Wed, 04 Sep 2024 in Revista Fitos
Estudo da morfologia externa e interna das folhas de Psidium guajava L. Myrtaceae (goiabeira)
Resumo
Psidium guajava L. (Myrtaceae) é amplamente utilizada na medicina popular. O emprego de plantas no tratamento de doenças é um antigo hábito comum de muitas civilizações. O Brasil possui vasta biodiversidade e a comercialização de preparações terapêuticas à base de produtos naturais demanda caracterização da matéria-prima utilizada. Este trabalho objetivou o estudo farmacobotânico de P. guajava L. espécie pertencente à família Myrtaceae. Nas folhas coletadas e identificadas realizaram-se estudos da morfologia foliar externa e interna pela análise macroscópica e microscópica. Foram determinadas as principais características morfoanatômicas das folhas de P. guajava L. que podem ser utilizadas como ferramentas no controle de qualidade desta espécie para fins de identificação de Produtos Tradicionais Fitoterápicos que se apresentem sob a forma de planta fresca, seca ou triturada tornando o uso dessa planta de forma terapêutica mais seguro.
Main Text
Introdução
Estudos etnobotânicos têm sido realizados para identificar plantas que são utilizadas na medicina popular para sanar as mais diversas enfermidades. Dentre as plantas mencionadas na discussão dos resultados da pesquisa a escolhida para compor este artigo foi a espécie Psidium guajava L., mas conhecida como Goiabeira. Além de seu uso alimentar, existem evidências do uso medicinal das folhas de goiaba desde épocas pré-colombianas, como adstringente e anti-sarna, apresentando ainda propriedades anti-hemorrágica, cicatrizante e antisséptica[1]. Foi utilizada pelo exército na guerra da independência de Cuba, no século XIX. Tem seu uso citado na obra “El médico botânico criollo”, de Grosourdy, em 1864, em casos de indigestão, resfriados e doenças de pele.
A goiabeira (Psidium guajava, L.) originária da região tropical do continente americano, encontra-se amplamente difundida por todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo[2]. Pertencente à família Myrtaceae com porte arbóreo com 3 a 5 m de altura, possui folhas adultas apresentando pecíolo arredondado, cor verde-amarelada, tem de 5 a 18 cm de comprimento e de 3,5 a 6,5 cm de largura, são de forma oval, oblonga ou elíptica. Os brotos iniciam seu crescimento no período das chuvas, os mesmos contêm gemas floríferas e vegetativas. Floresce a partir de outubro e suas flores são brancas, os frutos são uma baga de forma variável chegando a pesar de 42 a 280 g, porém quando realizado poda e raleio pode chegar a 720 g[3]. Nesse contexto, o objetivo deste estudo é realizar estudo farmacobotânico de P. guajava L., espécie pertencente à família Myrtaceae.
Metodologia
Coletas, identificações botânicas e estudos morfológicos
Foram realizadas coletas de Psidium guajava L., na Universidade Federal do Maranhão, campus do Bacanga, nas imediações do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), no Município de São Luís, Maranhão. Uma amostra representativa da espécie foi destinada a elaboração de uma Exsicata a fim de ser depositada no Herbário “Ático Seabra” (UFMA), a qual foi identificada no herbário Ático Seabra sob o número de exsicata 0528. Foram feitos estudos da morfologia externa e interna das folhas. O estudo do pecíolo da folha foi realizado a fim de observar a transição do arranjo vascular que contém no caule e na nervura principal da folha.
Folha e Pecíolo
Realizaram-se secções transversais no limbo de folhas adultas, na região da nervura principal, ao nível do terço médio, à mão livre, com auxílio de lâmina cortante utilizando como suporte lâminas para microscópio; o mesmo procedimento foi realizado na região do pecíolo. As secções foram clarificadas com água sanitária comercial, posteriormente lavadas em água, coradas com safranina, lavadas novamente com água e montadas entre lâmina e lamínula, com água. Foi realizado ainda o teste para identificação de amido valendo-se do mesmo método utilizado para secção transversal, porém utilizando o lugol como reagente e não necessitando de água para que fosse montado o corte entre lâmina e lamínula. As secções paradérmicas foram realizadas nas faces adaxial e abaxial, à mão livre, com lâmina cortante, clarificadas com água sanitária comercial, lavadas com água, coradas com safranina, lavadas novamente e montadas entre lâmina e lamínula, com água. As análises microscópicas foram realizadas utilizando microscópio óptico.
