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Artigo de Pesquisa

Avaliação do potencial antioxidante e anti-Helicobacter pylori in vitro de extratos de plantas medicinais utilizadas popularmente na região amazônica

Evaluation of antioxidant and anti-Helicobacter pylori in vitro potential of medicinal plant extracts popularly used in Amazon

Autores:
Nascimento, Juliana E. C.1;
Reatgui, Walberson da S.1;
Araújo, Luciana S. de1;
Ribeiro, Maria Elizelma da S.1;
Maia, Daniela C. S.1;
Giacomin, Leandro L.1,2;
Kitagawa, Rodrigo R.3;
Baratto, Leopoldo C.4*;
Instituições
1Universidade Federal do Oeste do Pará, UFOPA, Av. Marechal Rondon, s/n, Caranazal, CEP: 68040-070, Campus Santarém, PA, Brasil.
2Universidade Federal do Oeste do Pará, UFOPA, Herbário HSTM, Santarém, PA, Brasil.
3Universidade Federal do Espírito Santo, UFES, Laboratório de Triagem de Produtos Naturais do Departamento de Ciências Farmacêuticas, Av. Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras, CEP: 29075-910, Vitória, ES, Brasil.
4Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ, Faculdade de Farmácia, Av. Carlos Chagas Filho, 373, Cidade Universitária, CEP: 21941-170, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
*Correspondência:
leopoldo.ufrj@gmail.com

Resumo

A região amazônica contempla uma enorme diversidade de espécies de plantas que contribuem para uma vasta riqueza natural. Nesse contexto, o objetivo deste trabalho foi avaliar o potencial antioxidante, anti-Helicobacter pylori e atividade inibitória da enzima urease in vitro de extratos de espécies de plantas medicinais usadas popularmente na região oeste do Pará. Foram realizados ensaios antimicrobianos através da técnica espectrofotométrica de microdiluição em caldo, antioxidante pelos ensaios de DPPH e ABTS•+ e de inibição da urease. O extrato etanólico de folhas de Schnella sp. apresentou o melhor potencial antioxidante frente aos dois métodos, com CI50= 6,35 μg/mL (DPPH) e 1,81 μg/mL (ABTS•+) e, ainda, o maior percentual de inibição da urease (45%) na concentração de 1024 μg/mL. O extrato etanólico da resina de breu-branco inibiu 82,8% (512 μg/mL) do crescimento da bactéria. Estes resultados, em conjunto, evidenciam o potencial das espécies vegetais utilizadas na região oeste do Pará, na busca por moléculas com ação antioxidante e antimicrobiana.

Palavras-chave:
Antioxidante.
Helicobacter pylori.
Urease.
Antimicrobiano.
Amazônia.

Abstract

The Amazon region has an enormous diversity of plant species, which contributes to its known vast natural wealth. In this context, the aim of this work was to evaluate the antioxidant, anti-Helicobacter pylori and anti-urease potentials of medicinal plant extracts popularly used in the western Pará, northern Brazil. Antimicrobial assays were carried out using spectrophotometric broth microdilution technique, the antioxidant potential by the DPPH and ABTS•+ assays and anti-urease activity by inhibition of the enzyme urease. The ethanolic extract of leaves of Schnella sp. showed the best antioxidant potential in both methods, with IC50= 6.35 μg/mL (DPPH) and 1.81 μg/mL (ABTS•+) and the highest percentage of inhibition of urease (45%) at 1024 μg/ml. The ethanolic extract of the resin of "breu-branco" inhibited 82.8% (512 μg/mL) of the bacterial growth. These results together show the potential of the plant species used in the western Pará, in the search for molecules with antioxidant and antimicrobial action.

Keywords:
Antioxidant.
Helicobacter pylori.
Urease.
Antimicrobial.
Amazon rainforest.

Introdução

Na região amazônica, ainda que não conclusivo, estima-se a existência de aproximadamente 60.000 espécies de plantas contribuindo para uma vasta riqueza natural. Considerando essa estimativa, são necessários investimentos em ciência e tecnologia, proteção e valorização dos recursos naturais e, principalmente, a importância dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade (Albagli, 2010). O conhecimento tradicional tem fornecido informações valiosas para a descoberta de novos agentes antimicrobianos a partir das plantas (Duraipandiyan, Ayyanar e Ignacimuthu, 2006), destacando a importância da medicina popular na busca por moléculas eficazes contra micro-organismos cada vez mais resistentes (Lopez, Hudson e Towers, 2001), como por exemplo Helicobacter pylori.

