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Artigo de Pesquisa

http://dx.doi.org/10.17648/2446-4775.2019.641

Análise fitoquímica, toxicidade, potencial antioxidante e atividade antibacteriana da Ceiba speciosa (A.St.-Hil.) Ravenna

Phytochemical analysis, toxicity, antioxidant potential and antibacterial activities of Ceiba speciosa (A.St.-Hil.) Ravenna

Autores:
Braga, Pâmela Milene dos Santos1;
Barcelos, Izabel Bárbara1;
Calazans, Richard da Silva Pereira1;
Bulian, Alexandra Luiza Silva1;
Gabler, Josiane Cezar Rodrigues1;
Sobral, Fabiana de Oliveira Solla2;
Salvi, Jeferson de Oliveira3*.
Instituições
1Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná (CEULJI/ULBRA), Departamento de Farmácia, Laboratório de Toxicologia. Av. Engenheiro Manfredo Barata Almeida da Fonseca, nº 762, Caixa Postal 61, Sala 2-prédio C, CEP: 76907-438, Ji-Paraná, Rondônia, Brasil.
2Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal (FACIMED), Av. Cuiabá, 3087, Jardim Clodoaldo, CEP: 76963-665, Cacoal, Rondônia, Brasil.
3Faculdade Panamericana de Ji-Paraná (UNIJIPA). Departamento de Farmácia. RO 135 Km 1, CEP:78961-080, Campus I, Ji-Paraná, Rondônia, Brasil.
*Correspondência:
jefersonsalvi@hotmail.com

Resumo

O presente estudo realizou a prospecção fitoquímica e avaliou a toxicidade aguda, o potencial antioxidante e a atividade antibacteriana das flores da Ceiba speciosa. A triagem dos metabólitos foi realizada por reações colorimétricas, a toxicidade foi avaliada in vitro por meio do teste de letalidade frente ao microcrustáceo Artemia salina, a atividade antioxidante pelo sequestro de radicais livres, utilizando o radical sintético 2,2-difenil-1-picrilhidrazila (DPPH) e a atividade antimicrobiana pela difusão em disco frente às bactérias Escherichia coli, Shigella spp.e Staphylococcus aureus. Os resultados indicaram a presença de flavonoides e saponinas, observou-se a ausência da toxicidade das amostras (DL50=1.067 ug/mL) e a positividade para a atividade antioxidante (EC50=56,7 mg/mL). Em relação à atividade antibacteriana, as soluções hidrometanólicas a 80% (80:20, v/v) apresentaram efeito nas quatro maiores concentrações (100 mg/mL, 50 mg/mL, 25 mg/mL, 12,5 mg/mL) para as cepas de E. coli e Shiguela spp., e para o S. aureus o mesmo ocorreu a partir de 25 mg/mL. Concluiu-se sobre a ausência de toxicidade, positividade para o efeito antioxidante e atividade antibacteriana para as soluções hidrometanólicas. Sugere-se a continuidade das investigações para exploração do potencial biológico das flores de Ceiba speciosa,que pode constituir-se em uma alternativa como recurso terapêutico.

Palavras-chave:
Plantas medicinais.
Paineira.
Screening fitoquímico.
Prospecção fitoquímica.
Metabólitos secundários.
Artemia salina.
Toxicidade.

Abstract

The present study aimed to determine the phytochemical prospection, to evaluate the acute toxicity, antioxidant potential and antibacterial activity of Ceiba speciosa flowers. The identification of the metabolites was developed by colorimetric reactions, in vitro cytotoxicity was evaluated by the Artemia salina (brine shrimp) lethality test, the antioxidant activity by the capacity of free radical scavenger, using the synthetic radical 2,2-Diphenyl-1-picrylhydrazyl (DPPH) and to verify an antimicrobial activity was used the disk diffusion method against the bacteria Escherichia coli, Shigella spp and Staphylococcus aureus. The results showed a presence of flavonoids and saponins, with absence of toxicity of the samples (LD50=1.067 ug/mL) and a positivity for antioxidant activity (EC50=56.7 mg/mL). In relation to the antibacterial activity, the hydromethanolics solutions presented halos greater than 6 mm in the four highest concentrations, for E. coli and Shiguela spp., and to the S. aureus strains, the same occurred from 25 mg/mL. Our results showed the absence of toxicity, positivity for the antioxidant effect and antibacterial activity for hydrometanic solutions. We suggest the continuity of the investigations to explore the biological potential of Ceiba speciosa flowers that can constitute an alternative as a therapeutic resource.

