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Comunicação Breve

Influência da técnica de extração e do tamanho de partícula do material vegetal no teor de compostos fenólicos totais da tintura das folhas de Alpinia zerumbet

Influence of extraction technique and particle size of the plant material in the content of total phenolic compounds of tincture of Alpinia zerumbet leaves

Autores:
1,2CARDOSO, Igor C.*;
2PEREIRA, Henrique Marcelo G.;
1TAPPIN, Marcelo Raul R.;
1BEHRENS, Maria D.
Instituições
1Fundação Oswaldo Cruz, Instituto de Tecnologia em Fármacos, Departamento de Produtos Naturais, Manguinhos, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
2Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Química, Centro de Tecnologia, Cidade Universitária, Ilha do Governador, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
*Correspondência:
igorcunhacardoso@gmail.com

Resumo

A espécie Alpinia zerumbet (Zingiberaceae) tem amplo emprego na medicina tradicional e popular como diurética e anti-hipertensiva. O Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira padroniza o uso de A. zerumbet na forma de tintura, indicada para o tratamento de hipertensão arterial leve. O presente estudo tem como objetivo avaliar a influência da técnica de extração e do tamanho de partícula do material vegetal no processo extrativo de compostos fenólicos totais das folhas de Alpinia zerumbet. Folhas secas foram extraídas com etanol: água (7:3, v/v), comparando-se quatro técnicas de extração (percolação, maceração estática, extração por ultrassom e maceração dinâmica), cada uma combinada a quatro faixas de tamanhos de partícula do material vegetal (não tamisado, 16-32 mesh, 32-60 mesh e 60-100 mesh) totalizando 16 extrações. Os compostos fenólicos totais foram quantificados utilizando o método espectrofotométrico de Folin-Denis. A percolação demonstrou ser a técnica mais eficiente, seguida da maceração dinâmica, extração por ultrassom e, com menor eficiência, a maceração estática. A variação no tamanho de partícula do material vegetal demonstrou não influenciar significativamente na extração de fenólicos totais. A percolação e a faixa de tamanho de partícula padronizado entre 60 e 100 mesh, demonstrou ser a combinação mais eficiente avaliada neste estudo.

Palavras-chave:
Extração.
Granulometria.
Tintura.
Alpinia zerumbet.
Folin-Denis.

Abstract

The specie Alpinia zerumbet (Zingiberaceae) has been use in the traditional and folk medicine as a diuretic and antihypertensive. The Herbal Medicines Formulary of the Brazilian Pharmacopoeia lists Alpinia zerumbet for the treatment of mild hypertension. This study aims to evaluate the influence of the extraction technique and particle size of the plant material in the extraction of total phenolic compounds from Alpinia zerumbet leaves. Dried leaves were extracted using a mixture of ethanol:water (7:3, v/v) combining four techniques (percolation, static maceration, ultrasound and dynamic maceration) with four ranges of particle size (not sieved, 16-32 mesh, 32-60 mesh and 60-100 mesh), totaling 16 extractions. The total phenolic compounds were quantified using the spectrophotometric method of Folin-Denis. Percolation was shown to be the most efficient method, followed by dynamic maceration, ultrasound and finally, the less efficient method, static maceration. The particle size of the plant material was not significant in the extraction of total phenolics. The percolation and the particle size ranges from 60 to 100 mesh proved to be the most efficient combination evaluated in this study.

Keywords:
Extraction.
Particle size.
Tincture.
Alpinia zerumbet.
Folin-Denis.

Introdução

O uso sustentável dos imensos recursos da natureza como fonte de insumos farmacêuticos ativos, combinados à tradição de utilização de plantas na terapêutica, proporciona vantagens competitiva e comparativa no desenvolvimento de medicamentos. Os custos de validação das plantas medicinais de uso tradicional são inferiores aos do desenvolvimento de um medicamento sintético.