H. pylori é um bacilo em forma de espiral, Gram-negativo, encontrado na mucosa que reveste o estômago humano e tem sido associado a diferentes doenças gastrointestinais, principalmente úlceras gástricas, sendo um dos patógenos humanos que mais prevalece em todo o mundo (Khalifa, Sharaf e Aziz, 2010). Estima-se que metade da população mundial esteja contaminada por H. pylori, com uma proporção maior nos países em desenvolvimento.  As vias de transmissão não estão esclarecidas, mas as vias oral-oral e oral-fecal são consideradas as principais formas de transmissão (Kodaira, Escobar e Grisi, 2002; Ladeira, Salvadori e Rodrigues, 2003). Fatores como variação geográfica, idade, sexo, predisposição genética, etnia, nível educacional e saneamento contribuem para o aumento de sua incidência e prevalência (Khalifa, Sharaf e Aziz, 2010). A ingestão de água contaminada por fezes evidencia um modo importante de se adquirir a infecção, principalmente em localidades com ínfimas condições de saneamento básico e distribuição de água potável, como é o caso da maioria das cidades na região Norte do Brasil (Kodaira, Escobar e Grisi, 2002; Ladeira, Salvadori e Rodrigues, 2003).

Hoje se reconhece que mais de 95% das úlceras são causadas por H. pylori (Núcleo Brasileiro para Estudo do Helicobacter pylori, 2017). O mecanismo de formação das úlceras não está totalmente elucidado, mas sabe-se que as ocorrências associadas ou isoladas com H. pylori podem provocar ulcerações, e que o excesso de radicais livres produzidos durante a infecção pode danificar consideravelmente algumas membranas biológicas (Borrelli e Izzo, 2000).

Associado ao interesse pela busca de novas substâncias com potencial antimicrobiano contra H. pylori, a procura por moléculas antioxidantes também mostra-se importante no combate à infecção desta bactéria. A investigação dos antioxidantes naturais por meio de extratos vegetais evidencia benefícios, tendo em vista a baixa toxicidade em relação aos antioxidantes sintéticos (Bergamaschi, 2010).

Nesse contexto, dentre os compostos bioativos produzidos pelas plantas, os compostos fenólicos, entre eles flavonoides, taninos e cumarinas, destacam-se devido a sua ação antioxidante. Os antioxidantes podem retardar ou inibir a oxidação de substratos, auxiliando na eliminação de radicais livres e principalmente nas espécies reativas de oxigênio (EROs) (Cooper, 2005).

Os radicais livres tendem a ser moléculas altamente instáveis, que possuem orbitais, contendo um elétron desemparelhado, e podem ser formados quando uma ligação covalente é quebrada ou quando um átomo ou molécula recebe um só elétron transferido durante uma reação de oxirredução. Eles são capazes de alterar quimicamente muitos tipos de moléculas, incluindo proteínas, ácidos nucleicos e lipídeos (Karp, 2005).

Além da produção excessiva de EROS, outro fator de virulência da H. pylori é a enzima urease. Vários estudos mostraram que a urease desempenha papel central na patogênese da bactéria, uma vez que a enzima é essencial para a colonização bem-sucedida do micro-organismo na mucosa gástrica e para o desencadeamento de uma vigorosa reposta imune (Mobley, 1996). Ureases são capazes de catalisar a hidrólise de ureia obtendo-se amônia e carbamato. Por conseguinte, o carbamato decompõe-se obtendo outra molécula de amônia e ácido carbônico (Mobley, Island e Hausinger 1995). Grande parte das ureases sintetizadas pela H. pylori situa-se no citoplasma (Ladeira, Salvadori e Rodrigues, 2003). Algumas espécies de H. pylori produzem elevados níveis da enzima urease, principalmente em processos patogênicos por ocasionar mudança no pH tornando-o alcalino, dessa forma, evidenciando um ambiente propício para a colonização bacteriana. (Mobley, Island e Hausinger, 1995).

O objetivo deste trabalho foi avaliar o potencial anti-H. pylori e antioxidante in vitro, além da atividade inibitória da enzima urease, envolvida em processos de formação de úlcera gástrica relacionada àquela bactéria, de extratos de plantas medicinais usadas popularmente na região oeste do Pará (Amazônia Central).