Keywords:
Medicinal plants.
Paineira.
Phytochemical screening.
Phytochemical prospects.
Secondary metabolites.
Artemia salina.
Toxicity.

Introdução

O uso popular de plantas com finalidade medicinal, por meio das diversas formas de preparo e indicações, constitui-se em uma prática bastante difundida em todo o mundo. Segundo estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), até 80% da população mundial utiliza recursos das medicinas populares para suprir necessidades de assistência médica[1].

As diferentes indicações terapêuticas atribuídas a uma planta podem dificultar a descoberta e o desenvolvimento de novos princípios ativos[2]. Variadas classes de compostos químicos, produzidos pelo metabolismo secundário das plantas, são encontrados distribuídos nas diferentes partes vegetais. O conhecimento da presença desses compostos fitoquímicos pode servir de predileção para identificação da espécie e elucidação das suas prováveis atividades biológicas[3].

A popularização e a facilidade de acesso podem levar a interações no consumo concomitante com medicamentos e a manifestação de efeitos adversos[4]. Neste contexto, é possível considerar a planta medicinal como xenobiótico e, desta forma, os produtos da sua biotransformação são potencialmente perigosos. Com relação à toxicologia, é necessário considerar os efeitos esperados logo após a ingestão e, principalmente, os danos decorrentes do uso contínuo, tais como: a hepatotoxicidade e a nefrotoxicidade[5,6].

As espécies do gênero Ceiba sp. são árvores que variam de 5 a 20 metros e encontram-se amplamente distribuídas pelo mundo, incluindo a América do Sul e a região amazônica do Brasil. A Ceiba speciosa, conhecida popularmente como paineira ou barriguda, pertence à família Malvaceae e, anteriormente era denominada de Chorisia speciosa, pertencente à família Bombaceae. Suas flores apresentam coloração em tons de rosa e contêm estames com anteras sésseis, geralmente polinizadas por borboletas[7].

A utilização do gênero está descrita para diversas finalidades com base em seu potencial terapêutico, nutricional e econômico, todavia, são poucas as evidências relacionadas ao potencial antioxidante e aos aspectos fitoquímicos e toxicológicos da Ceiba speciosa. Existem relatos do uso desta planta para a redução dos níveis séricos de colesterol, triglicerídeos e glicose[8-10].

Assim, pesquisas direcionadas para a investigação da eficácia e da segurança das espécies, relatadas pelo uso popular, proporcionam não somente a descoberta de novos compostos farmacologicamente ativos, como também a investigação de informações para o uso racional das plantas com fins medicinais, o que proporciona a eficácia terapêutica e a promoção à saúde.

O presente estudo teve por objetivo realizar a prospecção fitoquímica das flores da planta Ceiba speciosa, considerando a segurança quanto à toxicidade do seu extrato aquoso e a detecção do seu provável potencial antioxidante e a atividade antimicrobiana.

Materiais e Método

O material vegetal para herborização foi obtido de um exemplar de Ceiba speciosa (A.St.-Hil.) Ravenna, localizado nas coordenadas 10º51'44,3''S; 61º57'36,5''W, no bosque do Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná (CEULJI/ULBRA), no município de Ji-Paraná, estado de Rondônia, Brasil.

A coleta foi realizada por tração mecânica com o auxílio de um podão acoplado a uma vara de alumínio, o material foi acondicionado em sacos de nylon para o transporte[11]. A identificação ocorreu junto ao Herbário Antônio Dalla Martha do CEULJI/ULBRA, seguindo as técnicas padronizadas, e a exsicata foi depositada sob o nº de registro 257.

Obtenção das flores e secagem

As flores de C. speciosa caídas foram recolhidas, entre os meses de abril e maio de 2016, respeitando a integridade e a ausência de contaminantes. Em seguida, estas foram submetidas ao processo de secagem artificial em estufa (Q317M, Quimis®) à 50ºC, por sete dias, e conduzidas ao seccionamento para a redução a pó ou partículas (≤4 mm, Mesh 5)[12].

