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Comunicação Breve - Política e Gestão da Inovação

http://dx.doi.org/10.5935/2446-4775.20160040

Análise da Implantação de Plantas Medicinais em Horta de Laje como Adjuvante no Tratamento e Prevenção da Tuberculose1

Analysis of Medicinal Plants Deployment in Horta de Laje as Adjuvant Treatment and Prevention of Tuberculosis

Autores:
2,3NILO, Marcela Caroline Bezerra Gama*
Instituições
1Monografia (TCC/Especialização) apresentada no curso de Pós-graduação em Gestão da Inovação em Medicamentos da Biodiversidade (Lato Sensu - EAD), Instituto de Tecnologia em Fármacos, Farmanguinhos, FIOCRUZ.
2Aluna do curso de pós-graduação Lato Sensu em Gestão da Inovação em Medicamentos da Biodiversidade (modalidade EAD) do Instituto de Tecnologia em Fármacos, Farmanguinhos/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
3Fundação Ataulpho de Paiva (FAP), São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
*Correspondência:
marcelacbgama@hotmail.com

Resumo

A tuberculose é uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium tuberculosis queleva à morte cerca de 5 mil pessoas por ano no Brasil e a maior incidência é no estado do Rio de Janeiro (aproximadamente 800 pessoas por ano). O presente trabalho tem como objetivo analisar a viabilidade da implantação de uma horta-piloto na laje do Instituto Vila Rosário, em Duque de Caxias-RJ, bem como os aspectos técnicos, financeiros e produtivos dessa implantação. Objetiva, também, estabelecer as condições necessárias para a manutenção e a sustentabilidade do sistema em longo prazo. Foram cultivadas 7 espécies vegetais com ação cientificamente comprovada no auxílio da prevenção e como adjuvante ao tratamento da tuberculose. Aproximadamente 12 kg de material vegetal foram colhidos ao longo do projeto. Os resultados obtidos mostraram que é viável implantar uma horta valendo-se do modelo utilizado. No entanto, para ampliação do projeto, será necessário aperfeiçoar o processo, promover a capacitação das pessoas envolvidas, bem como contar com incentivo político e financeiro através de organizações interessadas. Ao Instituto Vila Rosário, caberá o acompanhamento do projeto para avaliar o efeito positivo da adesão pelos casos de tuberculose (TB) da região em que atua.

Palavras-chave:
Horta de Laje.
Agricultura Urbana.
Vila Rosário.
Tuberculose.
Plantas Medicinais.

Abstract

Tuberculosis is an infectious disease caused by Mycobacterium tuberculosis that still leads to death around 5000 people yearly in Brazil and the highest incidence is in the state of Rio de Janeiro (approximately 800 people per year). This study aims to analyze the feasibility of implementing a pilot garden on the slab of the Instituto Vila Rosário, at Duque de Caxias-RJ as well as the technical, financial and production of this deployment. It also aims to establish the conditions necessary for the maintenance and sustainability of long-term system. 7 plant species were cultivated with action scientifically proven to aid the prevention and treatment of tuberculosis. About 12 kg of plant material was collected throughout the project. The results showed that it is feasible to implement a garden taking advantage of the model used. However, for expansion of the project it will be necessary to optimize the process, promote the training of people involved and rely on political and financial incentive through organizations concerned. The Institute will be responsible for project monitoring to assess the positive effect of membership of this project in cases of tuberculosis (TB) in the region where it operates.

Key-words:
Slab Garden.
Urban Agriculture.
Vila Rosário.
Tuberculosis.
Medicinal Plants.

Introdução

A tuberculose é uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium tuberculosis, bactéria descoberta por Koch em 1882 (HIJJAR, et al.2007), e que só no estado do Rio de Janeiro (maior incidência no país) 13.419 casos foram registrados, resultando 841 óbitos. (Secretaria de Estado de Saúde, 2015).

A OMS considera que a doença está sob controle quando a população apresenta até 5 casos por 100 mil habitantes (World Health Organization, 2015).

Vila Rosário é um bairro localizado no 2º distrito do município de Duque de Caxias, estado do Rio de Janeiro, onde a incidência da tuberculose, em 1996, era de 193 casos/100 mil e, em 1995, a mortalidade era de 9,28/100 mil, taxas estas três vezes superiores às nacionais (DINIZ, TEIXEIRA e GERHARDT FILHO, 2002). Este fato levou a antiga sociedade QTROP (Química Fina para o Combate a Doenças Tropicais), atual Instituto Vila Rosário, a atuar no combate à tuberculose nessa região (COSTA NETO, 2011).

A chamada "Grande Vila Rosário", local escolhido para a implantação da horta piloto, abrange 339 ruas onde moram cerca de 40 mil pessoas. A implantação de um modelo de horta de laje em Vila Rosário visa estimular a produção de plantas de cultivo caseiro que possam ser utilizadas para reforçar a imunidade das pessoas às doenças e, especificamente, agir na prevenção da tuberculose e até servir como adjuvante no seu tratamento.