Material e Métodos

Material Vegetal

O material vegetal utilizado foi oriundo do oeste do Pará, região Norte do Brasil, nos municípios de Santarém, Belterra e Rurópolis, sendo este último na Comunidade São José, entre os meses de maio a junho de 2015. A região em questão é área de atuação direta da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). As espécies vegetais foram devidamente identificadas e materiais testemunho foram depositados no Herbário HSTM da UFOPA, na forma de exsicatas (dados disponíveis para consulta em http://hstm.jbrj.gov.br/). Foram obtidas amostras das seguintes espécies (epítetos específicos são seguidos do município e dos números de tombo do Herbário HSTM): folhas de Libidibia ferrea (Mart. ex Tul.) L. P. Queiroz (Fabaceae) (Santarém, HSTM – 004653/004654); folhas de Genipa americana L. (Rubiaceae),(Rurópolis, HSTM - 004655); folhas e látex de Himatanthus articulatus (Vahl) Woodson (Apocynaceae) (Santarém, HSTM - 000601), sendo o látex de H. articulatus coletado a partir de incisões no caule por meio de um estilete; folhas de Kalanchoe pinnata Pers. (Crassulaceae) (Rurópolis, HSTM - 000602); folhas deMicrodesmia rigida (Benth.) Sothers & Prance (Chrysobalanaceae) (Santarém, HSTM - 004422); partes aéreas de Portulaca pilosa L. (Portulacaceae) (Santarém, HSTM-00601); folhas de Schnella sp. (Fabaceae) (Rurópolis, HSTM-004652); folhas de Syzygium malaccense (L.) Merr. & Perry (Myrtaceae) (Santarém, HSTM-000019); resina de breu-branco (Protium sp., Burseraceae), adquirido em feira popular de plantas e ervas medicinais de Santarém (testemunho não produzido). Os nomes aqui empregados seguem o que é aceito na Flora do Brasil 2020 (http://floradobrasil.jbrj.gov.br) para espécies nativas, sendo que para espécies subespontâneas cultivadas não citadas nessa fonte utilizou-se o conceito do The Plant List (http://www.theplantlist.org). As grafias e autorias dos nomes utilizados foram checadas no International Plant Names Index (http://www.ipni.org).

Preparo dos Extratos Brutos

O material vegetal foi seco em estufa a uma temperatura de 40ºC, moído e macerado em álcool etílico absoluto durante sete dias, à temperatura ambiente, com agitação ocasional, ao abrigo da luz. Os extratos foram filtrados em algodão e evaporados até a secura em rotaevaporador. O látex de H. articulatus não passou por nenhum processo de preparação e foi utilizado in natura.

Avaliação da Atividade Anti-Helicobacter pylori

Cultivo do H. pylori

Cepas de H. pylori (ATCC 43504) foram cultivadas em ágar Columbia contendo 5% de sangue de carneiro a 36-37°C, numa atmosfera de 5% de O2, 10% CO2, 85% de atmosfera de N2 durante três dias. Após esse período, foram recolhidas e suspensas em tampão fosfato-salino (PBS) (Bonacorsi et al., 2013).

Antimicrobianos padrões

Soluções de amoxicilina nas concentrações de 0,065 a 4 mg/mL e metronidazol nas concentrações de 16 a 512 mg/mL foram os padrões de antibióticos utilizados como controle nos ensaios antimicrobianos.

Diluição dos extratos brutos

Os extratos etanólicos e o látex de H. articulatus foram solubilizados em dimetilsulfóxido (DMSO), sendo empregada a concentração de 40 mg/mL.

Microdiluição em caldo

A atividade anti-H. pylori dos extratos brutos foi avaliada por meio da determinação da concentração inibitória mínima (CIM) através da técnica de microdiluição em caldo de acordo com a norma CLSI (M7-A6, 2003), com modificações. A cada poço da microplaca adicionou-se 100 μL de meio de cultura líquido Brain Heart Infusion (BHI) suplementado com 10% de soro fetal bovino com diversas concentrações dos extratos obtidos por diluição seriada 1:2 (1024 mg/mL a 32 mg/mL), e o mesmo volume de uma suspensão de H. pylori (106-107 bactérias/mL). A microplaca foi submetida à leitura espectrofotométrica em 620 nm em leitor de microplaca iMark®, BioRad (Washington, USA) e, em seguida, incubada à temperatura de 36-37ºC, em atmosfera contendo 10% de CO2, por 72 h. Após esse período, a microplaca foi homogeneizada e nova leitura realizada para determinação da CIM. Os testes foram realizados em triplicata e acompanhados de crescimento controle. A CIM foi definida, graficamente, como sendo a menor concentração do extrato que induziu a um brusco declínio no valor da absorvância de no mínimo 90% do crescimento bacteriano, o qual foi mantido nas concentrações seguintes e próximas a zero.