Alpinia zerumbet (Pers.) B.L. Burtt & R.M. Sm (Zingiberaceae), conhecida popularmente no Brasil como colônia, tem amplo emprego na medicina tradicional e popular como diurética e anti-hipertensiva (KRESS; PRINCE; WILLIAMS, 2002; MORITA et al., 1996; MPALANTINOS et al., 1998; VICTÓRIO et al., 2009). A espécie vem sendo utilizada em diversos programas de fitoterapia em saúde pública, cultivada em hortos medicinais e Arranjos Produtivos Locais de plantas medicinais e fitoterápicos apoiados pelo Ministério da Saúde.

O Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira, publicado pela Anvisa para dar suporte às práticas de produção e dispensação de fitoterápicos, padroniza o uso das folhas de A. zerumbet na forma de tintura indicada para o tratamento da hipertensão arterial leve (BRASIL, 2011).

Estudos farmacológicos associam as atividades anti-hipertensiva e diurética com a presença de compostos fenólicos, com destaque para os flavonoides (MPALANTINOS et al., 1998; VICTÓRIO; LAGE; KUSTER, 2009).

A complexidade das matrizes vegetais requer a padronização do processo extrativo, que está diretamente relacionado com a qualidade, eficácia e a segurança do fitoterápico (DOBIÁŠ et al., 2010). Fatores como a técnica de extração e o grau de divisão do material vegetal tornam-se fundamentais, visto que influenciam na eficiência do processo (GIL-CHÁVEZ et al., 2013). Consequentemente, esses fatores devem ser padronizados, visando à obtenção de um produto final tecnologicamente viável a preços acessíveis. O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência da técnica de extração e do tamanho de partícula do material vegetal no teor de compostos fenólicos totais da tintura das folhas de Alpinia zerumbet.

Material e Métodos

Material vegetal e análise granulométrica

Folhas de Alpinia zerumbet foram coletadas na Plataforma Agroecológica de Fitomedicamentos de Farmanguinhos/Fiocruz. Amostras testemunho da espécie estão depositadas no Herbário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (RB452.719). O material vegetal foi secado em estufa com circulação forçada de ar, durante 48h a 40°C, e triturado em moinho de facas MA-680 (Marconi). Cerca de 200g do material vegetal foram submetidos à passagem através de tamises com aberturas de malha de 16, 32, 60 e 100 mesh.

Preparo dos extratos

O estudo sobre o processo de extração foi realizado combinando os fatores: técnica de extração (percolação, maceração estática durante 24 horas, maceração dinâmica por agitação com auxílio de barra magnética a 3000 rpm durante 5 horas e extração por ultrassom durante 30 minutos) e granulometria (grau de divisão) do material vegetal (partículas de: 16-32 mesh, 32-60 mesh, 60-100 mesh e de material não tamisado). Todas as tinturas foram preparadas utilizando como líquido extrator uma solução etanol/água (7:3, v/v). Os extratos obtidos por percolação foram preparados com 20g de material vegetal, empregando um percolador de 1,0L com velocidade de gotejamento de 20gotas.min.-1, perfazendo um volume final de 100mL, conforme método descrito no Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira (BRASIL, 2011). Os extratos obtidos por maceração estática, extração por ultrassom e maceração dinâmica foram preparados respeitando a relação de 20g de material vegetal para 200mL de líquido extrator. Os extratos foram preparados em triplicata.