Resultados e Discussão
Morfologia externa das Folhas e Pecíolo
As folhas analisadas de P. guajava L. são completas e pecioladas com a presença do pecíolo redondo inserido na base da folha com cerca de 0,2 a 0,5 cm de comprimento, valores estes que nos estudos de Tuler et al.[4] variam bastante em torno de 0,08 a 0,8 por 0,1 a 0,15 cm,. Em algumas espécies desse gênero é possível observar essa variação, como no pecíolo de Psidium sobralianum do nordeste do Brasil descrito com 0,2-0,65 cm de comprimento e 0,1-0,2 cm de largura[5]. Em pesquisa de Ladrum e Parra-O[6] o pecíolo de Psidium occidentale da Colômbia e Equador a variação é de 0,3–0,6 cm de comprimento enquanto que Arante e Monteiro[7] descreve pecíolo de 4-10 mm em Psidium guineense e de até 2 mm em Psidium cinereum, espécie comumente confundida com P. guajava L. e que se difere de outras espécies pelas folhas sésseis a subsésseis, entre outras características anatômicas.
Na avaliação da morfologia foliar externa os resultados foram semelhantes aos já descritos na literatura principalmente quanto ao formato elíptico da lâmina foliar, cujo o comprimento é duas vezes maior que a sua largura e com região central do limbo mais larga[8, 9]. No entanto, é descrito que o formato também variava de elíptico a obovado, se diferenciando por apresentar a parte mais estreita do limbo em contato com o pecíolo e a extremidade arredondada[4]. Rivera-Arce et al.[10] encontram em seu estudo o formato oblongo das folhas dessa espécie onde o limbo tem um formato de cerca de duas vezes mais longo do que largo e com bordas paralelas.
As folhas podem ser descritas como simétricas, com limbo inteiro e herbáceo[10]. E quanto à filotaxia distribuídas no caule de forma simples com limbo unitário e opostas, com 2 folhas por nós no caule, características comuns ao gênero Psidium. Quanto à base é estreita (<90°) e o ápice é mucronado, extremamente abrupto, mas continuado por porção pontiaguda e rígida na nervura central. Esses aspectos diferem de Tuler et al.[4] que destaca que a base e o ápice têm forma aguda (<90°) ou obtusa (>90°) e assim como Rivera-Arce et al.[10] que classifica a textura foliar como coriácea, ou seja, folhas com uma textura rugosa e rígida, enquanto Jolochin[11] a classifica como cartácea apresentando uma textura de consistência quebradiça e aspecto semelhante a um pergaminho. Embora seja da mesma família, no gênero Myrcia, Donato e Morretes[12] também classificaram a textura da espécie Myrcia multiflora (Lam.) DC. como cartácea, e que se diferencia também pela base aguda com ápice acuminado, cujas margens são afiladas em um ângulo obtuso e que abruptamente se tornam afiladas em ângulo agudo, como uma projeção.
A variação morfológica das nervuras dessa espécie é peninérvea com nervuras secundárias dispostas a partir da nervura principal de forma regular e espaçada, se assemelhando a uma pena com borda crenada (com dentes arredondados) e presentes na região mediana com ramificações, proeminentes e muito visíveis na face abaxial, dando aspecto rugoso à folha. Cardoso e Sago[13] ao estudarem a nervação foliar em espécies brasileiras de Myrtaceae Adans, evidenciaram que a maioria das espécies da subtribo Myrtinae apresentam o padrão de nervação secundário do tipo acródromo broquidódromo ou broquidódromo tal qual P. guajava L., outro estudo observa a nervação do tipo camptódroma eucamptódroma com nervuras laterais que se arqueiam para o ápice e que não se tocam por arcos conspícuos[11]. Além disso, se particulariza pela coloração verde tanto na face adaxial como na abaxial, sendo esta última em tom levemente mais claro, característico de folhas concolores (FIGURA 1 A - I) assim como descrito na espécie Myrcia multiflora (Lam.) DC.[12].