Avaliação da Atividade Antioxidante

Ensaio de sequestro do radical DPPH

A atividade antioxidante dos extratos etanólicos sobre o DPPH (1,1-difenil-2-picril-hidrazila) foi determinada utilizando o método de Yamaguchi et al. (2000), modificado. Em microplaca de 96 poços, adicionou-se 200 µL de uma solução de DPPH (0,004%) em etanol 99% e 100 µL dos extratos-teste em diversas concentrações obtidas por diluição seriada (100 a 0,39 mg/mL). A mistura foi incubada ao abrigo da luz e a temperatura ambiente por 30 min, sendo então observada a alteração da absorvância do DPPH a 540 nm em leitor de microplaca. A partir dos valores das absorvâncias obtidos calculou-se a CI50. O ácido 6-hidroxi-2,5,7,8-tetrametilcroman-2-carboxílico (Trolox®) foi a substância utilizada como controle antioxidante. O ensaio foi realizado em triplicata.

Ensaio de sequestro do radical ABTS•+

A atividade antioxidante dos extratos etanólicos sobre ABTS•+ [ácido 2,2'-azino-bis (3-etilbenzotiazolina-6-sulfônico)]foi determinada utilizando-se o método de Re et al. (1999), modificado. Inicialmente uma mistura aquosa de ABTS (7 mmol.L-1) e persulfato de potássio (2,45 mmol.L-1) foi incubada a temperatura ambiente e ao abrigo da luz por 16 h. A solução formada de ABTS•+ foi diluída em etanol a uma absorvância de 0,70 (734 nm). O ensaio foi realizado com 1000 µL da solução de ABTS•+ para 10 μL de cada concentração de extrato (200 a 0,10 µg/mL). Após 10 min, alíquotas de 200 µL foram transferidas para microplacas de 96 orifícios e incubadas por 30 min a temperatura ambiente e a redução do ABTS•+ pelos extratos foi observada no comprimento de onda 750 nm em leitor de microplaca. A partir dos valores das absorvâncias obtidos calculou-se a CI50. O Trolox® foi a substância utilizada como controle antioxidante. O ensaio foi realizado em triplicata.

Ensaio de Inibição da Urease

O ensaio foi realizado de acordo com o método descrito por Tanaka, Kawase e Tani (2004), com modificações, baseado no princípio da conversão de ureia (CH4N2O) em amônia (NH3) através da catálise enzimática. Utilizou-se uma isoforma de urease da planta Canavalia ensiformis (L.) DC. (Fabaceae) homóloga a urease presente em H. pylori, as quais possuem forma terciária idêntica. Utilizou-se microplacas de 96 poços, com a adição de 25 µL de urease 4UI (Jack Bean urease tipo III) e 25 µL dos extratos-teste em diversas concentrações (32 a 1024 mg/mL), com incubação por 2h em temperatura ambiente. Após esse período, adicionou-se 25 µL de vermelho de fenol (0,02%) e 200 µL de ureia (50 mM) em tampão fosfato 100 mM (pH 6,8). Efetuou-se a leitura imediata em leitor de microplaca iMark®, BioRad (Washington, USA) no tempo zero t= 0 com posterior leitura a cada 5 min para o registro da reação, terminando no tempo trinta t= 30 a 540 nm. A partir dos valores das absorvâncias obtidas foi possível calcular a porcentagem de atividade de urease. O ácido bórico (H3BO3) foi à substância utilizada como padrão de inibição. O ensaio foi realizado em triplicata.

Resultados e Discussão

Avaliação da Atividade Anti-H. pylori

Para avaliação da atividade anti-H. pylori realizou-se primeiramente uma triagem de todos os extratos. No entanto, muitos extratos não apresentaram nenhuma inibição do crescimento bacteriano. As amostras selecionadas para o ensaio foram: extratos de resina de breu-branco, K. pinnata, Schnella sp., H. articulatus, G. americana e S. malaccense e o látex de H. articulatus.