Preparo do extrato aquoso

Com base na principal forma de consumo popular para a utilização de plantas medicinais, normalmente na forma de chás, preparou-se uma infusão com duas colheres de sopa do pó das flores secas para uma xícara de chá (240 mL), conforme o regulamento técnico 519 do Ministério da Saúde[13], totalizando uma concentração final de 8,15 mg/mL. A água a 90ºC (±2) foi vertida no material vegetal e, em seguida, a solução foi abafada até atingir a temperatura ambiente de 25ºC, e procedeu-se com a filtragem em papel filtro para a retirada do material sobrenadante.

Prospecção fitoquímica

Realizou-se a análise fitoquímica qualitativa conforme métodos validados baseados em testes colorimétricos, considerando a identificação dos principais metabólitos secundários.

O teste para detecção de alcaloides foi realizado após a extração com ácido clorídrico (1%) e análises nos reagentes de Dragendorff, Bertrand e Mayer. A adição de solução de carbonato de sódio (22%), extração com clorofórmio e tratamento com ácido acético revelam a positividade do teste[14].

Para as antraquinonas foram utilizados os princípios da reação de Borntraeger, por meio da adição de uma mistura de soluções de diclorometano e de hidróxido de sódio, sendo que a coloração vermelha indica o resultado positivo[15].

A pesquisa das classes das auronas e chalconas foi realizada após a extração inicial por decocção seguida de filtragem com acetato de etila, logo após, ocorreu a adição de solução aquosa de hidróxido de sódio, considerando-se positivas as amostras de tons vermelho-alaranjados[16].

A presença de compostos cumarínicos foi verificada pela coloração amarelo fluorescente após o contato com a solução etanólica de hidróxido de sódio (1%) mediante aquecimento[17].

Os flavonoides foram investigados pela reação de Shinoda[18] que consiste no aquecimento da amostra que posteriormente entra em contato com etanol, ácido clorídrico concentrado e magnésio metálico. O teste foi considerado positivo, quando a amostra apresentou tons associados ao vermelho e ao laranja.

A presença da saponinas foi investigada por meio da submissão do decocto do material vegetal à intensa agitação, sendo que, são consideradas presentes quando há a formação de um anel afrogênico persistente[19].

A pesquisa de taninos foi realizada mediante as reações de precipitação de gelatina ao entrar em contato com solução aquosa de cloreto de sódio (2%)[14].

O teste para triterpenos e/ou esteroides utilizou n-hexano como solvente para extração em 24 horas. Em seguida, procedeu-se à reação de Liebermann-Burchard, que utiliza anidro acético e ácido sulfúrico concentrado[15]. Diferentes colorações e intensidades de cores caracterizam os núcleos esteroidais ou triterpênicos. A coloração azul pela Reação de Liebermann-Burchard é indicativa da presença de esteroides. A mudança para cor rósea pela Reação de Shinoda indica presença de flavonoides[20].

Toxicidade

A atividade citotóxica da infusão das flores de Ceiba speciosa foi avaliada por meio do teste de letalidade frente ao microcrustáceo Artemia salina[21]. Os ovos eclodiram em solução de sal marinho (pH 8,5) e as larvas aclimatadas na temperatura de 25ºC (±2) com aeração e iluminação constantes, por 48 horas. Foram transferidos 10 náuplios de Artemia salina para tubos de ensaio contendo 5 mL do infuso inicial (8,15 mg/mL) e diluições (1:2, 1:5, 1:10 e 1:20) preparados com solução marinha. O teste foi realizado em triplicata de amostras e como controle negativo (CN) utilizou-se apenas solução salina.

A contagem dos microcrustáceos mortos foi realizada após 24h, e estimou-se a dose letal mediana (DL50) com base na regressão linear logarítmica, considerando a correlação das concentrações e a frequência dos óbitos, substituindo o valor pela metade das mortes máximas registradas por série (n/2) na equação da reta obtida[22]. Os resultados das sobrevivências foram estatisticamente comparados ao do CN por análise de variância (ANOVA) e teste de Dunnet para múltiplas comparações com auxílio do programa Graphpad Prism (versão 6.0).