Morfologia interna das Folhas
A face adaxial apresenta células poliédricas e justapostas sem a presença de estômatos, concomitantes ao visualizado por Duarte e Paula[8]. Na face abaxial há a apresentação de estômatos paracíticos com células-guarda paralelas à fenda estomática que conferem então a classificação da folha como hipoestomática acordando com Cardoso et al.[14] (FIGURA 1 B-C), o que difere da estrutura morfoanatômica anfi-hipoestomática de P. Myrtoides, verificada por Menezes Filho[15] durante a avaliação de corantes para determinação de venação foliar, no qual os estômatos estão presentes em ambas as faces com predominância na face abaxial. Gomes et al.[16] em análise da anatomia foliar de espécies de Myrtaceae, em especial na taxonomia e filogenia, apontaram que a espécie Psidium guayava além dos estômatos paracíticos, pode desenvolver estômatos anomocíticos que não apresentam células subsidiárias.
Na superfície das folhas estão presentes tricomas tectores unicelulares sobre uma cutícula espessa (FIGURA 1D-E)[14, 17], mas é possível ocorrer variação desse aspecto em que espécie tem tricomas tectores unicelulares, com a cutícula de espessura moderada no revestimento da epiderme[8]. O mesofilo estudado possui parênquima paliçádico nas faces adaxial e abaxial[17]. No centro se evidencia uma camada única de parênquima esponjoso, se caracterizando como heterogêneo isobilateral e apresentando idioblastos (células que apresentam vacúolos) com cristais de oxalato (drusas) (FIGURA 1G) em sua composição que, segundo Duarte e Paula[8], são numerosos os prismas e drusas de oxalato de cálcio encontrados no córtex, no floema, na medula e, principalmente, na nervura central, bem como, apenas drusas de oxalato de cálcio na superfície do mesofilo descrito por Rivera-Arce et al.[10]. Além disso, analisando essa espécie é possível identificar a presença de amido no mesofilo utilizando lugol (FIGURA 1F).
A secção transversal da nervura principal da folha da goiabeira mostra logo abaixo da epiderme o tecido colenquimático angular (FIGURA 1H-I) constituído de células vivas e originado do meristema fundamental, sendo encontrar tricomas tectores unicelulares na epiderme da região da nervura principal, e após o colênquima, observa-se o parênquima fundamental. Em corte transversal, segundo Rivera-Arce et al.[10], podem ser observadas as cavidades secretoras que acumulam secreções oleosas ou perfumadas com origem mista esquizolisígenas no mesofilo e em veia central. Além de ser observado esclerênquima, um tecido constituído de células com espessamento em lignina que confere resistência à planta, em um dos cortes transversais revestindo xilema e floema (FIGURA 2 B e D). Tanto no tecido colenquimático quanto no parenquimático há a presença intensa de idioblastos com cristais oxalato (drusas) (FIGURA 2A).
Morfologia interna do Pecíolo
No corte do pecíolo, novamente, foi encontrado o córtex com intensa presença de idioblastos, e também essas células podem ser verificadas no vaso floemático que está revestindo totalmente o xilema que está situado na região central do corte (FIGURA 2E). Na região central da nervura Duarte e Paula[8] apontaram a presença de feixe vascular do tipo bicolateral, onde o feixe vascular conjunto tem o floema e o xilema no mesmo rádio. Esta região demarca a transição da disposição do feixe vascular do caule para a nervura principal da flor. No caule foi observado o córtex reduzido enquanto na folha ele apresenta-se um pouco maior e sem a presença da medula.
Conclusão
O uso medicinal de plantas torna de fundamental importância identificações que irão nortear a correta escolha do vegetal para uso terapêutico. O presente estudo, realizado com Psidium guajava L. (goiabeira), evidenciou características macroscópicas e microscópicas dessa planta que podem auxiliar na sua correta identificação. Por meio do controle de qualidade de plantas medicinais é possível identificar diferentes espécies vegetais com base nas suas características descritas na literatura.
Resumo
Main Text
Introdução
Metodologia
Coletas, identificações botânicas e estudos morfológicos
Folha e Pecíolo
Resultados e Discussão
Morfologia externa das Folhas e Pecíolo
Morfologia interna das Folhas
Morfologia interna do Pecíolo
Conclusão