais e fitoterápicos em suas regiões.  A execução deste recurso foi apontada pela maioria dos coordenadores como principal ponto crítico para o inicio dos projetos. Ainda que o presente artigo não tenha realizado uma exploração aprofundada da real situação dos APLs, constatou-se que estes incentivos governamentais são grande relevância para consolidar o serviço da fitoterapia na atenção primária à saúde no SUS.

Referências