Atividade antioxidante

O efeito antioxidante das flores da Ceiba speciosa foi avaliado pela capacidade de desativação do radical livre 2,2-difenil-1-picrilhidrazila (DPPH)[23]. Esse radical sofre redução pelos agentes antioxidantes, promovendo alteração da coloração inicial violeta, para variações de tons de cor amarela, proporcional a concentração da substância redutora da amostra.

Em ambiente escuro, transferiu-se 3,9 mL de DPPH (0,06 mM) e 100 µL de cada extrato aquoso (1, 1:2, 1:5, 1:10 e 1:20) para tubos de ensaios. O experimento foi realizado em triplicata de amostras. Um controle positivo (CP) foi preparado pela adição de 3,9 mL de DPPH (0,06 mM) com 100 µL de uma solução padrão de DPPH metílico e água destilada foi utilizada como branco. Como controle negativo utilizou-se uma solução de 100 µL de água e 3,9 mL de solução metanólica de DPPH (0,06 mMol). As absorbâncias foram medidas pelo aparelho Bioplus (Bio-2000®) a 515 nm e monitoradas minuto a minuto até se observar a estabilização da absorbância da amostra.

Construiu-se uma curva-padrão de DPPH utilizando diluições metanólicas de DPPH, nas seguintes concentrações: 10 µM, 20 µM, 30 µM, 40 µM, 50 µM e 60 µM.

Calculou-se o decaimento da absorbância das amostras (Aam) correlacionado ao decaimento da absorbância do controle (Ac) que resulta na porcentagem de sequestro de radicais livres (%SRL), expressa pela fórmula: % SRL = (Ac - Am/Ac)x100.

Atividade antibacteriana

A atividade antibacteriana foi realizada pela técnica de difusão em disco utilizando o meio ágar Mueller-Hinton[24]. Para os ensaios foram utilizadas soluções aquosas e hidrometanólicas a 80% (80:20, v/v) nas concentrações de 100 mg/mL, 50 mg/mL, 25 mg/mL, 12,5 mg/mL e 6,125 mg/mL, como CN foi utilizado apenas o veículo. 10 uL de cada amostra foi pipetada sobre discos de papel filtro de 6 mm de diâmetro, os quais foram levados à dissecador por 48 horas.

Foram utilizadas cepas padronizadas de Escherichia coli (ATTC 1809) e Staphylococcus aureus (ATCC 2494) e Shigella spp., obtidas da bacterioteca do Laboratório de Microbiologia do CEULJI/UBRA. As suspensões bacterianas contendo solução fisiológica obtiveram turvação equivalente a padrão de 0,5 na escala de Mac Farland.  Após a inoculação dos discos, as placas foram incubas a 35ºC por 24 horas, após esse período, os halos de inibição foram medidos com auxílio de um paquímetro manual.

Todos os ensaios foram realizados em triplicata de amostra e os controles positivos (CP) utilizados foram ceftriaxona (30 ug) para Escherichia coli, amoxicilina com ácido clavulânico (30 ug) para Staphylococcus aureus e ciprofloxacino (5 ug) para Shigella spp.

Considerou-se a atividade antimicrobiana positiva mediante a formação de halo de inibição (HI) superior a 6 mm de diâmetro[25] e, ainda, quando presente, a atividade antibacteriana foi classificada em moderada atividade antibacteriana (7 mm ≤ HI ≤ 13 mm) e com elevada atividade antibacteriana (HI > 13 mm) frente todas as cepas pesquisadas[26].

Os resultados da atividade antibacteriana foram expressos com base na análise das médias dos halos de inibição identificados juntamente com os desvios-padrão observados. Empregou-se a análise de variância (ANOVA) e a comparação múltipla com o CP por meio do teste de Dunnet para múltiplas comparações com auxílio do programa Graphpad Prism (versão 6.0).

Resultados e Discussão

A identificação qualitativa dos metabólitos secundários revelou a positividade para saponinas e flavonoides (TABELA 1).

Os flavonoides representam uma das classes fitoquímicas de maior ocorrência em plantas, atuando como agentes antioxidantes, antimicrobianos, antialérgicos, antivirais, anti-inflamatórios e vasodilatadores, sendo a principal causa de estudos a sua atividade antioxidante[27].