Nenhum dos extratos etanólicos atingiu a concentração inibitória mínima (CIM90), ou seja, nenhum extrato foi capaz de inibir o crescimento da bactéria em 90%. Entretanto, o resultado mais promissor foi observado com o extrato da resina de breu-branco, a qualinibiu em 82,8% na concentração de 512 μg/mL o crescimento bacteriano. Outro extrato com elevado potencial inibitório de H. pylori foi o de Schnella sp., com inibição de 73,4% na concentração de 256 μg/mL. Os demais extratos testados apresentaram inibição abaixo de 50%.  A amoxicilina apresentou CIM90 em 0,5 μg/mL com porcentual de inibição de 91,9% destacando a sensibilidade da cepa; metronidazol não apresentou CIM, confirmando a resistência bacteriana ao antibiótico. Os resultados da atividade anti-H. pylori (TABELA 1).

TABELA 1 – Valores referentes aos potenciais de inibição de H. pylori na presença dos extratos etanólicos de plantas medicinais amazônicas.
Extratos e Controles Concentração testada [μg/mL] Concentração mais ativa [μg/mL] Inibição (%)
G. americana 1024 a 256 512 14,8
H. articulatus 1024 a 256 1024 40,1
H. articulatus (látex) 1024 a 256 1024 24,4
K. pinnata 1024 a 32 1024 47,6
Protium sp. 1024 a 32 512 82,8
S. malaccense 1024 a 256 1024 24,2
Schnella sp 1024 a 32 256 73,4
Amoxicilina* 4 a 0,065 4 100
Metronidazol 512 a 16 512 48,6
*concentração na qual a amoxicilina inibe o crescimento bacteriano em 100%. Porém, a CIM90 é a 0,5   μg/mL.

Embora neste estudo o extrato de S. malaccense não tenha atingido a CIM para H. pylori, há dados na literatura que evidenciam potencial antimicrobiano e antiulcerogênico de espécies do mesmo gênero. Estudo realizado por Araújo (2014) para avaliar a atividade anti-H. pylori dos extratos etanólico, hexânico e aquoso, e das frações hexânica, clorofórmica, acetato de etila e aquosa das folhas de Syzygium cumini (L.) Skeels por meio da técnica de difusão em disco não apresentou inibição de crescimento em nenhuma das concentrações avaliadas. Já o óleo essencial das folhas apresentou atividade inibitória tanto para técnica de difusão em disco quanto para determinação da CIM, que foi atingida na concentração de 205 μg/mL. Donatini et al. (2009) avaliaram a atividade antiulcerogênica aguda do extrato hidroetanólico a 70% liofilizado de folhas de Syzygium jambos (L.) Alston na dose de 400 mg/kg, o qual apresentou excelente efeito preventivo de lesões gástricas em modelo de indução de úlcera por etanol/HCl em ratos.

Braz, Oliveira e Viana (2013) obtiveram resultados significantes de ação gastroprotetora do extrato aquoso de K. pinnata em modelos de úlcera induzida por indometacina em camundongos, corroborando que possivelmente o efeito antiulcerogênico esteja relacionado com a presença de flavonoides e taninos.

Avaliação da Atividade Antioxidante

Para avaliação da atividade antioxidante realizou-se primeiramente uma triagem de todos os extratos. Os extratos etanólicos de Schnella sp., M. rigida e L. ferrea apresentaram os resultados mais promissores, com valores de CI50 no ensaio de DPPH 6,35 μg/ml, 14,76 μg/ml e 10,57 μg/ml, e no ensaio de ABTS•+ 1,81 μg/ml, 3,36 μg/ml e 2,77 μg/ml, respectivamente, quando comparados ao Trolox®. Os extratos de H. articulatus apresentaram CI50 em torno de 40,00 μg/ml pelo ensaio de DPPH e CI50 de aproximadamente 15,00 μg/ml pelo ensaio do ABTS•+, enquanto o extrato de S. malaccense apresentou CI50= 23,29 e 6,56 μg/ml pelos testes do DPPH e ABTS•+, respectivamente. Os extratos de K. pinnata e G. americana apresentaram resultados semelhantes, com CI50 de 61,05 e 59,36 µg/ml, respectivamente, no ensaio do DPPH, e CI50 de 13,97 e 13,93 µg/ml, respectivamente, no ensaio do ABTS•+. Por outro lado, o látex de H. articulatus, assim como o extrato de P. pilosa e a resina de breu-branco foram considerados inativos, com CI50 acima de 100 μg/ml em ambos os ensaios. Os resultados de CI50 de todos os extratos avaliados (TABELA 2).