Por esta razão, a evolução deste projeto, estendendo-se à população como um todo, pode se constituir em uma questão estratégica para a saúde pública. Ele representa, também, um incentivo à agricultura urbana, bem como, um estímulo à produção de plantas medicinais.

Este estudo se preocupou, também, em enfatizar a importância do elo nutrição da Cadeia da Miséria (doença-nutrição-renda-trabalho-cultura) (COSTA NETO, 2011) com a percepção de que a alimentação, com o foco na nutrição, pode trazer uma valiosa contribuição para a prevenção e tratamento da tuberculose.

O trabalho teve por objetivo analisar a viabilidade da implantação de uma horta-piloto na laje do Instituto Vila Rosário, em Duque de Caxias-RJ bem como analisar os aspectos técnicos, financeiros e produtivos dessa implantação e estabelecer as condições que permitam sua manutenção e a sustentabilidade do sistema em longo prazo.

Metodologia

Estudo qualitativo de caráter exploratório com abordagem multidisciplinar seguindo o modelo aberto (LAVILE e DIONNE, 1999). Segundo LAVILE e DIONNE, as categorias do modelo aberto vão se definindo ao longo do projeto, ou seja, não são fixadas no início e sim, de acordo com fatos que se tornam significativos durante o desenvolvimento, fazendo as modificações necessárias.

Inicialmente, foi caracterizado o enfoque para responder sobre a possibilidade de um sistema de produção agrícola em área urbana, valendo-se de hortas de laje, como forma de contribuir significativamente em programas de prevenção e tratamento de tuberculose (LOSADA & CASAS CASAS, 2010).

O enfoque do trabalho foi direcionado para as questões que foram consideradas mais pertinentes e distribuídas em 3 grupos para a análise e discussão. Estes grupos representaram os aspectos econômicos/ financeiros, sócio/ culturais e políticos. Estas análises foram realizadas a partir dos dados levantados na localidade de Vila Rosário situada no município de Duque de Caxias, Rio de Janeiro.

A seleção das espécies foi baseada em comprovação científica de atividade positiva no tratamento da tuberculose e no fortalecimento do sistema imune. Todas as plantas foram escolhidas a partir de critérios estabelecidos previamente, a saber:

O projeto teve início em Maio/2014 com a semeadura das espécies vegetais e finalizado em Setembro/2014 com a colheita da última espécie. Foram selecionadas 10 espécies vegetais (Alho, Agrião, Babosa, Capim-Limão, Cebola, Cenoura, Couve, Gengibre, Salsa e Tomate-cereja), entretanto, o alho, a babosa e a cebola não foram cultivadas no primeiro momento.

As espécies foram plantadas em sacos e caixas plásticas na laje do Instituto Vila Rosário e receberam adubação e irrigação a partir de recomendações técnicas. Toda a produção desse período foi quantificada.

A análise da implantação destas espécies em uma horta de laje foi baseada nas etapas, ações e recomendações descritas por LIZ, 2006. Todos os dados foram registrados, compilados e permitiram uma análise descritiva quanto à execução, resultados preliminares e o custo de implantação.

Resultados e Discussão

O projeto teve parceria com o engenheiro agrônomo Valério Morelli do Núcleo de Gestão em Biodiversidade (NGBS) / FIOCRUZ, as agentes comunitárias do Instituto Vila Rosário e o diretor na época, Claudio Costa Neto. A multidisciplinaridade foi um fator crucial em todo o estudo ressaltando a importância da colaboração de diversos atores que fizeram parte do processo de implantação da horta.

Definida a infraestrutura e os materiais necessários para a compra, foi estipulado o valor de segurança pelo engenheiro de 75 kg/m2 para a capacidade de sustentação da laje de 25m2. Em Janeiro/2014, a impermeabilização da laje foi feita.

Em Abril/2014, após a preparação da laje e a compra dos materiais, os propágulos foram transportados por um caminhão através do auxílio voluntário da empresa CERNE SERVIÇOS DE URBANIZAÇÃO LTDA do Campus Mata Atlântica para o Instituto Vila Rosário, onde as espécies ficaram em caixas e sacos plásticos distribuídos pela laje.

Cinco espécies vegetais foram semeadas no Campus da FIOCRUZ, Colônia Juliano Moreira em Maio/2014: Agrião, Couve, Cenoura, Salsa e Tomate-cereja. Os propágulos de Babosa, Capim-Limão e Gengibre foram disponibilizados pelo NGBS, assim como a terra e o adubo.

Enquanto isso, a execução do projeto hidráulico estava sendo realizada por um morador da região, fator que ressalta a valorização do trabalhador local. O sistema hidráulico foi projetado de forma a suprir a horta, mesmo quando houvesse queda de energia. Ou seja, houve a preocupação de se ter uma saída de água da caixa passando pela bomba e outra saída direto para a horta (a qual seria acoplada uma mangueira).