TABELA 1: Prospecção fitoquímica nas flores de Ceiba speciosa.
Classes de metabólitos secundários Resultado
Alcaloides -
Antraquinonas -
Auronas/chalconas -
Cumarinas -
Flavonoides +
Saponinas +
Taninos -
Triterpenos e/ou esteroides -
"+": presente; "-": ausente.

A presença de compostos fenólicos foi identificada em extratos aquosos obtidos das folhas[28] e das flores[29] de C. speciosa. Em revisão[30] descreveu-se a presença de dois compostos da família das antocianinas, a cianidina 3,5-diglicosídio e a cianidina 3-glicosídio, tipos de flavonoides, nas flores da C. speciosa.

As saponinas são glicosídeos de esteroides ou de terpenos policíclicos, por isso classificam-se como saponinas esteroidais e saponinas triterpênicas, e são responsáveis por proteger as plantas contra o ataque de insetos e microrganismos[5,31]. Possuem atividades farmacológicas atribuídas aos efeitos antitumoral, anti-inflamatório, antiviral, antifúngico, antibacteriano e citotóxico, dentre outros[3,32].

Na literatura científica há registro da presença de triterpenos na fração de éter de petróleo obtida das flores de C. speciosa[29]. Autores[33] descreveram a presença de saponinas em folhas de Pavonia varians,e traços desse mesmo metabólito também foram encontrados nas folhas de Ceiba glaziovii, ambas pertencentes à família Malvaceae.

Em relação à toxicidade, a DL50 foi de 1.047 ug/mL, o que indica a ausência de toxicidade da amostra[20]. Observou-se diferença significativa do número de sobreviventes entre o infuso inicial e as três primeiras diluições quando comparados ao controle negativo (CN), evidenciando a relativa seguridade na concentração de 0,4 mg/mL como demonstra a FIGURA 1.

FIGURA 1: Distribuição da frequência dos óbitos (%Mortalidade) em função do logaritmo das concentrações (Log [  ]) dos extratos aquosos de Ceiba speciosa. CN = controle negativo.
Figura 1

Dados sobre a toxicidade de extratos aquosos das flores de C. speciosa não foram encontrados na literatura científica, ressaltando a importância dos achados do presente estudo. Pesquisa de Silveira[34] atribuiu a toxicidade do fruto da paineira à presença de um polissacarídeo obtido do seu exsudato, estabelecendo uma relação dose dependente com a diminuição da viabilidade in vitro de macrófagos e de linhagens de células de câncer cervical (HeLA). Extratos aquosos obtidos da casca de C. speciosa demonstraram negatividade para danos ao DNA, bem como, a inexistência de peroxidação lipídica, refletindo na ausência do estresse oxidativo[10].

Testes de toxicidade in vitro podem ser úteis para o seguimento de pesquisas com extratos e substâncias de ação ainda desconhecidas, pois fornecem dados preliminares para as avaliações nas pesquisas in vivo, de maneira a elucidar o estudo das doses e o estabelecimento da correlação dose-dependência com os efeitos fisiológicos manifestados[35,36].

Observou-se a positividade para a atividade antioxidante, evidenciada pelas alterações da coloração violeta para tons de amarelo e confirmada pelos resultados menores das absorbâncias das soluções testadas em comparação aos valores obtidos para o CN, sendo calculada uma EC50 = 56,7 mg/mL.

O percentual de radicais livres consumidos baseia-se na capacidade de doar átomos de hidrogênio e reduzir o DPPH à hidrazina, desta forma ocorre a mudança de coloração[37]. No presente estudo, observou-se a redução do sequestro do radical livre DPPH conforme o aumento da concentração dos extratos aquosos de C. speciosa (FIGURA 2).

FIGURA 2: Atividade antioxidante expressa pela frequência relativa do sequestro de radicais livres (%SRL) nas diferentes concentrações (mg/mL) avaliadas.
Figura 2

O processo de extração por infusão é bastante comum para fins medicinais e permite a extração de compostos fenólicos com reconhecida atividade antioxidante[38], portanto, o potencial antioxidante da amostra apresenta relação com a presença dos flavonoides identificados na prospecção fitoquímica. A atividade antioxidante da C. speciosa também foi detectada em extratos aquosos obtidos das cascas[39], observando-se[40] o efeito antioxidante de extratos de saponinas obtidos as folhas de Abutilon indica, planta da família Malvaceae.