TABELA 2 – Valores de CI50 (μg/mL) dos extratos etanólicos de plantas medicinais frente aos ensaios de atividade antioxidante pelos métodos DPPH e ABTS•+.
Extrato etanólico DPPH
(CI50, μg/ml)
ABTS•+
(CI50, μg/ml)
G. americana 59,36 13,93
H. articulatus (folhas) 39,76 15,35
H. articulatus (látex) >100 >100
K. pinnata 61,05 13,97
L. ferrea 10,57 2,77
M. rigida 14,76 3,36
P. pilosa >100 >100
Schnella sp. 6,35 1,81
S. malaccense 23,29 6,56
Protium sp. >100 >100
Trolox® 5,24 1,62

A maioria das espécies vegetais, avaliada neste trabalho pelos métodos DPPH e ABTS•+, possuem compostos fenólicos reconhecidamente capazes de sequestrar radicais livres, o que justifica o potencial antioxidante, como é o caso de G. americana, S. malaccense, K. pinnata, M. rigida e L. ferrea.

Em um estudo realizado por Porto et al. (2010), o extrato alcoólico dos frutos de G. americana apresentou CI50 de 606,7 μg/ml no ensaio de sequestro do radical DPPH. Pacheco et al. (2014) avaliaram também a atividade antioxidante do extrato etanólico dos frutos dessa mesma espécie obtendo valor de porcentagem de inibição de oxidação do radical livre DPPH de 70,2%, o que pode ser justificado pelos altos teores de vitamina C e compostos fenólicos presentes nos frutos.

Zambelli et al. (2006) detectaram em testes fitoquímicos a presença significativa de taninos, flavanonas, flavononois, flavonas, flavonois e xantonas e constataram a atividade antioxidante das frações acetato de etila, metanólica e do extrato bruto de S. malaccense com os respectivos índices de varredura 89,70%, 91,16% e 91,32% pelo método sequestrador de radicais livres DPPH. Savi (2015) identificou ácido gálico, catequina, rutina, miricetina e quercetina no extrato das folhas de S. malaccense. Nunes (2015) determinou em extratos da mesma espécie quantidades relevantes de ácido ascórbico, flavonoides, antocianinas e fenólicos totais.

Sousa, Silva e Rosa (2010) verificaram baixa atividade antioxidante para o extrato etanólico das folhas de K. pinnata [sob o sinônimo Bryophyllum pinnatum (Lam.) Oken] frente ao DPPH, apresentando valores inferiores a 50% em todas as concentrações testadas. Em outro estudo, Sobreira (2013) determinou a capacidade antioxidante do extrato bruto de K. pinnata cujo CI50 foi 72,63 μg/ml; fração acetato de etila 41,91 μg/ml e fração aquosa 110,02 μg/ml. K. pinnata é rica em flavonoides (quercitrina e quercetina 3-O-α-L-arabinopiranosil (1→2) α-L-ramnopiranosídeo), substâncias conhecidamente antioxidantes, além de alcaloides, bufadienolídeos, antocianinas, taninos e mucilagem (Sobreira, 2013; Cavalcante, 2013).

Martão (2013) relata excelentes resultados da atividade antioxidante de extratos etanólicos de algumas espécies do gênero Protium, conhecidas como breu, pelo método DPPH, as quais apresentaram melhores resultados de CI50 em relação ao padrão de Ginkgo biloba L. (Gikgoaceae) (G. biloba,CI50 32,04±0,17 μg/ml; P. subserratum,CI50 8,96±0,11 μg/ml; P. trifoliolatum,CI50 12,21±0,15 μg/ml).

Um estudo realizado por Macedo (2011) avaliou a capacidade antioxidante de extratos etanólico, aquoso e hidroetanólico das folhas de M. rigida pelo método de redução do DPPH, no qual o extrato etanólico apresentou o melhor resultado na concentração de 500 μg/mL (72,62%), em relação aos demais extratos. Farias et al. (2013) avaliaram a capacidade antioxidante de sementes de M. rigida e Moquilea tomentosa Benth., através do mesmo método de redução do radical DPPH, obtendo respectivamente os valores de CI50 de 487,51 μg/mL e 216,72 μg/mL. M. rigida que contém principalmente taninos, flavonoides e saponinas (Pessoa, 2015).

