Comunicação Breve

Saberes indígenas

Indigenous knowledge

http://dx.doi.org/10.17648/2446-4775.2019.772

Vieira, Jefferson Vinicius Bomfim1*;
Sabioni, Sayonara Cotrim1.
1Instituto Federal Baiano, Campus Uruçuca. Rua Dr. João Nascimento, s/n, CEP 45680-000, Uruçuca, BA, Brasil.
*Correspondência:
bomfim81@hotmail.com

Resumo

Entre os saberes tradicionais, os conhecimentos indígenas são amplamente utilizados no Brasil como os modelos de sistemas agroflorestais (SAF's). A agrofloresta tem como berço os saberes indígenas sobre as florestas, imitando seu modo de crescimento e estabilidade, garantido assim a produção agrícola e a biodiversidade da fauna e da flora nos ecossistemas. Este projeto busca a interação dos conhecimentos tradicionais com enfoque científico sobre os saberes da cultura indígena, para agregar ao conhecimento agroecológico, dar destaque a educação ambiental, que integra o conhecimento ancestral dos povos nativos com tecnologias contemporâneas. O projeto começou a ser desenvolvido em etapas, no município de Ilhéus-BA, na Comunidade Tupinambá, da aldeia Tucum, em 27/12/2017. A primeira etapa foi iniciada com as aproximações e vivências agroecológicas. No dia 16/12/2018, foi aplicada a segunda etapa, com o uso das ferramentas do Diagnóstico Participativo Fortaleza, Oportunidade, Fraqueza e Ameaça (FOFA) e o Mapa de Recursos Naturais e Uso da Terra.  O trabalho saberes indígenas apresenta-se em um contexto social, econômico, cultural e ambiental, envolvendo a agroecologia como a nova ciência em construção. Contudo, é evidenciada a de uma relação harmônica, podendo ser exercida por ações antrópicas, comprovada pelo conhecimento tradicional.

Palavras-chave:
Comunidades tradicionais.
Agroecologia.
Biodiversidade.
Tupinambá.
Aldeia Tucum.

Abstract

Among the traditional knowledge, indigenous knowledge is widely used in Brazil as agroforestry systems (SAF's) models. The agroforestry has as its cradle indigenous knowledge about forests, imitating its way of growth and stability, guaranteed agricultural production and biodiversity of fauna and flora, in ecosystems. This project seeks the interaction of traditional knowledge with a scientific focus on the knowledge of indigenous culture, and the production of knowledge to aggregate to agroecological knowledge, highlighting environmental education, which integrates the ancestral knowledge of native peoples with contemporary technologies. The project began to be developed in stages, in the municipality of Ilhéus-BA, in the Tupinambá Community of Tucum village on 12/27/2017. The first stage was started with agroecological approaches and experiences. On 12/16/2018, the second phase was applied, using the tools of Participatory Diagnosis Fortaleza, Opportunity, Weakness and Threat (FOFA) and the Natural Resources and Land Use Map (NRLUM). The indigenous knowledge work presents itself in a social, economic, cultural and environmental context, involving agroecology as the new science under construction. However, it is evidenced the existence of a harmonic relation, being able to be exerted by anthropic actions, proven by the traditional knowledge.

Keywords:
Traditional communities.
Agroecology.
Biodiversity.
Tupinambá.
Tucum Village.

Introdução

Tema gerador: Conservação e manejo da sociobiodiversidade, direitos dos agricultores, povos e comunidades tradicionais.

Entre os saberes tradicionais, os conhecimentos indígenas são amplamente utilizados no Brasil como os modelos de sistemas agroflorestais (SAF's). O SAF traz consigo a prática de conhecimento tradicional indígena, do consórcio de culturas diversificadas respeitando técnicas de manejo e espaçamento entre as culturas[1]. A agrofloresta tem como berço os saberes indígenas sobre as florestas, e vem imitando seu modo de crescimento e estabilidade, garantido produção agrícola e biodiversidade da fauna e da flora nos ecossistemas.

Os (SAF's), resgatados de culturas antigas e atualizados para atender às necessidades de evolução no uso da terra em países em desenvolvimento, especialmente em regiões tropicais, hoje se expandem por praticamente todas as regiões onde sejam possíveis os cultivos agrícolas e florestais[2].