Não foi possível observar alguma atividade antibacteriana dos extratos aquosos das flores de C. speciosa, porém, as soluções hidrometanólicas apresentaram resultados positivos para algumas concentrações, conforme se demonstra na TABELA 2.

TABELA 2: Médias dos diâmetros dos halos de inibição do crescimento (mm), obtidos a partir de diferentes concentrações (mg/mL) dos extratos hidrometanólicos das flores de Ceiba speciosa frente às cepas de Escherichia coli, Staphylococcus aureus e Shigella spp.
Concentrações (mg/mL) CN 1,56 3,125 6,125 12,5 25 50 100 CP
E. coli
 (ATCC 1809)
- - - - 7,6±0,57* 9±0* 10±0 13±0 32,6±0,57
S. aureus (ATCC 2494) - - - - - 9,6±0,57* 11±0 13±0 26±0
Shiguela spp - - - - 8±0* 10,3±0,19* 12,3±0,5 15±0,57 25,3±0,57
Os dados são apresentados com o valor médio ± o desvio padrão. *Diferença significativa p<0,05 em relação ao CP (ANOVA One-Way, Teste de Dunnet). **CN = controle negativo, CP= controle positivo, (-) não houve formação de halo de inibição. Atividade inibitória positiva para o halo > 6 mm.

As soluções hidrometanólicas apresentaram halos superiores a 7 mm nas quatro maiores concentrações, para as cepas de E. coli e Shiguela spp., sendo que, para o S. aureus o mesmo ocorreu a partir de 25 mg/mL. Os maiores halos obtidos foram para a concentração de 100 mg/mL (E. coli = 13±0, S. aureus = 13±0 e Shigella spp = 15±1) e, segundo a escala de Matsuura[41], todos os halos observados classificam as suas respectivas concentrações como de atividade moderada, com exceção para a de 100 mg/mL contra Shigella spp que apresentou elevada atividade antibacteriana.

A análise estatística aplicada sobre a variação das médias dos HI identificou uma distribuição significativa dos valores registrados (p=0,005), já na comparação das médias não se observou diferença significativa entre os resultados das duas maiores concentrações e os dados obtidos para os CP.

Resultados anteriores indicaram a ausência da atividade antibacteriana de infusos obtidos das flores de C. speciosa e o desenvolvimento de halos de inibição com soluções hidrometanólicas oriundas dessa mesma parte vegetal da planta[42,43]. Em estudo[44], achados semelhantes ao da presente pesquisa, foram evidenciado em extratos metanólicos e clorofórmicos obtidos das folhas de C. speciosa, demonstrando atividade antibacteriana contra Bacillus cereus, Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella pneumonia e Staphylococcus aureus.

A presença de flavonoides nas soluções hidrometanólicas das flores de C. speciosa pode explicar os efeitos antibacterianos observados, uma vez que, em certa concentração, essa classe de metabólito secundário pode causar danos à membrana plasmática em decorrência da diminuição da fluidez e da perfuração da membrana, da inibição do metabolismo energético e da diminuição da síntese de ácidos nucleicos[45]. Além disso, devido à capacidade de agirem como detergentes, também consta na literatura científica o efeito antibacteriano dose dependente das saponinas contra S. aureus e E. coli [45,40].

Conclusão

Considerando que natureza do solvente empregado no processo de extração influencia diretamente no tipo e na quantidade do composto fitoquímico em solução, no presente estudo, as soluções aquosas preparadas por infusão, maneira popular mais comum de consumo, apresentaram flavonoides e saponinas. As mesmas se demonstraram atóxicas, com potencial antioxidante, todavia, a atividade antibacteriana foi identificada nas soluções hidrometanólicas.

Sugere-se a continuidade da investigação para explorar o potencial biológico das flores da Ceiba speciosa que pode constituir-se em uma alternativa acessível e sustentável como recurso terapêutico.

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