Oliveira (2013) avaliou o potencial antioxidante pelo método do DPPH do extrato metanólico e suas frações (diclorometano e aquosa) das raízes secas de H. sucuuba e obteve CI50 de 265,62 μg/mL para a fração diclorometano e CI50 849,55 μg/mL para a fração aquosa, indicando, desta forma, uma baixa capacidade de sequestro do radical.

Barros (2012) realizou avaliação do potencial antioxidante pelo método de DPPH do extrato aquoso da vagem e da casca de L. ferrea, obtendo, respectivamente, CI50 de 7,90 e 8,70 μg/mL. Em outro estudo, Nascimento et al. (2015) verificaram o potencial antioxidante dos extratos etanólicos das vagens de L. ferrea pelos métodos de DPPH obtendo CI50 de 4,40 μg/mL e ABTS com CI50 de 2,50 μg/mL.

Ensaio de Inibição da Enzima Urease

Para avaliação do ensaio de inibição da urease realizou-se primeiramente uma triagem de todos os extratos. O ensaio teve como objetivo avaliar se os extratos possuíam a capacidade de inibir a enzima, pois ela é elemento chave para colonização, sobrevivência e neutralização da acidez no entorno da bactéria. A maioria dos extratos não apresentou atividade inibitória expressiva da enzima. Entretanto, três extratos apresentaram atividade inibitória da urease(S. malaccense, 27%;Schnella sp., 45%;M. rigida, 35%), ainda que não expressiva quando comparados ao padrão de ácido bórico (71% de inibição), o qual foi utilizado como controle positivo (TABELA 3).

TABELA 3 – Inibição (%) da enzima urease pelos extratos etanólicos de plantas medicinais coletadas na região oeste do Pará.
Extrato etanólico Inibição (%) da enzima a 1024 μg/ml(*)
S. malaccense 27%
Schnella sp. 45%
M. rigida 35%
H3BO3 71%
(*) inibição no tempo=20 min.

Embora a busca por inibidores da urease tenha crescido nos últimos anos, não há dados na literatura relacionados com as espécies deste trabalho, o que demonstra a relevância dessa triagem. A baixa atividade inibitória de extratos e produtos naturais sobre essa enzima já foi observada por outros autores. Num estudo recente realizado por Nunes (2016) foi verificado que a fração acetonitrila/clorofórmio de Baccharis crispa Spreng. [Sob o sinônimo Baccharis trimera (Less.) DC.] inibiu a urease em 36,24% na concentração de 1024 µg/mL. Em outro estudo, Damasceno (2016) encontrou baixa atividade de inibição (12,3%) da enzima utilizando amostras contendo a isocumarina paepalantina obtida de Paepalanthus latipes Silveira (Eriocaulaceae).

Conclusão

A infecção por H. pylori leva a uma excessiva produção de EROs por células de defesa, ocasionando danos ao tecido gástrico. Além do mais, a expressão da enzima urease propicia que a bactéria sobreviva ao ambiente ácido estomacal, favorecendo a formação de úlceras. Os resultados inferem que os extratos provenientes de plantas amazônicas utilizadas na região oeste do Pará apresentaram potencial antioxidante, antibacteriano e antiurease. O extrato de Schnella sp. foi o que apresentou o maior potencial antioxidante, quando comparado ao controle. O mesmo extrato obteve porcentagem de inibição da urease em torno de 50%. Com relação à atividade antibacteriana ressalta-se que apesar dos extratos não terem atingido a CIM90, o valor de inibição do crescimento de H. pylori da resina do breu-branco foi maior que 80% e do extrato de Schnella sp. foi de 73,4%. Estes resultados, quando avaliados em conjunto, evidenciam principalmente o potencial dessas duas espécies vegetais comumente utilizadas como medicinais no oeste do Pará na busca por moléculas com ação antioxidante e antimicrobiana.

Agradecimentos

Os autores agradecem à UFOPA pela bolsa de mobilidade acadêmica conferida a J.E.C. Nascimento e ao suporte técnico do Laboratório de Triagem de Produtos Naturais do Departamento de Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

Referências