Determinação do teor de compostos fenólicos totais

O método empregado para a determinação do teor de compostos fenólicos totais foi o de Folin-Denis. O regente de Folin-Denis e a solução saturada de carbonato de sódio foram preparados conforme Perez ecolaboradores (1999). Com o objetivo de respeitar a faixa linear do método, as tinturas foram previamente diluídas com etanol/água (7:3, v/v) na proporção de: 1:15 (extração por maceração estática); 1:25 (extrações por ultrassom e maceração dinâmica) e 1:50 (extração por percolação). Alíquotas de 0,5mL de cada solução (tintura diluída), 0,5mL do reagente de Folin-Denis e 3mL de água destilada foram pipetadas, respectivamente, em balões volumétricos de 10mL e homogeneizadas, mantendo-se então em repouso por 1h. Após, adicionou-se 1mL da solução saturada de carbonato de sódio e completou-se o volume com água destilada. Um branco de amostra foi preparado do mesmo modo, utilizando 0,5mL de solução etanol:água (7:3, v/v) ao invés da tintura. As absorbâncias das soluções foram determinadas em comprimento de onda de 760nm empregando um espectrofotômetro UV-1800 (Shimadzu). Para quantificar as soluções das amostras, uma curva padrão foi preparada adicionando-se cerca de 4,0 mg do flavonoide rutina (Sigma-Aldrich) em balão de 10mL, utilizando etanol:água (7:3, v/v) como solvente. Alíquotas de 0,8mL, 0,6mL, 0,4mL e 0,2mL desta solução foram diluídas em balão de 1mL com o mesmo solvente. A partir deste segundo conjunto de soluções, alíquotas de 0,5mL foram utilizadas no preparo da curva padrão adotando o mesmo método descrito acima para o preparo das amostras. As concentrações finais das soluções padrão foram: 20 µg.mL-1 (P1), 16 µg.mL-1 (P2), 12 µg.mL-1 (P3), 8 µg.mL-1 (P4) e 4 µg.mL-1 (P5)

Resultados e Discussão

Neste estudo procedeu-se a uma análise da influência da técnica de extração e da granulometria do material vegetal na eficiência do processo extrativo de compostos fenólicos da tintura das folhas de Alpinia zerumbet. Metodologias de análise estatística dos resultados e análise da variância (ANOVA) foram aplicadas aos ensaios realizados, considerando um nível de significância de 5%. O teor de fenólicos totais foi obtido através do método de Folin-Denis, sendo expresso como a concentração equivalente em rutina em miligramas por mililitro de tintura. A curva padrão de rutina, obtida pelo método dos quadrados mínimos, apresentou coeficiente de determinação (r²) de 0,985 e faixa de trabalho corrigida pela massa pesada e pureza do padrão estabelecida entre 23,6 µg.mL-1 e 4,7 µg.mL-1.

FIGURA 1: Conteúdo de fenólicos totais obtido pelo método de Folin-Denis, comparando diferentes técnicas de extração e tamanhos de partícula do material vegetal.
FIGURA 1: Conteúdo de fenólicos  totais obtido pelo método de Folin-Denis, comparando diferentes técnicas de  extração e tamanhos de partícula do material vegetal.

Os valores consistem da média ± desvio padrão; letras iguais indicam que não há diferença estatística entre as condições de extração (p>0,05); P1: percolação (sem tamisar); P2: percolação (16-32 mesh); P3: percolação (32-60 mesh); P4: percolação (60-100 mesh); ME1: maceração estática (sem tamisar); ME2: maceração estática (16-32 mesh); ME3: maceração estática (32-60 mesh); ME4: maceração estática (60-100 mesh); US1: ultrassom (sem tamisar); US2: ultrassom (16-32 mesh); US3: ultrassom (32-60 mesh); US4: ultrassom (60-100 mesh); A1: maceração dinâmica (sem tamisar); A2: maceração dinâmica (16-32 mesh); A3: maceração dinâmica (32-60 mesh); A4: maceração dinâmica (60-100 mesh).