Este projeto busca a interação dos conhecimentos tradicionais com enfoque científico[3] sobre os saberes da cultura indígena quanto à produção de conhecimentos, visando agregar ao conhecimento agroecológico ao conhecimento ancestral dos povos nativos, integrando a educação ambiental as tecnologias contemporâneas. Esta interação busca o saber, ou seja, até onde a comunidade e o meio ambiente natural estão ligados com esse sistema, estimulando questionamentos como: As ações antrópicas geram somente destruição ao ambiente? Os impactos ambientais são 'maléficos' ao meio ambiente natural? Pode existir uma relação harmônica entre o ser humano e a natureza?

Materiais e Métodos

Descrição da experiência

O desenvolvimento deste projeto teve início em 27/12/2017, na Comunidade Tupinambá, aldeia Tucum, no município de Ilhéus-BA, com o uso de metodologias participativas, como a aproximação com as lideranças, vivência agroecológica e a participação (observação) em reuniões internas e rituais. De acordo com as informações prestadas pelo Cacique (líder geral da comunidade), existem 56 famílias na comunidade.

O trabalho foi desenvolvido de modo interativo em etapas: a primeira foram os contatos iniciais com a comunidade no período de aproximação e vivência agroecológica, para obtenção da confiança e do apoio dos mesmos, uma vez que, o projeto não pode ser desenvolvido sem o consenso das pessoas residentes daquela localidade. Isto, visando o cooperativismo para melhor coleta dos dados; a segunda etapa foi em 16 de dezembro de 2018, com a aplicação do Diagnostico Rural Participativo (DRP), que se define como um conjunto de técnicas e ferramentas permitindo que as comunidades façam seu próprio diagnóstico e a partir daí comecem a autogerenciar seu planejamento e desenvolvimento.

Desta maneira, os participantes compartilharam experiências e analisaram seus conhecimentos, a fim de melhorar suas habilidades de planejamento e ação. Embora originariamente tenham sido concebidas para zonas rurais, muitas das técnicas do DRP podem ser utilizadas igualmente em comunidades urbanas[4].

Foram utilizadas também como ferramentas do Diagnostico Participativo Fortaleza, Oportunidade, Fraqueza e Ameaça (FOFA) e o Mapa de Recursos Naturais e Uso da Terra[5]. Em Rodas de conversas foi demonstrado o interesse da comunidade em que, além do diagnóstico, fossem desenvolvidas outras atividades, como participação do mutirão de construção tradicional (bioconstrução) e atividades como oficinas.

Resultados e Discussão

O trabalho saberes indígenas apresenta-se em um contexto social, econômico, cultural e ambiental, envolvendo a agroecologia como a nova ciência em construção.  Sendo assim, através de reuniões com a comunidade foi estabelecido que, no dia 16/12/2018, contaria com o seguinte cronograma: mutirão de bioconstrução e DRP no período da manhã, almoço solidário ao meio-dia e oficina à tarde. Todos os materiais foram arrecadados a partir de doações, como: os materiais do diagnóstico, da oficina, e 50 quilos de alimentos, pois como metodologia participativa é importante que seja ofertado, depois do diagnóstico uma refeição, lanche ou coffee break, pois temos que estar sensíveis ao tempo e a disponibilidade da comunidade, para participar das atividades propostas e para que as reuniões ou eventos não ficassem cansativos. Deu-se início ao DRP após o término da bioconstrução (FIGURA 01 e 02). Desenvolvimento do DRP (FIGURAS 03 e 04), com os participantes que ali estavam. Pouco mais de 30 pessoas participaram, contando com a equipe da cozinha e a pessoa responsável pelo preparo do almoço solidário.

FIGURA 1: Momento do mutirão.
Figura 1
Fonte: Acervo Pessoal.
FIGURA 2: Após o término da bioconstrução.
Figura 2
Fonte: Acervo Pessoal.

A partir da ferramenta FOFA foram identificados pontos centrais, como todo o contexto do território que influencia diretamente na sobrevivência da comunidade e a importância que a própria comunidade tem, com o todo ao seu redor, pois são como parte da natureza. Por último, os participantes demostraram preocupação como a ameaça de invasão do território, caçadores nas terras indígenas, roubo da cultura, e a falta de assistência técnica.

FIGURA 3: Aplicação da FOFA.
Figura 3
Fonte: Acervo Pessoal.
FIGURA 4: Aplicação da FOFA.
Figura 4
Fonte: Acervo Pessoal.