Toda a implantação foi baseada em preceitos agroecológicos, ou seja, baseado em tecnologias que têm como princípio a produtividade, rentabilidade e qualidade do produto, além de contemplar aspectos sócios- ambientais. Não houve o emprego de agrotóxicos nem de adubos químicos. O manejo da horta foi realizado pelas agentes do Instituto. A irrigação, inicialmente, foi feita através de microaspersores (ligados durante 5 minutos pela manhã e 5 minutos ao final da tarde). Posteriormente, devido a problemas com vizinhos e ajustes da irrigação, o sistema foi substituído pelo método manual.

Alguns imprevistos ocorreram também ao longo do projeto. Situações que podem ocorrer em qualquer horta urbana devido a diversos fatores, como por exemplo, a proximidade com vizinhos, o surgimento de insetos pragas/ plantas invasoras e a segurança do acesso à horta.

A capacitação das agentes para o manejo da horta foi realizada paralelamente à implantação. A sustentabilidade do programa se dará através de uma cartilha produzida em conjunto com as agentes do Instituto, específica para a produção de hortas em lajes de Vila Rosário.

A primeira colheita foi realizada em Julho/2014 e a colheita da última espécie, em Setembro/2014. Foi colhido 12 kg de material vegetal que foi consumido pelas próprias agentes e também utilizado na oficina de reaproveitamento de alimentos que é aberto a comunidade e ocorre toda última quinta-feira do mês.

A horta piloto possibilitou a experiência da exposição das espécies vegetais a diversos fatores como o clima, o modo de irrigação, o local do plantio e a produtividade de cada espécie, para que posteriormente, possam ser feitos os ajustes necessários.

No entanto, a compra de todos os materiais e, principalmente, as ações de adequação da infraestrutura levaram a um custo significativo de R$ 4.741,62. Valor esse que seria inviável para que a comunidade aderisse ao projeto, sem um apoio financeiro. Vale ressaltar, que esse valor foi pago pelo Instituto Vila Rosário através de fundos próprios obtidos pela colaboração de sócios e da Fundação Ataulpho de Paiva (FAP).

Com isso, materiais alternativos a um menor custo ou custo zero e a otimização da implantação poderiam viabilizar a adesão pela comunidade como, por exemplo: 1. Os sacos e caixas plásticas usados para organizar e separar as espécies cultivadas talvez possam ser substituídas por materiais de menor custo e maior resistência ou vida útil (como caixotes de madeira encontrados em mercados atacadistas e feiras livres ou garrafas pet de 3 litros). 2. A irrigação das plantas em um sistema de laje deve ser dimensionada levando em conta a proximidade com outras casas e a necessidade de métodos que levem ao uso racional da água para não haver desperdício e, consequentemente, um aumento desnecessário de despesas. 3. A obtenção de mudas ou sementes pode ser feita através de convênios com instituições (como o Instituto Estadual de Florestas (IEF), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio de Janeiro (PESAGRO), as Universidade Federal do Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Universidade Federal Fluminense (UFF), o Jardim Botânico do Rio de Janeiro e a Fundação Oswaldo Cruz).

Considerações Finais

Os resultados deste trabalho mostraram que a produção de plantas medicinais em horta de laje é tecnicamente viável desde que feitos os ajustes necessários para a adequação do funcionamento da horta à realidade da região. Entretanto, são necessários estudos mais aprofundados sobre a atuação das plantas como coadjuvante ao tratamento da tuberculose. Somente em longo prazo poderemos perceber o decréscimo dos altos índices de tuberculose em Vila Rosário com o trabalho já executado na região pelo Instituto Vila Rosário.

Essa é uma proposta baseada na vivência do Instituto, no poder medicinal das plantas e na aposta da agricultura urbana como medidas incentivadoras e independentes que podem ser correlacionadas em prol da saúde pública. Em médio prazo, a horta-piloto será estendida às residências das agentes do Instituto, uma ponte para apresentar o projeto para a comunidade. A visão última é de estender essas hortas a toda a comunidade.

No entanto, de nada adianta a proposta, nem as pessoas motivadas em dar continuidade ao trabalho, se não for possível pôr em prática através de parcerias e formação de redes sob um aporte governamental que possa investir no projeto e apoiá-lo como urgente e estratégico. A discussão dos entraves técnicos, sociais e políticos no trabalho levam à reflexão sobre os fatores envolvidos nesse estudo.

A capacidade de produção de espécies vegetais que terão a finalidade de reforçar o sistema imune das pessoas de uma comunidade onde ainda há fome e desnutrição, mesmo que em pequena escala, são fatores que merecem destaque para a ação local. Para isso, há a necessidade da capacitação dos envolvidos, a conscientização do valor nutricional gerado através das plantas, bem como a discussão da sustentabilidade e viabilidade do estudo proposto.

Referências