Conforme pode ser observado acima, (FIGURA 1) as maiores concentrações de fenólicos totais foram obtidas com a percolação. Esta técnica é amplamente indicada no Formulário de Fitoterápicos da Farmacopéia Brasileira (BRASIL, 2011) para a obtenção de tinturas a partir de diferentes materiais vegetais. Os resultados apresentados naFIGURA 1 também indicam que as quatro técnicas de extração apresentaram diferenças significativas na capacidade de obtenção de fenólicos totais. A percolação foi significativamente superior à extração por ultrassom e à maceração dinâmica, seguidos pela maceração estática, que apresentou a menor eficiência extrativa. Os altos teores de compostos fenólicos nas tinturas obtidas por percolação podem ser explicados pela passagem, por ação da gravidade, do líquido extrator através do material vegetal triturado, após as 24 horas de repouso. Uma etapa a mais que, por exemplo, no extrato obtido por maceração estática, que foi prontamente homogeneizado e filtrado após este mesmo período de repouso. A percolação também demonstrou ser a técnica extrativa mais eficiente para substâncias antioxidantes do fruto de Syzygium cumini (L.) (MIGLIATO et al., 2011). A extração por ultrassom destaca-se pela alta eficiência em um curto período de tempo. Esta técnica tem sido muito utilizada na extração de metabólitos secundários (HROMÁDKOVÁ e EBRINGEROVÁ, 2003; TOMA et al., 2001; VÁZQUEZ et al., 2015). Além da eficiência de extração, a maceração dinâmica apresentou em comum ao ultrassom um menor consumo de tempo, em comparação com a maceração estática e a percolação.

Um fator importante em um processo extrativo é a sua reprodutibilidade. O desvio padrão é uma medida muito utilizada para verificar a dispersão entre dados amostrais (RIBEIRO et al., 2008). As técnicas extrativas mais reprodutíveis foram a maceração dinâmica e a maceração estática, seguidas da percolação e da extração por ultrassom (FIGURA 1). Isto demonstra que mesmo com o controle rigoroso das variáveis que influenciam o processo extrativo, outros fatores ou erros podem influenciar a extração.

A análise granulométrica do material vegetal é uma etapa imprescindível para a padronização de um processo extrativo. Partículas com dimensões homogêneas aumentam a área de contato entre o material vegetal e o líquido extrator, podendo aumentar, conseqüentemente, a eficiência da extração (PRISTA, ALVES e MORGADO, 2008). O tamanho da partícula também é conhecido por influenciar a área de superfície de um material sólido. Partículas menores apresentam uma maior área de contato com o líquido extrator, mas, neste caso, nem sempre há um aumento na eficiência do processo extrativo. O poder de penetração dos solventes depende, por exemplo, da consistência dos tecidos que formam o material a extrair e principalmente do processo de extração. Partículas muito pequenas tendem a formar uma camada compacta de pó, dificultando a penetração do solvente, principalmente em métodos como a percolação, que necessitam da passagem do líquido extrator entre as partículas do material triturado (VASCONCELOS et al., 2005). Para a granulometria selecionada, não houve diferença significativa entre os teores de fenólicos totais obtidos para as tinturas, considerando cada técnica extrativa isoladamente. Estes resultados demonstraram que não há necessidade de homogeneizar o tamanho da partícula antes da extração. Entretanto, é importante destacar que para a percolação e para a maceração dinâmica, a extração foi mais efetiva utilizando partículas entre 60-100 mesh. Para a maceração estática e a extração por ultrassom, a eficiência foi maior para o material vegetal não tamisado.

Conclusão

Os resultados obtidos, neste estudo, demonstraram a importância da técnica de extração no processo extrativo. A maceração estática, uma técnica clássica muito aplicada na ciência dos produtos naturais foi a que menos extraiu compostos fenólicos das folhas secas de Alpinia zerumbet, enquanto outras técnicas, menos convencionais, como a extração por ultrassom e a maceração dinâmica foram mais eficientes. A percolação demonstrou ser a técnica mais adequada, embora seja a que consome o maior tempo de extração. Por outro lado, é eficiente, barata e sustentável. O tamanho de partícula demonstrou não influenciar no processo de extração de compostos fenólicos, entretanto, ainda assim é recomendada a padronização da granulometria do material vegetal. Desta forma, recomendamos o preparo da tintura de Alpinia zerumbet utilizando o método de percolação com tamanho de partícula padronizado entre 60 e 100 mesh, a combinação mais eficiente avaliada neste estudo.

Referências