A segunda ferramenta utilizada foi o Mapa de Recursos Naturais e Uso da Terra (FIGURA 05 e 06), onde foi levantado como ponto, que a comunidade é cercada de árvores, tem disponibilidade de água e grande biodiversidade, segundo o relato do índio Tucano "tem muito bicho e planta diferente". No uso do solo para a agricultura, tentam evitar usar agrotóxicos e que em volta de suas casas sempre tem o plantio de subsistência, além de suas áreas agrícolas. Os participantes identificaram as árvores sagradas para sua cultura, nas quais foram destacadas: a aroeira (Schinus terebinthifolius), biriba (Eschweileraovata (Cambess.)), cajá (Spondias mombin), caju (Anacardiumoccidentale), corindiba (Trema micrantha (L.) Blum), urucum (Bixa orellana),ip (Handroanthus chrysotrichus), putumuju (Centrolobium robustum (Vell.) Mart. ex Benth.). Em destaque aAmescla (Protium heptaphyllum (Aubl.) Marchand.) e Piaçava (Attalea funifera Mart.)[6].

Durante a vivência agroecológica foi observado que a comunidade, em sua maior parte, faz uso dos laços harmônicos e tradicionais, como a fabricação de artesanatos com seus traços culturais, para a geração de renda familiar, e tem grande influência na biodiversidade, pois, em seu território fazem reflorestamentos, proteção de leitos de rios e nascentes, utilizam sistemas agrícolas que têm, em suas funções, a produção de alimentos, remédios caseiros (provenientes de seivas, cascas, folhas e frutos), juntos ao ecossistema, práticas semelhantes aos Sistemas Agroflorestais. Ainda são mantidos: as antigas trilhas de seus antepassados; o respeito à fauna e à flora e o reavivamento da cultura indígena, que requer atenção especial com os jovens. A forma de agricultura que a comunidade desenvolve tem laços ancestrais, porém, para a sua manutenção, torna-se necessário o apoio de outros, como a assistência técnica rural, pois a agricultura de subsistência das comunidades tradicionais tem grande potencial de ampliação.

FIGURA 5: Aplicação do MAPA.
Figura 5
Fonte: Acervo Pessoal.
FIGURA 6: Aplicação do MAPA.
Figura 6
Fonte: Acervo Pessoal.

Portanto, partindo do pressuposto sobre as ações antrópicas, existe um equívoco em suas interpretações. As ações antrópicas geram somente destruição ao ambiente? Os impactos ambientais são 'maléficos' ao meio ambiente natural? A resposta obtida foi não!

Conclusão

Contudo é evidenciado que existe uma relação harmônica, que pode ser exercida por ações antrópicas, comprovada pelo conhecimento tradicional, o ser humano dentro do ecossistema pode exercer uma função benéfica, indo contra os efeitos maléficos já causados. É de fundamental importância, a aplicação de certas práticas com bases e pensamentos mais sustentáveis que possam manter as funções naturais para e a vida. Nos princípios indígenas existe uma íntima relação interdependente entre os seres vivos e o ambiente no qual vivem, pois é o conhecimento do campo holístico que leva saberes, que permeia o cientifico, para a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as futuras gerações.

Ao final do diagnóstico realizou-se uma oficina, de acordo com o desejo da comunidade, finalizando todos os trabalhos participativos proposto no dia 16/12/2018.

Agradecimentos

A todos os atores sociais que foram fundamentais para o nosso enriquecimento, tanto em técnicas de manejo quanto em outras formas de conhecimentos, ao apoio da Comunidade Tupinambá da aldeia Tucum, do município de Ilhéus-BA, à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Instituto Federal baiano (IFBa), Campus Uruçuca-BA.

Referências

  1. IDESAM. Projeto SAF Indígena. Disponível em: [Link]. Acesso em: 01 maio 2017.
  2. Daniel O, Couto L, Garcia R, Passos CAM. 1999. Proposta para padronização da terminologia empregada em sistemas agroflorestais no brasil. Revista Árvore. 23(3): 367-370.
  3. Marcone MA, Lakatos EM. Fundamentos de Metodologia Científica. 6ª ed. São Paulo: Editora S.A. 2006. 
  4. Verdejo ME. Diagnóstico Rural Participativo: guia prático DRP. Brasília: MDA/ Secretaria da Agricultura Familiar. 2006; 62 p: il.
  5. Gotsch E. O renascer da agricultura. Rio de Janeiro, maio de 1996.
  6. Sambuichi RHR, Silva LAM, Jesus MFC and Paixão JL. Lista de árvores nativas do sul da Bahia. In: Sambuichi RHR, Mielke MS, and Pereira CE. org. Nossas árvores: conservação, uso e manejo de árvores nativas no sul da Bahia [online]. Ilhéus, BA: Editus, 2009, p. 171-157. ISBN: 978-85-7455-515-7. [CrossRef]. [ePUB].